Em editorial exclusivo em clima oitentista, Julia Konrad adianta próxima personagem do cinema e fala sobre representatividade: “Lutava contra meu corpo, queria ser como minhas colegas”


A atriz ainda comentou a dificuldade para se fazer arte no Brasil de 2017. Na opinião de Julia, nem mesmo a população reconhece o trabalho do artista. “As pessoas acham que nossa vida não passa de ir à academia, ao salão de beleza, ganhar roupas de marca, e mostrar tudo isso numa espécie de reality show digital”

No dicionário dos nomes, Julia significa alguém fofo. Tudo bem, ela também é. Mas Julia Konrad é mais que isso. Forte, engajada e determinada, a atriz se destaca em diferentes áreas, exerce múltiplas habilidades e comenta sobre diferentes assuntos. Plural, ela é aquela típica artista que canta, dança, atua e sapateia e, agora, ainda se comunica em libras. A novidade está ligada ao próximo trabalho de Julia, o filme “Paraíso Perdido”, que tem previsão de estreia para o ano que vem. No longa, ela irá se comunicar com uma pessoa surda e, por isso, precisou aprender a linguagem de sinais. Para além da carreira, Julia Konrad ainda é uma das personagens reais de um cenário de representatividade com seus cabelos cacheados. Belíssima, ela os exalta no novo editorial do site HT. Em fotos exclusivas, a atriz posou para as lentes de Ricardo Penna com looks multicoloridos assinados por Herik Dumont, maquiagem de Ewerton Pacheco e cabelo de Marcelo Matos.

Jaqueta Gabriel Gil | Saia Apartamento 03 | Top Más Animale | Brincos Le Diamond | Sandália Arezzo (Foto: Ricardo Penna)

Em breve, Julia Konrad marca presença nas telonas mais uma vez. No elenco de “Paraíso Perdido”, de Monique Gardenberg, ela será Celeste, integrante de uma família super diferente. “O filme conta a história de uma família nada tradicional, que mora em um sobrado, onde na parte de baixo funciona uma boate parada no tempo, comandada pelo patriarca da família, José (Erasmo Carlos), avô de Celeste, minha personagem. No início do filme, Celeste descobre que está grávida do ex-namorado Joca (Felipe Abib), que provocou o término do relacionamento dos dois quando a traiu”, adiantou Julia que, no longa, ainda terá uma relação delicada com a mãe. “Celeste foi abandonada pela mãe na infância após uma traição e, portanto, cresceu muito próxima ao pai, o cantor Angelo (Julio Andrade), filho de José. Durante o desenrolar da história, ela terá que decidir se leva ou não adiante essa gravidez, ao mesmo tempo que resolve traumas passados pela traição e abandono da mãe”, completou.

Nesta história, a música ainda aparece como mais um personagem da trama. Com trilha sonora assinada por Zeca Baleiro e Erasmo Carlos como chefe desta família, o longa possui um incrível repertório interpretado por parte do elenco. Como nos contou, no primeiro momento, Julia Konrad não faria parte do núcleo musical. Mas isto foi só até ela soltar a voz. “Em tratamentos anteriores do roteiro, Celeste não cantava. Mas já no meu teste, quando descobriram que eu também era cantora, fizeram questão de me incluir nessa parte do filme. Foi divertidíssimo. Trabalhamos com o Zeca Baleiro nos números musicais, ele assina todos os arranjos. Foi incrível. Acho que meu trabalho como atriz está fortemente ligada à música, principalmente por conta da minha formação no teatro musical. Para mim, é sempre muito especial poder trabalhar esses dois lados juntos”, comemorou.

Jaqueta Gabriel Gil | Saia Apartamento 03 | Top Más Animale | Brincos Le Diamond | Sandália Arezzo (Foto: Ricardo Penna)

Porém, se por um lado a música foi uma habilidade antiga explorada por Julia em “Paraíso Perdido”, a linguagem de sinais foi uma necessidade da personagem. No longa, Celeste se comunica com uma pessoa surda e, por isso, a atriz precisou se dedicar às libras e aprender a técnica. Animada em ampliar seus conhecimentos, Julia Konrad afirmou que a experiência foi um presente para a profissão, para a vida pessoal e para o público deficiente auditivo amante do cinema. “Sempre que é preciso aprender algo completamente novo para um papel, isso me motiva muitíssimo. Amo estudar. Começamos a ter aulas de libras durante a preparação e eu mergulhei de cabeça. Acho que, como artista, quanto mais ferramentas tivermos para contar as mais diversas histórias, mais preparados estaremos tanto para nossa arte quanto para a vida. Além disso, havia uma sensação de responsabilidade com a história, principalmente com a comunidade surda, raramente representada com fidelidade nos filmes. Queríamos contar da melhor maneira possível, e acho que conseguimos”, comemorou.

Outra novidade que o próximo trabalho de Julia Konrad apresentará será a atriz de cabelo liso e franja. Durante as gravações, inclusive, ela compartilhou uma foto do visual no Instagram com o nome antigo do longa, “Jamais Estive Tão Segura de Mim Mesma”. Coincidência ou não, o título inicial de “Paraíso Perdido” é uma tradução do comportamento de Julia. Para ela, seus cachos são mais do que apenas alguns fios sobre o rosto. “O filme fala muito sobre isso, sobre a segurança da mulher na própria pele, e ao mesmo tempo, sobre fragilidade. Vejo meu cabelo cacheado como um símbolo de autoconfiança. Principalmente porque passei minha adolescência inteira brigando com meu cabelo, me achando feia por conta dele. Os meus cachos, na época maltratados, eram um símbolo da minha baixa autoestima na adolescência. Hoje em dia, eles me lembram de que minha confiança vai além da aparência. Amo meu cabelo natural, hoje acho ele maravilhoso, mas não tenho medo de brincar. Acho que precisamos nos libertar de qualquer tipo de ditadura sobre como deve ser nossa aparência”, destacou.

Blusão Levi’s | Ombreiras Jeferson Ribeiro | Saia Bianza | Bota Fernando Pires | Pulseira Tereza Xavier | Óculos Absurda | Brincos Dryca Ryzzo Design (Foto: Ricardo Penna)

E este não é um discurso restrito a essa transformação de Julia para o cinema. A todo momento, a atriz ressalta a importância de exaltar a beleza natural e a riqueza dos fios cacheados. A partir daí, Julia Konrad se sente livre para explorar seu cabelo de diferentes maneiras, como foi o caso da versão lisa para o cinema. “Precisamos nos aceitar como somos, independentemente de qualquer tipo de padrão. Sou contra qualquer tipo de ditadura quando me refiro à beleza ou a aparência. Precisamos saber nos sentir bem na nossa própria pele, mas que isso não nos impeça de brincar com o nosso visual. O primeiro passo é sempre nos valorizarmos do jeito que viemos ao mundo, a nossa beleza natural. Só assim podemos brincar de mudar sem que isso seja um escudo”, argumentou a atriz que destacou a importância de personalidades como ela se engajarem neste discurso de valorização do natural. “Quanto mais diverso for o nosso significado de beleza, mais estaremos incluindo todo tipo de corpo, de cabelo, de cor, de tamanho de nariz, de formato de boca, de orelhas… somos todos muito diferentes. Acho que se ater a uma ideia de uma beleza ‘padrão’ é um comportamento muito nocivo. A beleza verdadeira, a meu ver, está justamente no que faz cada um de nós ser únicos”, completou.

Vestido Gabriel Gil | Top Wymann | Sandália Ceconello | Brincos Drycca Ryzzo Design | Pulseira Tereza Xavier | Óculos Absurda (Foto: Ricardo Penna)

No entanto, no primeiro momento, Julia Konrad não se via como referência para as cacheadas. Porém, hoje, cada vez mais engajada nesta questão, a atriz reconhece que é vista como inspiração para muitas mulheres com fios parecidos com os seus. “Fico muito feliz quando recebo mensagens de meninas que estão aceitando os cachos, pedindo dicas de cuidados, e que eu fiz parte dessa mudança. Ao mesmo tempo, justamente por esse culto ao ego de hoje em dia, sinto que é uma responsabilidade enorme. Precisamos ser conscientes do tipo de exemplo que estamos dando nas redes e qual é a mensagem que estamos passando”, afirmou a atriz que, na sua infância, não se via representada, tal como é para as crianças cacheadas. “Cresci na Argentina, onde as mulheres são magérrimas, tem pernas finas, seios fartos e cabelos lisos até a bunda. Eu com meu cabelo cacheado armado, minhas pernas típicas de brasileira e busto pequeno me sentia muito longe de tudo aquilo que via ao meu redor. Eu não tinha referências de beleza nas quais eu me encaixasse. E lutava contra meu corpo, queria ser como minhas colegas, não entendia que simplesmente não era meu biotipo. Mas, quando finalmente a chave virou, e consegui me achar linda do jeito que sou, virei outra pessoa. E muito mais feliz. Hoje amo meus cabelos, minhas pernas, meus seios pequenos. São o que sou, quem eu sou. E não mudaria nada”, afirmou.

Vestido Gabriel Gil | Top Wymann | Sandália Ceconello | Brincos Drycca Ryzzo Design | Pulseira Tereza Xavier | Óculos Absurda (Foto: Ricardo Penna)

Ainda bem que hoje temos diversos exemplos de artistas como Julia Konrad que celebram diferentes belezas na mídia. Sejam as negras, as gordas, as ruivas ou qualquer outra particularidade, o importante é valorizar o natural, como destacou a atriz. Uma importante plataforma para isso é a internet que, além de ser uma vitrine desta diversidade, também permite uma interação entre essas personagens reais e seus seguidores. Para Julia Konrad, a rede social favorita é o Instagram que explora uma outra paixão da atriz como meio de comunicação: a fotografia. “Os perfis que sigo e que admiro contam uma história através das fotos, da escolha de cores, das temáticas… Conseguimos ver um pouco da sensibilidade da pessoa através disso. Num mundo em que tudo está tão superficial, a arte está tão ausente nas grandes massas, esta é minha forma de mostrar um pouco desse lado meu, minha personalidade. Confesso que me divirto bastante com isso”, contou a atriz que se preocupa em criar uma identidade visual e trabalhar seus registros antes de postá-los.

Porém, não são apenas as belas e até conceituais fotos de Julia Konrad que compõem sua conta no Instagram. Entre um clique e outro, a atriz abre espaço para debates contemporâneos, como o movimento pelo fim da cultura do estupro e pela reforma trabalhista. Com a sua visibilidade na internet e na mídia por causa de sua profissão, Julia acredita que este posicionamento público seja um dever seu perante a sociedade. “Acredito que como artista e pessoa pública tenho o dever de me posicionar sobre certos assuntos. Nem sempre isso é bem visto, mas acho que devemos usar nossas vozes para expressar as ideias e valores nos quais acreditamos. É muito fácil se perder no superficial hoje em dia, e acredito que como alguém que tem certa visibilidade, faz parte do meu dever abrir a oportunidade para se debater certos temas. Precisamos conversar mais. Ninguém se escuta, ninguém olha para o outro e tenta se colocar no lugar. Sem diálogo não há esperança alguma de progresso”, comentou.

Saia Más Animale para Vivará | Jaqueta Levi’s | Camisa estampada Elegance Plus Size | Body Jodemer | Cinto Shoulder | Bolsa Arezzo | Bota Schutz | Brincos Le Diamond (Foto: Ricardo Penna)

Assim como expressar sua opinião é um dever carregado de desafios, exercer a profissão de artista no Brasil de 2017 também não é uma tarefa fácil. Aliás, para Julia Konrad, esta é uma missão bem difícil. “Ainda somos minoria e, ao mesmo tempo, parece que não existe clareza por parte da população sobre o que é ser artista. As pessoas acham que nossa vida não passa de ir à academia, ao salão de beleza, ganhar roupas de marca, e mostrar tudo isso numa espécie de reality show digital. Não entendem que nosso trabalho é contar histórias, é provocar reflexões muitas vezes necessárias; que artista não é só quem aparece na TV, mas quem está por trás das câmeras, quem escreve os textos, quem cuida do figurino… artista é quem pinta, quem esculpe, quem dança, quem canta. Em meio a toda essa confusão, teatros fecham por falta de público, bailarinos passam fome por salário atrasado, e por aí vai”, lamentou.

Pantacourt Wymann | Bomber Douglas Harris | Camisa Shoulder | Cropped Nephew Cothing | Bota Arezzo | Colar Tereza Xavier | Brincos Dryca Ryzzo Design (Foto: Ricardo Penna)

E a dificuldade não está apenas na crise política, econômica e social pela qual o país está passando. Na opinião de Julia, os desafios também estão presentes nas novas exigências, nas variadas tecnologias que hoje fazem parte do cenário artístico e em mais uma extensa lista de fatores. “É um exercício diário se manter ser humano hoje em dia. As pessoas estão perdendo a humanidade, e o ator trabalha justamente com isso. O contato, o afeto, o toque, a respiração, a palavra – nossa mensagem passa através disso. Precisamos estar cada vez mais atentos para nos manter presentes no aqui e agora”, disse a atriz que, como solução, acredita que o estudo seja a única saída. “Precisamos estar preparados, respirando, trabalhando nossa arte. A diferença é que hoje o mercado exige uma certa visibilidade, principalmente no universo das redes sociais. Acredito que precisamos, como artistas da era do YouTube e do Instagram, estar abertos a novos formatos de expor nossa arte e de mostrar nosso trabalho. Quanto mais possamos adaptar tudo aquilo que estudamos e que treinamos para o público de hoje em dia, mais em contato estaremos com essas pessoas, e mais longe nossa mensagem irá chegar”, completou.

Pantacourt Wymann | Bomber Douglas Harris | Camisa Shoulder | Cropped Nephew Cothing | Bota Arezzo | Colar Tereza Xavier | Brincos Dryca Ryzzo Design (Foto: Ricardo Penna)

E esta é uma preocupação que Julia Konrad leva ao pé da letra. Lembra que dissemos que ela é uma artista que canta, dança, atua e sapateia? Não era brincadeira. Julia Konrad é formada em teatro musical pela American Musical and Dramatic Academy, de Nova York. “Quando estudei fora, se falava muito do artista ‘triple-threat’ ou ameaça tripla, no sentido de que devemos estar sempre refinando nossas habilidades artísticas para estar pronto para qualquer trabalho. Acredito que isso me ajuda muito tanto na hora de executar um personagem, no dia-a-dia de um set, e principalmente na hora do teste. Sempre estou preparada para qualquer situação, seja tocar uma música no violão, ou dar um texto em espanhol, ou, agora, demonstrar um pouco de libras. Quanto mais preparado você estiver como artista, mais variadas serão as portas que se abrirão”, apontou.

 

T-shirt Gata Bakana | Blazer Gata Bakana | Casaco jeans Fabiana Milazzo | Calça Dimy | Bota Fernando Pires (Foto: Ricardo Penna)

No âmbito profissional, a atriz revelou que deseja um dia poder viver bem de seu trabalho e, depois de se consolidar no Brasil, ganhar o mundo através das telonas. “Tenho muita vontade de trabalhar no mercado internacional como atriz, principalmente no cinema. Mas, acho que em primeiro lugar, quero poder passar mensagens importantes através do meu trabalho para todos aqueles que precisem escutar”, disse. Como cidadã, os desejos de Julia Konrad são coletivos. “Uma sociedade que pare de apontar o dedo somente para os defeitos do outro lado. Quem sabe mais unida, e com certeza, com mais igualdade de oportunidades para todos. Consciência moral e ética, e principalmente, empatia. É o que mais falta hoje em dia, e o essencial para qualquer sociedade”, idealizou a atriz que acredita que este seu sonho ainda esteja longe de se realizar. “Infelizmente, acho que estamos cada vez mais distantes dessa minha utopia. Mas, ao mesmo tempo, acho importante manter essa esperança bem acesa e fazer de tudo ao meu alcance para que, quem sabe um dia, esse futuro esteja mais próximo”, completou a atriz Julia Konrad.

T-shirt Gata Bakana | Blazer Gata Bakana | Casaco jeans Fabiana Milazzo | Calça Dimy | Bota Fernando Pires (Foto: Ricardo Penna)

Créditos:

Foto: Ricardo Penna
Styling: Herik Dumont
Produção de moda: Juliana Pollo
Make: Ewerton Pacheco
Hair: Marcelo Matos