Emicida: clipe de ‘AmarElo’ ultrapassa os 3 milhões de views e doc na Netflix entra para hall do cinema brasileiro


O documentário ‘AmarElo – É Tudo Pra Ontem’, de Emicida, realizado pela Laboratório Fantasma com produção de Evandro Fióti, lançado no Netflix, em 2020, mostra que o rapper é um artista multiplataformas e sabe muito bem ‘abraçar’ o público com diferentes linguagens, seja na música, vídeos, TV e streaming. O site HT conferiu essa perfeição audiovisual na qual o artista reescreve a participação da cultura preta na formação do Brasil. Vem junto!

*Por Rafael Moura

Leandro Roque de Oliveira, mais conhecido pelo nome artístico Emicida, 35 anos, é  um dos grandes nomes da cultura hip hop brasileira e da luta antiracista. O rapper vem se mostrando que é um artista multiplataformas e sabe muito bem ‘abraçar’ o público com diferentes linguagens, seja na música, vídeos, TV e streaming. Não é por acaso que o documentário ‘AmarElo – É Tudo Pra Ontem’ já disponível na Netflix é considerado uma das grandes obras-primas do mercado audiovisual brasileiro. O site Heloisa Tolipan assistiu o vídeo e vai ter contar motivos para você ver essa perfeição audiovisual urgente, afinal, o artista reescreve a participação da cultura preta na formação do Brasil.

O clipe “AmarElo”, lançado em 2019 e vencedor do Grammy Latino de melhor disco de rock ou música alternativa em língua portuguesa, foi transformado em documentário. E abre as cortinas e acende as luzes para um tema altamente pertinente, trabalhado com grande maestria pelo roteiro, conectando todos os personagens desse espetáculo como uma verdadeira ópera contemporânea, em uma linguagem de fácil compreensão (o que o torna um grande sucesso) e com uma mensagem potente que fala sobre a ocupação dos espaços e o fim do preconceito.

O documentário ‘AmarElo – É Tudo Pra Ontem’ é uma realização da Laboratório Fantasma e produzido por Evandro Fióti (empresário, sócio na empresa e irmão de Emicida). O diretor Fred Ouro Preto, o roteirista Toni C e o pesquisador Felipe Choco atuam como grandes regentes nessa peça que usa os bastidores do histórico show no Theatro Municipal de São Paulo, 2019, para resgatar a história da cultura e dos movimentos negros no Brasil nos últimos cem anos. O documentário joga luz numa parte da história do Brasil que foi invisibilizada e a que nem os próprios brasileiros tiveram acesso, além de fazer um grande exercício para contextualizar dez acontecimentos que são fundamentais para entender o pensamento negro no país e o sucesso desse mestre das rimas. “Eu não sinto que eu vim, eu sinto que eu voltei e que de alguma forma meus sonhos e minhas lutas chegaram muito antes da minha chegada”, conta o artista no filme.

O doc aborda temas como o Brasil ser o último país do continente americano a abolir a escravidão, em 13 de maio de 1888; o estado de São Paulo ter a riqueza do ciclo do café com mão de obra escrava; o apagamento histórico do negro depois da abolição com o governo incentivando a imigração europeia; a população pobre e negra sendo relegada às periferias de São Paulo. Corta. Depois da cultura do hip hop surgir nos Estados Unidos, o centro de São Paulo, justamente de onde os negros foram tirados pelos governos, vira palco de manifestações culturais como o rap, o break e o grafite. Foi ali, na altura do Theatro Municipal que Emicida começou a mostrar sua arte e a voz preta se espalhou pelo Brasil sobre com a conscientização sobre questões relacionadas ao racismo e à desigualdade social. Hoje, os jovens querem reescrever a história do país, como pontua Emicida.

O documentário é um libelo sobre a negritude brasileira, a reparação histórica, análise sociológica, autobiografia de Emicida e, eventualmente, no meio disso tudo, um registro de making of. É expressão de uma pretensão artística da mesma forma que é expressão de uma urgência no discurso. A ocupação do Theatro Municipal de São Paulo é uma reparação histórica, pois foi construído com mão de obra negra, que depois eram excluídos dos espetáculos neste local.

Tendo Emicida como personagem e narrador, ele se coloca como a figura capaz de personificar e organizar essa variedade de registros, porque antes de mais nada o rapper, com sua fala tranquila, faz aqui a voz da razão. ‘É Tudo pra Ontem’ se mostra, rapidamente, muito mais um filme de construção de um mito do que necessariamente um documentário de bastidores ou de processo criativo. Mas funcionando como uma plataforma para colocar em em cena Mateus Aleluia (símbolo da ancestralidade africana desde os tempos de Os Tincoãs) e em seguida trazer o pastor batista Henrique Vieira, e promover nessa associação uma ‘paz’ entre o candomblé e o catolicismo. O aspecto religioso é central ao filme – desde a concepção de cenário do show, com a projeção de vitrais que transforma o Municipal numa nave de igreja – e se não é transformado por completo em uma figura messiânica Emicida pelo menos é pintado como o agregador dos povos.

O artista rompe barreiras ao ver seu documentário na Netflix (a plataforma tem mais de 17 milhões de assinantes no Brasil), com nomes como Wilson das Neves, Zeca Pagodinho, Criolo, Fernanda Montenegro, Larissa Luz, Drik Barbosa, além de subir ao palco e coroar o vídeo com Majur e Pabllo Vittar validando seu olhar, quase pedagógico, sobre uma parte da história brasileira que nos foi negada.

Assim como o álbum ‘É Tudo Pra Ontem’, 2019 é sobre luta e esperança, e o quanto as duas só podem se manter com união, ‘AmarElo’ é um feat de Emicida com Majur e Pabllo Vittar, além de samples de Belchior. Já ‘É tudo para ontem’ é um single do rapper com o grande Gilberto Gil. Esse filme é uma conexão com o passado e futuro funcionando como uma grande janela de esperança para que as próximas gerações possam também ocupar todos os lugares, com diversidade e representatividade.