*Por Domênica Soares
Eli Ferreira vive Marie, na novela da Rede Globo, Órfãos da Terra. Sua personagem é uma imigrante que chegou do Congo, uma mulher genuína, sincera, forte, amorosa e com muita vontade de viver. Não só pela sua história, mas por ser guerreira e, ao mesmo tempo, sensível que a fez superar grandes traumas e desafios de alguém que passou pela guerra e perdeu muito, principalmente entes queridos. Mas o que mais chama a atenção é seu sotaque. Muitos pensam que Eli é estrangeira, mas nasceu e foi criada em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense do Rio de Janeiro, onde teve apoio de inúmeras pessoas. “Familiares e amigos sempre torceram bastante. Desde a época dos concursos e dos comerciais. Sempre que me viam em campanhas, ou saía alguma matéria em revista ou jornais, vibravam. Tenho um vizinho, Carlinhos, que tem uma banca de jornais. Sempre que é publicado algo e ele vê, avisa a todos do bairro. A maioria fica muito surpresa com o sotaque que tenho na novela e alguns dizem: ‘Mesmo a conhecendo, eu fiquei na dúvida se você era mesmo gringa ou não”, entrega a atriz animada.
A artista comenta que teve uma super preparação para viver essa personagem e comenta que vem se dedicando desde dezembro de 2018 com aulas de prosódia, cultura congolesa, fono e dança africana. Além disso, ela conta que tem encontros semanais com a Mireille, uma refugiada congolesa que vive no Brasil há quatro anos e que tem um papel fundamental na construção do seu sotaque para a novela. Nesses encontros escutam músicas francesas e congolesas e conversam bastante, principalmente sobre a cultura local e a guerra civil que acontece há quase 20 anos na República Democrática do Congo. Eli lembra que saiu de sua primeira reunião com o diretor munida de 30 primeiros capítulos e com um documentário para assistir, mas que ainda assim buscou outras formas de se preparar e dispara: “Em janeiro, durante as gravações, estiquei meus dias em São Paulo e fiquei uma semana para visitar institutos, Ongs, conversei com outras pessoas em situação de refúgio. Hoje, mantenho um encontro, às vezes quinzenal, com uma fono. É um trabalho rotineiro, pois sempre que recebo texto, eu preciso transcrever para forma que falo com sotaque. Agora, já faço sem muita dificuldade, mas no início, eu sofri, cheguei a pensar que não conseguiria fazer o sotaque como devia, e atualmente, muita gente que não me conhece, acha que sou congolesa de verdade. Costumo dizer que sou africana na ancestralidade e no coração”.
A atriz diz que no início encontrou dificuldade, principalmente por ser uma personagem com seis anos a mais do que ela, com um filho adolescente vindo de outro continente e outras características distantes de sua realidade, mas declara que, ao longo do tempo, com a vivência na arte de interpretar, foi percebendo que já tinha a Marie dentro dela e que só precisava acessar e descobri-la.
Em entrevista exclusiva ao site Heloisa Tolipan, Eli fala um pouco sobre a questão dos refugiados no país e diz que são pessoas que precisam da atenção e do cuidado. Ela explica ainda que no Brasil estavam acontecendo alguns avanços, e que o mesmo era visto como um dos melhores países para se pedir abrigo na opinião dos refugiados e imigrantes. Contudo, atualmente, esse cenário passou por mudanças, não só em nosso país, mas também em todo o mundo. Para além da questão dos refugiados, conversamos um pouco sobre a representatividade nas novelas. Ela reflete sobre evolução, porque percebe que existem mais negros representando protagonistas em algumas novelas e que esse espaço vem sendo ocupado aos poucos, mas não deixa de frisar que ainda precisa melhorar muito e que a questão vai além dos personagens que estão na frente das câmeras. “Mas, ainda assim, entre os reais protagonistas, contamos nos dedos as chances que nos deram ou as produções que contaram nossa história. Precisamos de produções, de atores protagonizando, roteiristas, diretores, câmeras… A representatividade precisa estar atrás das câmeras também, precisa estar nos bastidores”. Ela discorre ainda que essas produções são essenciais para mostrar a realidade vivida pelas pessoas, fazendo um serviço social, trazendo informações que são usadas para quebrar preconceitos e estimular o melhor em quem está sendo representado.
Mesmo com todo o talento, a atriz não esconde que a decisão de começar na carreira de atriz foi acontecendo aos poucos e que precisou de tempo para aceitar que era realmente essa profissão que atingia seu espírito, corpo e mente para ser uma artista. Ela conta que na escola e na igreja estava sempre à frente dos grupos de dança e de canto, chegou até a pensar em ser uma jogadora profissional de handball, mas com o passar do tempo viu que a arte era realmente o que a movia. Então, começou a representar personagens importantes e que a ensinaram muito, e, atualmente, ganhou esse papel em ‘Órfãos da Terra’ que concretiza ainda mais a grande carreira que virá pela frente. “Nos meus personagens aprendi muito. Com a Carmem, em Malhação, é que não existe amor maior que o amor de uma mãe por seus filhos. Com a Tiana, em Tempo de Amar, que nunca é tarde para sonhar. Ela era uma analfabeta que, na reta final, se tornou uma professora. E com Marie estou aprendendo ainda, mas o que posso dizer é que, quando a gente acha que não, a gente tem mais e mais para doar de nós mesmos. Amor não tem limite”.
Eli Ferreira está mostrando que a cada papel interpretado desenvolve ainda mais suas habilidade de interpretação em seus personagens com muita personalidade e características única. Para se definir em uma palavra ela diz ser perseverante e comenta que Viola Davis é uma de suas grandes inspirações. Sobre sonhos, a artista comenta que conhecer a África do Sul é atualmente seu maior objetivo, mostrando que a atriz busca se informar e agregar cultura para sua vida em todos os momentos para se profissionalizar cada vez mais, além de se tornar uma pessoa informada, autêntica e com experiência para o futuro.
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