*Com Junior de Paula
Ele foi a cereja do bolo do dilema de Ivan, o personagem transgênero brilhantemente interpretado por Carol Duarte em “A Força do Querer”. Em poucas cenas, Claudio confundiu e explicou questões para este caso de gênero e trouxe novas abordagens à temática destacada por Gloria Perez, como, por exemplo, a gravidez em um trans homem. Ele é Gabriel Stauffer, ator que vem do teatro e ganhou espaço e visibilidade com a estreia na telinha – com direito a horário nobre e novela de grande repercussão. Ainda em clima de Claudio, já que a expectativa é que o personagem volte à história amanhã, no último capítulo de “A Força do Querer”, Gabriel contou da experiência positiva de abordar o assunto na telinha.
De acordo com o ator, inclusive a reação nas ruas tem sito interessante e global. “Muita gente falando, torcendo. Estamos chegando na reta final e a apreensão cresce. Até pessoas de outros países, em que a novela também passa, já me pararam na rua reconhecendo o trabalho e manifestando a torcida. É muito legal”, comemorou Gabriel Stauffer que disse que a temática já lhe era familiar mesmo antes da novela. “Já conhecia esse universo, mas não tão profundamente. O barato de ser ator é isso, poder entrar em temáticas e mundos diferentes. O entendimento é o primeiro passo para a aceitação, para o respeito e para a atuação também”, explicou.
E, de fato, o conhecimento foi um dos elementos para a boa interpretação de Gabriel Stauffer. Dele, o ator tirou conteúdo, verdades e aprendizado, que o mostrou a naturalidade sobre o tema. Caso estivesse inerido no contexto fora da ficção, o ator afirmou que ajudaria os personagens reais. “Encararia com amor, com olhar empático e com vontade de ajudar o Ivan a se encontrar e continuar sendo feliz. No fundo, todos buscamos a felicidade, a realização pessoal. Amar também é cuidar, olhar com carinho e ajudar”, disse.
Com este comportamento, Gabriel vai na contramão da onda de preconceito que ainda trava a sociedade contemporânea de evoluir. Em tempos de distorção do sentido da arte e pedofilia, por exemplo, o ator destacou o risco e o perigo da censura nos tempos modernos. “Fico muito preocupado com o momento que estamos vivendo. Mas o artista é isso, um pensador do seu tempo e cronista do momento histórico que está inserido. Devemos fazer mais do que já estamos fazendo e mostrar para a sociedade tudo o que está rolando. A censura é extremamente desagradável, fere. A partir do momento que um artista passa a ter medo de criar algo por causa da censura, todos perdem. A arte precisa ser produzida com liberdade. Fico triste vendo jovens tendo um pensamento com tanto ódio e repressão. Ninguém pode impedir o outro de pensar, de opinar e de se expressar”, analisou Gabriel que, mesmo assim, busca regar seu grão de esperança. “Me revolto muitas vezes, mas procuro manter o otimismo acreditando num futuro onde nada disso exista. Caso contrário, essa realidade acaba nos arrastando para baixo ainda mais”, completou.
O pensamento engajado do estreante na telinha também é o mesmo quando o assunto é o teatro. Arte milenar que o ator conhece desde o começo da carreira, os palcos têm sofrido com a falta de recursos e incentivos da crise cultural contemporânea. Mesmo assim, Gabriel Stauffer é daqueles que não acredita em parar. “O teatro é a minha vocação e foi o que escolhi fazer para o resto da vida. Faço de graça e com muita alegria. O teatro é necessário. Precisamos continuar incentivando o teatro, a arte, a música, a dança. E mesmo sem recurso, o artista vai continuar fazendo. Vai continuar expondo, escancarando, manifestando e ocupando”, disse o ator que mora há sete anos no Rio para se dedicar à carreira artística e comemora a visibilidade que está tendo com o trabalho na televisão. “Depois de formado pela CAL, passei a fazer várias peças e musicais. Muitas experiências deram errado e outras deram certo. Estou nessa batalha, nesse aprendizado constante, há mais de sete anos. Agora, que pintou a primeira novela e o primeiro longa, é que o grande público vai conhecer um pouquinho mais do Gabriel”, contou.
E por falar nisso, o cinema é outra área que Gabriel descobriu e adorou. Nas telonas, o ator acabou de estrear o longa “Entre Irmãs”, de Bruno Silveira, que tem Marjorie Estiano e Nanda Costa como protagonistas. “Foi uma experiência incrível. Viajar para as filmagens e ver toda a equipe, que é menor que na televisão, trabalhando junta para contar aquela história foi mágico. Tudo foi lindo e eu quero fazer mais”, disse o ator que afirmou não ter planos para depois do último capítulo de “A Força do Querer”. “Ainda estou curtindo esse finzinho das gravações da novela. Muita coisa para reverberar. Já, já penso nos novos projetos”, garantiu.
O que parece não ter “depois” na vida de Gabriel Stauffer neste momento é o engajamento com questões que acredita. Assim como defendeu o teatro e a temática trans, o ator também destacou a importância de os artistas usarem a sua voz para comentarem temas que acreditam. “O tipo de vida que levamos, seja ela qual for, querendo ou não, já é uma escolha política. O artista, por ser pensador da sua época e dono da sua arte, pode sim expor tudo o que pensa no palco, na tela, no filme, na música, no livro. Claro! O papel do artista é ser espelho da sociedade – parafraseando Shakespeare. É escutar, chacoalhar e criticar divertindo”, disse o ator que se declarou assustado com a “polaridade crescente” da sociedade. “A conversa acabou. Qualquer questão vira uma bomba de insultos e xingamentos de todos os lados. Ninguém se escuta mais. Isso me preocupa e me parece uma característica da nossa época. A rede social virou um lugar para vomitar qualquer argumento, o que vem à cabeça, sem pensar no outro. Na maioria das vezes, vejo uma cópia de algo que alguém já falou”, disse.
Como solução, Gabriel Stauffer é categórico. Para tudo, o ator defende o conhecimento e o debate. Do mesmo jeito que esta foi a chave para seu sucesso como o Claudia de “A Força do Querer”, Gabriel acredita que o interesse com fundamento seja a solução para dias melhores. “Precisamos escutar mais, pensar e dialogar. As eleições estão aí e é fundamental votarmos certo, votarmos bem, para não termos um golpe atrás do outro”, concluiu.
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