Elenco do belo filme Como Os Nossos Pais, de Laís Bodanzky, fala da questão da mulher na sociedade e da influência da vida pessoal no longa


O longa fala sobre a dificuldade de relacionamento entre pais e filhos e traz um personagem polêmico que possui um cargo importante no governo de Dilma Rousseff

O domingo começou agitada com o encontro do site HT com a turma do filme Como Os Nossos Pais, que levantou a questão da mulher na sociedade atual. No roteiro, Maria Ribeiro, Clarisse Abujamra, Paulo Vilhena e grande elenco mostram um retrato que se repete em muitas casas de família onde é preciso ser esposa, profissional, filha e mãe sem desapontar nenhum lado. A protagonista se encontra em um conflito pessoal no qual não sabe como enfrentar dificuldades no casamento, cuidar de sua família e manter seus sonhos. “Não queria fazer um discurso de mulheres contra homens porque não é sobre isto que estamos tratando. A verdade é que o homem sempre acabou sendo mais privilegiado e começamos a querer o nosso espaço. Com esta luta, estou amando ser do gênero feminino. Temos que criar uma sociedade que seja boa para os dois lados e precisamos falar muito sobre isso senão será mais mil anos assim. O filme mostra um formato de família monogâmico que não aceita outras formas de relacionamento e isto me parece arcaico. Esta ideologia não funciona mais para um mundo tão avançado, está fora dos nossos padrões, porque esta estrutura coloca a mulher completamente à margem. Dessa forma, pretendo expor uma situação para, quem sabe, mudar os fatos”, informou a escritora e diretora do longa  Laís Bodanzky que está concorrendo ao título de melhor longa nacional do Festival de Cinema de Gramado.

Não há dúvidas que as grandes estrelas do longa foram as mulheres que atuaram nele e o galã Paulo Vilhena garantiu que topou fazer o filme sabendo que este colocava o feminino em protagonismo. “Os homens devem se referir a este discurso com muito respeito. Temos que abrir os caminhos para elas de formas a entendermos juntos como reformular a sociedade. Me questionei muito como deveria, como homem heterossexual, me portar diante destes discursos feministas e da comunidade LGBT e cheguei à conclusão que preciso ficar quieto porque temos que entender que é um momento muito importante para a sociedade”, sugeriu o ator que faz um marido dedicado e amoroso da protagonista, mesmo que ambos estejam enfrentando dificuldades no relacionamento.

Laís Bodanzky (Foto: Diego Vara / Pressphoto)

Além da relação de marido e mulher, a trama mostra uma comunicação muito conturbada da protagonista, vivida por Maria Ribeiro, com sua mãe, uma senhora que mantém o espírito jovial e atrai olhares por onde passa. “Quando uma filha se torna adulta existe uma vontade de querer ter seu espaço no mundo, outras podem ser uma marionete das mães ou querem ser o oposto. O atrito nesta relação faz parte da vida quando chega à maioridade e precisamos falar sobre isto para que o conflito seja amenizado. No filme, por exemplo, existe diálogos muito fortes entre ambas que estão tentando entender o mundo que se localizam. Além disso, elas não conseguem se colocar no lugar da outra porque são realidades e sentimentos diferentes, nossa tentativa é mostrar todos os lados da moeda. Com esta trama buscamos entender o que está por trás daqueles desentendimentos”, explicou Laís Bodanzky.

Paulo Vilhena, Clarisse Abujamra, Maria Ribeiro e Laís Bodanzky (Foto: AgNews)

A mãe da personagem é Clarisse Abujamra que afirmou se identificar de cara com o papel porque também tem filhos e entende de perto a relação. “Existe uma dificuldade da mãe se abrir com a filha no relacionamento de ambas, porém a mais velha sempre vai evitar uma notícia cruel para não haver o sofrimento do mais novo”, comentou. Assim como a atriz, Maria Ribeiro possui uma familiaridade muito grande com a situação que o filme apresenta por ter sido criada por uma mulher mais velha. “ Existe uma grande diferença de pensamentos, sinto que, hoje em dia, a minha geração é muito mais próxima de seus filhos do que antigamente”, sugeriu a jovem atriz.

Maria Ribeiro e Laís Bodanzky (Foto: Diego Vara / Pressphoto)

A intercessão entre as histórias das atrizes com o filme foi proposital. De acordo com a diretora e roteirista, cada pessoa foi escolhida a dedo devido a qualidades que possuem em seu dia-a-dia. “Escolho o elenco através dos atores que acredito terem uma qualidade positiva que quero no meu personagem. Alguma coisa dele que será emprestado para o papel. A Clarisse, por exemplo, exibe uma sensualidade muito grande, o Paulo possui um lado amoroso que queria neste homem e a Maria tem opiniões fortes e feministas”, exemplificou a cineasta.

Coletiva de imprensa com elenco e equipe do longa brasileiro “Como Nossos Pais”.
(Foto: Cleiton Thiele / Pressphoto

Além das relações polêmicas, Como Os Nossos Pais traz um personagem que é político funcionário do governo de Dilma Rousseff. Quando o roteiro foi escrito, não havia a possibilidade de um impeachment ou da sucessão de fatos que aconteceram desde então o que torna o personagem de Jorge Mautner ainda mais intrigante. “Meu objetivo, na época, era que a família da Rosa, a protagonista, fosse politizada com um universo de intelectuais de esquerda, uma geração que viveu a contracultura e a liberdade. E dentro desta perspectiva mostrar que até mesmo ali existe machismo e opressão da mulher. Para mim, estes personagens acompanharam esta luta e parecia ser lógico para mim que ele se tornasse um político com um cargo de destaque”, garantiu a diretora que ainda contou que o ator criou todas as suas falas no momento da cena por acreditar não ser possível decorar suas falas.

Paulo Vilhena (Foto: Cleiton Thiele / Pressphoto

Todas estas relações conturbadas não saíram apenas da cabeça de Laís. O outro roteirista é seu ex-marido Luiz Bolognesi e, na época que foi escrito o texto, ambos ainda estavam juntos. No entanto, os dois afirmaram que o relacionamento conturbado do casal não foi autobiográfico. “A minha busca é construir personagens que tenham sombras e sentimentos muito profundos. A ferramenta pessoal que tenho para construí-los é a antropologia, quando a gente aprende a lidar com o outro sem colocar as nossas opiniões ali”, contou Luiz Bolognesi. O relacionamento dos dois durou cerca de 20 anos e acabou há 2 anos. Laís garantiu que existe um pouco de seu ponto de vista no longa, mas não chega a ter um caráter pessoal. “Em qualquer filme que eu faço, sempre estou na tela. Por mais distante que esteja daquele universo, existem as minhas emoções e meus pontos de vista na tela. Neste longa decidi fazer um recorte da minha geração e, logicamente, me identifico com aquele universo. O que acho curioso é que me identifico assim como várias outras mulheres que já assistiram. É um encontro de várias situações”, explicou Laís. Apesar do término, ambos continuam participando de projetos juntos e garantem continuar com uma boa relação.

Paulo Vilhena e Maria Ribeiro (Foto: AgNews)

Um dos temas que está sendo colocado em pauta no Festival de Gramado é a falta de filmes nacionais acessíveis a deficientes físicos. A diretora afirmou que Como Os Nossos Pais irá ser adaptado para surdos. “A legenda já está em processo de confecção. Acho importante este movimento não só pela lei como em editais que incentivem, porque não é algo barato, mas é fundamental que todos tenham acesso à informação e emoção através do cinema”, garantiu.