E como fica “Travessia” na reta final? Listamos 5 novelas que patinaram na audiência ao substituírem trama de sucesso


Travessia está na reta final. Tal como outras novelas que sucederam fenômenos de audiência e repercussão, a novela de Glória Perez, que substituiu “Pantanal”, não pontuou bem no Ibope e foi alvo de duras críticas. Telespectadores e especialistas opinam sobre os motivos que levam ao insucesso os folhetins que entram no lugar de obras bem sucedidas. A escritora de “Travessia” viveu algo semelhante com “Salve Jorge’, trama que veio no rastro de “Avenida Brasil”. Com “O Clone”, experienciou o oposto. A novela deu vez a “Esperança”, desventurado projeto de Benedito Ruy Barbosa. Com “Em Família”, coube a ela vir após o fenômeno “Amor à Vida” e os índices da trama global despencaram. De igual forma, “Babilônia”, substituta de “Império”, é até hoje uma das mais baixas médias da faixa. Veja em detalhes.

*por Vítor Antunes

“Travessia” se encaminha para a reta final. A trama de Glória Perez passou por muitas críticas e dificuldades de recepção junto ao público. A novela, que estreou em 10 de outubro do ano passado, fez 25 pontos em seu primeiro capítulo e oscilou para baixo em seu primeiro mês, assinalando 23,3 de média. Chegou a atingir 15 pontos na véspera do Natal daquele ano. Somente em janeiro de 2023, a trama iniciou um processo de recuperação de audiência, que é ascendente, mas ainda longe da meta costumeiramente atribuída ao horário, que é de 30 pontos. Somente ao fim da trama será possível estabelecer se ela suplantará ou não “Um Lugar ao Sol“, no posto de pior média de audiência na faixa. Coincidentemente, outra trama de Glória Perez , “Salve Jorge“, substituiu “Avenida Brasil“, fenômeno entre 2012/2013. A novela sobre tráfico humano patinou na audiência na época, foi duramente criticada, e só teve seu lugar ao sol em 2020. Desde então, o folhetim figura sempre entre os 10 programas mais vistos do Globoplay.

Telespectadores contatados pelo Site Heloisa Tolipan opinaram sobre os motivos que podem colaborar para que uma trama fracassada suceda uma anteriormente aclamada. Para o professor de teatro e crítico Matheus Guelsi, do canal “Nosso Drama“, “o sucesso de uma novela é formado por um conjunto de fatores muito além da obra em si. Se o espectador gosta e se acostuma com a linguagem da novela atual, mas a seguinte vem com outra proposta, muito diferente, ele possui muito mais autonomia para procurar outras obras (em outros serviços talvez) que se aproximem da linguagem desta que acabou”. Algo que dialoga com a fala do vendedor Rodrigo Cunha, de Sorocaba (SP): “Eu acho que o problema é o início da trama. Se ela não vem com uma primeira semana agitada, as coisas não funcionam. O público do sucesso anterior quer continuar se emocionando de alguma forma”. Já o designer Instrucional Jefferson Luchtenberg, de Joinville (SC), tem uma outra percepção: “A galera nota que a novela tomou meses da sua atenção e promete não se apegar na próxima”.

O professor Ângelo Morais, de São José dos Campos (SP), justifica a quebra de audiência de duas maneiras. Uma delas, mais crítica à própria trama das 21h. “A proposta inicial, o enredo, era legal mas, curiosamente, a Gloria Perez não soube desenvolver. Havia expectativa por causa de “A Força do Querer” [recentemente reprisada em Edição Especial em razão da pandemia]”. Morais também apresenta uma outra possibilidade. “Há, para o espectador, o luto da novela que acabou”. Algo que coaduna com o que diz a dona de casa Cláudia Regina, de São João de Meriti (RJ). Telespectadora assídua de “Travessia” e shipper do casal Brisoto, Regina diz gostar da atual trama em cartaz, mas prefere sua antecessora. “Gosto das duas, mas prefiro “Pantanal”, não tem nem comparação”. Para Morais, outro elemento pesa em favor da trama de Benedito Ruy Barbosa: a divulgação, que atrapalhou inclusive a sua antecessora, “Um Lugar ao Sol“, novela que, segundo ele, não recebeu um tratamento equânime:

“Pantanal” não somente sufocou “Travessia”, como “Um Lugar ao Sol”, que veio antes. A Globo começou a divulgar “Pantanal” ainda durante a reprise em edição especial de “Império” – Ângelo Morais, professor

Para Matheus Guelsi, há de se contar também a dispersão do público para outras plataformas após o fim de uma novela. “A grande quebra de audiência de uma obra para a outra talvez seja a busca cada vez mais atual por nichos específicos para se assistir”, opina. Veja a seguir cinco casos de novelas que substituíram fenômenos e fracassaram junto ao público.

“Chiara tem tudo o que quer”: personagem de Jade Picon centralizou as atenções, os memes e as críticas em “Travessia” (Foto: Divulgação/TV Globo)

“Travessia” substituindo “Pantanal”

“Travessia” estreou cercada de expectativas. A novela de Glória Perez objetivava tratar sobre tecnologia em seu núcleo principal, além de trazer outras questões sociais importantes ao debate contemporâneo, como a pedofilia, e assuntos pouco falados, como o quimerismo –  condição genética rara, que determina que o indivíduo possua dois tipos distintos de DNA em seu corpo. O desafio de substituir “Pantanal” era grande. A despeito do talento da sua autora, a novela não caiu no gosto popular. Iniciou sendo criticada por trazer a influencer e ex-BBB Jade Picon debutando como atriz. O público do Twitter também achou equivocado o tratamento do deep-fake – adulteração digital do rosto de pessoas em vídeos ou fotografias – abordado na trama como uma “brincadeira de criança”, assim como criticou também, a inclusão do robô Haroldo como personagem. “Travessia” só foi engrenar em audiência em sua reta final. Somente nos próximos dias será possível saber se ela substituirá ou não “Um Lugar ao Sol“, do posto de menor audiência de uma novela inédita no horário nobre, cerca de 25 pontos. “Pantanal”, além de alavancar a audiência de sua antecessora, justamente “Um Lugar ao Sol“, marcou a média estipulada para o horário, 30 pontos. Um destaque da trama foi o casal Stênio (Alexandre Nero) e Heloísa (Giovanna Antonelli). Os atores compuseram o elenco da novela “Salve Jorge” e  voltaram em “Travessia”, igualmente com shippers. Porém, o público criticou o fato de a escritora do folhetim “esquecer” na novela de 2013 a filha do casal, Drika (Mariana Rios), o genro e o neto de ambos.

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Travessia. Novela das 21h não teve muito engajamento junto ao público (Foto: Divulgação/TV Globo)

“Salve Jorge” substituindo “Avenida Brasil”

Outra novela de Glória Perez, “Salve Jorge” não foi bem-aventurada em sua exibição, no ano de 2012. A trama, que trazia Nanda Costa e Rodrigo Lombardi nos papéis protagonistas, não conseguiu manter os índices de “Avenida Brasil“, sua antecessora, que anotou 39 pontos de média. “Salve Jorge” fez 34,3. Diante da repercussão controversa da trama que falava sobre tráfico humano e a ascensão da classe C – já que um dos principais núcleos da novela era situado no Complexo do Alemão, uma comunidade favelizada do Rio, a autora declarou em seu Twitter que o público “não sabia voar“, como forma de justificar a baixa quantidade de adeptos à novela. A vilã interpretada por Cláudia Raia, que matava seus inimigos com seringas envenenadas também gerou muitas críticas, assim como o penteado instável de Morena (Nanda Costa), a protagonista. Curiosamente, o mérito de “Salve Jorge” foi reconhecido anos depois e desde 2020 o folhetim consta, semanalmente, entre as dez maiores audiências do Globoplay.

Em “Salve Jorge”, Drika e Pepeu tiveram um filho. Esta família nunca foi citada em “Travessia”, trama na qual os pais da personagem integram (Foto: Divulgação/TV Globo)

“Babilônia” substituindo “Império”

Este é o seu novo conflito das nove“. Assim foi anunciada “Babilônia”, novela de Gilberto Braga (1945-2021), Ricardo Linhares e João Ximenes Braga. Por coincidir com o cinquentenário da Globo e com a expertise de seu autor principal, a trama contou com um lauto investimento da casa: Um elenco estelar, assim como muitas locações internacionais – Luxemburgo, França, Emirados Árabes. Depois da exibição de um primeiro capítulo eletrizante, a trama arrefeceu, assim como o pensamento de que ela aumentaria ou estabilizaria a audiência de “Império”, novela que ocupava o horário anteriormente. Ainda no primeiro episódio, causou uma celeuma a exibição de um beijo gay protagonizado por Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg. O forte teor sexual,  e a presença de muitos personagens com moral duvidosa pesaram em desfavor à trama de Gilberto Braga, que chegou a lastimar publicamente o fato de sua novela dar muito menos audiência que “I Love Paraisópolis“, trama das 19h da época. Em Goiânia, por exemplo, a novela das 21h chegou a marcar apenas 14,5 pontos. O último capítulo do malfadado folhetim de 2015 rendeu 32,2 pontos de audiência à Globo. A antecessora, “Império”, marcou 50 pontos no Rio e 46 em São Paulo.

Babilônia. Novela não manteve os índces da antecessora “Império”. Chocou e afastou o público (Foto: Cláudio Maragaia/TV Globo)

“Em Família” substituindo “Amor à Vida”

Em Família” era, sabidamente, a última novela de Manoel Carlos. O veterano já vinha demonstrando, pelo menos desde 2003, quando escrevera “Mulheres Apaixonadas“, a vontade de aposentar-se. Com a trama de 2014, Globo e autor solidificaram esta ideia, chamando Julia Lemmertz para viver “a última das Helenas de Maneco”, encerrando a saga iniciada por sua mãe, Lilian Lemmertz (1937-1986), em “Baila Comigo“, de 1981. Todavia, a trama que sela a aposentadoria de Manoel Carlos passou com indiferença pelo público, que reclamava inclusive da falta de história na trama. Não havia ganchos ao fim do capítulo nem uma grande reviravolta. Morno, o conflito de amor entre Helena, sua filha Luiza (Bruna Marquezine) e Laerte (Gabriel Braga Nunes) não gerou empatia junto ao espectador, que sentia falta das peripécias de Félix (Mateus Solano), na rocambolesca “Amor à Vida” (2012). A novela de Manoel Carlos fez 29,6 de média, ante 35 de sua antecessora.

Julia Lemmertz. A última Helena de Manoel Carlos era a protagonista de “Em Família” (Foto: Divulgação/TV Globo)

“Esperança” substituindo “O Clone”

“O Clone”, de Glória Perez foi um sucesso absoluto. A trama é, ainda hoje, uma das mais vendidas da Globo, assim como auxiliou na solidificação da carreira de Giovanna Antonelli, sua protagonista. Após a boa resposta da novela sobre clonagem humana, a Globo escalou uma substituta que rompia totalmente com aquela proposta. Era “Esperança”, uma novela de época, escrita por Benedito Ruy Barbosa, autor que vinha colhendo os louros de outro sucesso do mesmo horário, “Terra Nostra“. Inicialmente respondendo bem em audiência, por mais que fosse estranho para boa parte do público uma trama de época às 21h, horário geralmente afeito a novelas contemporâneas, a audiência de “Esperança” começou a cair um mês depois de sua estreia. Somado a isso, Benedito Ruy Barbosa passou por problemas pessoais que obrigaram-no a deixar a trama, assumida por Walcyr Carrasco, que fez os índices subirem em sua reta final. A média de “Esperança” foi de 38 pontos, diferente do projeto de Glória Perez, que assinalou 47.

Priscila Fantin, Reynaldo Gianecchini e Thiago Afonso em “Esperança” (Foto: João Miguel Junior/Divulgação TV Globo)