*Por Simone Gondim
A pausa nas gravações de novelas da Rede Globo, como medida de segurança contra o coronavírus, antecipou o fim da temporada de “Malhação – Toda forma de amar”. Em vez dos 20 capítulos previstos para a conclusão da trama, o autor Emanuel Jacobina teve que se virar com quatro episódios. Nessa hora, o poder de síntese desenvolvido na época da universidade – ele é formado em jornalismo – ajudou bastante. “Treinei muito na faculdade de comunicação”, brinca, para adotar um tom sério em seguida. “A pandemia nos criou uma circunstância completamente diferente. Não adianta brigar com a realidade ou negá-la”, explica. “Tive que escrever muito mais rápido, porque para fazer esse final e poder ter tempo de gravação, o que normalmente eu teria produzido em duas semanas acabei fazendo em três dias. Trabalhava 16, 18 horas por dia. Era o tempo de dormir, acordar, comer e ir trabalhar. E dormia pouco”, acrescenta.
Jacobina reconhece a importância da prevenção em relação à Covid-19 e garante que ele, a mulher e os filhos, um de 24 e outro de 22 anos, se isolaram na residência da família assim que houve a determinação de evitar o contato social. “Ficarei em isolamento até que autoridades nas quais eu confio digam que é seguro sair e isso não vai prejudicar outras pessoas. A gente sabe que, em 80% dos casos, a transmissão se dá por quem é assintomático, o que significa dizer que a taxa de contágio é extremamente alta e isso aumenta os índices de mortalidade”, afirma. “Também dispensei as secretárias que se revezavam na minha casa, dizendo para ficarem tranquilas porque continuaria pagando pelo serviço, mas passaria a fazer o trabalho delas”, esclarece.
A nova rotina imposta pelo isolamento social incluiu, além do aumento no ritmo de trabalho na reta final de “Malhação” e uma série de tarefas domésticas, o prazer de fazer andar a fila de leituras. “Por incrível que pareça, moro no mesmo lugar há 14 anos e agora estou conhecendo a casa bem melhor, porque sou eu que faço todas as tarefas. Limpo banheiro, varro a varanda, as áreas comuns, o corredor e as salas da casa, lavo roupa e ajudo a cozinhar e passar roupa”, revela Jacobina. “Também acabei de ler ‘Memórias de Adriano’, da Marguerite Yourcenar. Recomendo muito, era um clássico que eu me devia. E, óbvio, fico tomado pelo noticiário e pelas redes sociais, mesmo não sendo fã delas. Há uma sensação de que o mundo está mudando de um dia para o outro”, completa.
Por falar em mudanças, as gravações dos últimos capítulos de “Malhação – Toda forma de amar” não tiveram um clássico das novelas: os beijos dos protagonistas. Afinal, em tempos de coronavírus, o contato físico deve ser reduzido ao máximo. Mas isso não significa que o público será privado das cenas de romance entre seus personagens favoritos. “O capítulo acaba com os protagonistas andando juntos pela cidade cenográfica de Caxias, totalmente deserta. Antes disso, há uma série de flashbacks nos quais eles contam como acaba a história de cada um. É uma montagem parecida com a cena do filme ‘Cinema Paradiso’, na qual são mostrados vários beijos, incluindo o do casal gay formado por Guga (Pedro Alves) e Serginho (João Pedro Oliveira)“, adianta o autor.
Além do desfecho diferente, “Malhação – Toda forma de amar” marca os 25 anos da novelinha, criada por Emanuel Jacobina e Andréa Maltarolli durante uma oficina de formação de autores oferecida pela Rede Globo. “Criamos o projeto e eu dei o nome ‘Malhação’, mas a gente não tinha ideia que ia durar esse tempo todo”, confessa o autor. “Fico muito feliz, faz parte da minha vida e me sinto orgulhoso, dentro de um limite. É o programa mais longevo da história da televisão brasileira. Na verdade, é uma novela que se renova a cada ano, cuja particularidade é ter o ponto de vista do jovem ou do adolescente colocado em primeiro plano, coisa que as outras novelas da Globo não fazem”, argumenta.
Jacobina lembra que, mesmo sendo um dos pais de “Malhação” e criador de personagens famosos como o Mocotó, levou quatro anos até ser autor titular do programa. “Quando fiz a oficina eu vinha como redator de programa de humor na Globo, então eles pegaram o projeto criado por mim e pela Andréa e entregaram para autores de novela mais experientes. Na época, os titulares eram Ricardo Linhares e Ana Maria Moretzsohn“, diz. “Na minha estreia como autor principal, tirei a história da academia e coloquei em um colégio, o Múltipla Escolha, e lançamos Priscila Fantin, que nunca tinha feito nada em televisão nem em teatro. Depois disso, escrevi várias temporadas”, recorda.
Em 2016, outra novidade: junto com Leonardo Nogueira, Jacobina apresentou a primeira protagonista negra de ‘Malhação’, interpretada por Aline Dias. “Tenho muita vontade de ver em ‘Malhação’ um autor negro ou uma autora negra sendo cabeça do texto, oferecendo um projeto próprio. No dia em que isso acontecer, caso precisem de mim para ajudar em alguma medida, podem contar com isso. Acho que é um andamento natural do processo de renovação do programa”, especula.
Com o fim de “Malhação – Toda forma de amar”, os planos de Emanuel Jacobina incluem, além de um merecido descanso, desenvolver a sinopse de uma novela das 19h. “Essa temporada de ‘Malhação’ foi uma encomenda com urgência: em dois meses mandei a sinopse, em quatro meses os 20 primeiros capítulos. Não tive tempo para mais nada. Com o fim da temporada, o que estarei fazendo daqui a pouco, provavelmente, será a sinopse dessa outra novela”, imagina.
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