*por Vítor Antunes
Um dos pilares do jornalismo, por óbvio, passa pela credibilidade, pelo zelo com a notícia. Mas, além disso, pela efetividade da comunicação, pela clareza, pela flecha certeira no alvo do leitor/telespectador. Depois de mais de duas décadas de Grupo Globo, e mais que isso, alguns anos como palestrante de tecnologia e de melhoria e efetividade na comunicação, Christiane Pelajo se lança num novo desafio: O surgimento de um novo canal jornalístico no Brasil, a versão nacional da NBC – gigante americana -, mas especializado em negócios, a CNBC. Além do pioneirismo, já que ela também esteve presente no lançamento da GloboNews, Christiane aponta que o elemento definitivo para a mudança de trajetória foi um câncer, descoberto em 2017. “Eu pedi demissão da Globo há exatamente dois anos. Percebi que o propósito de vida era outro, especialmente depois que tive um câncer no rim. Um diagnóstico como esse é um soco no estômago, e nos faz rever tudo o que vem passando na vida. Naquela época entrei numa jornada muito profunda de autoconhecimento que me fez repensar minhas escolhas”.
A comunicadora prossegue dizendo que a sua experiência com o tumor foi transformadora: “Com essa história do câncer, eu dei sorte. Ele estava completamente encapsulado. Fiz uma cirurgia robótica, o médico tirou um terço do meu rim direito. Não precisei fazer quimioterapia nem radioterapia. Não tenho nada a reclamar, mas descobri que meu propósito de vida hoje é destravar a comunicação do maior número de pessoas possível. Tanto que subi ao palco, falei sobre os mais variados assuntos, já que dou palestras sobre os mais variados temas, tanto como comunicação, como de tecnologia, inteligência artificial generativa, e inovação que gosto muito e estudo bastante. Por estar imersa nesse universo de negócios é que veio o convite da CNBC, que estava totalmente alinhado com o que venho fazendo nos últimos dois anos. Estou muito animada. Tenho certeza que vamos fazer algo diferente do que se viu até agora no Brasil”, diz ela. Ainda que não tenha uma data publicamente definida, estima-se que a CNBC estreie ainda no segundo semestre deste ano.
Diferentemente das grandes ressalvas que ainda permeiam as redações quanto ao uso da inteligência artificial (IA), Christiane Pelajo é uma entusiasta do uso da ferramenta no jornalismo. “Há um grande debate nas redações sobre como usar e de que maneira usá-la. A Inteligência Artificial generativa é a maior revolução dos últimos 50 anos, isso se não for a da nossa existência. Assim como quando criaram o iPhone, sabíamos que era algo diferente, com a IA é a mesma coisa. Sabemos que é uma revolução, mas não sabemos onde vai chegar. Temos que aprender a usá-la”. Assim como muito se diz que a IA extinguirá/extinguiria o jornalismo, algo semelhante se fala sobre a profusão de influencers e de comunicadores sem formação acadêmica. Nisso, a jornalista é definitiva:
Muita gente se acha meio que jornalista, mas na hora que o bicho pega, quando algo importante está acontecendo no Brasil ou no mundo, os brasileiros procuram os veículos de comunicação mais tradicionais, momento em que a audiência das grandes emissoras e dos jornais tradicionais aumenta. O público sabe que, se quer uma informação bem apurada, se quer a verdade, deve procurá-la nos veículos tradicionais. A função dos jornalistas vai durar muito tempo ainda, mas tem que se ter espírito, é algo que tem que estar no sangue, senão não adianta. Somos viciados em notícia, apuração, fontes. É algo de vocação – Christiane Pelajo
Segundo ele, “as habilidades comportamentais fazem a diferença neste universo. Precisamos desenvolver cada vez mais nossas habilidades de comunicação, gestão, liderança, criatividade. Isso aumenta nossa produtividade. Com mais tempo livre, podemos aprimorar nossas habilidades. A IA nos ajuda muito no surgimento de ideias, mas não num projeto pronto. O fator humano faz toda a diferença. A IA ajuda muito, inclusive no começo do processo criativo. As pessoas pensam em usá-la no meio ou no final, mas podem e devem usar desde o começo”.
PIONEIRISMOS
Christiane Pelajo esteve num dos momentos mais importantes de transformação de linguagem no jornalismo que foi o surgimento de um canal 100% dedicado às notícias. A GloboNews, quando surgiu em 1996, há quase 30 anos, portanto, foi um frescor, especialmente por pensarmos que o consumo de reportagem era bem focal até aquele momento: ou a hora do telejornal, ou à leitura do jornal impresso, ou aos momentos de notícia do rádio, especialmente o AM. Naquele momento o jornalismo se revelava dinâmico, desdobramento esse que levou aos dias atuais de notícias em multiplataformas. É com esse mesmo princípio de reconstrução, de frescor, que nasce a CNBC.
Ela nos conta que “A CNBC é o braço de business da NBC. E aí tem uma novidade que eu não contei para ninguém, nem para a direção. Quando decidi fazer jornalismo, meu sonho era trabalhar na NBC, que é uma das maiores do mundo. Eles são muito pioneiros, tanto que o grupo NBC Universal foi o primeiro a transmitir a cores nos Estados Unidos, em 1956. Um convite desses é impossível de negar”. Para fins comparativos, a primeira transmissão a cores do Brasil só veio a acontecer em 1973. E, uma curiosidade: quando a Band iniciou as suas experimentações em TV colorida, por referenciar-se na NBC e tê-la como parceira, passou a usar a mesma logo que a emissora americana. O pavão foi a logo da Band até, pelo menos, 1978. Ainda que tenha pedido demissão da Globo, a saída da antiga casa surgiu sem mágoas, apenas com muita gratidão. “Tudo que sei hoje de televisão, claro, devo à Globo e à Globo News. Mas tomei essa decisão com muita firmeza e serenidade”os e empresários.
Tenho muita sorte de, numa vida, estar no lançamento de duas emissoras. Claro que, no passado, era outra televisão, completamente diferente do que é hoje. Quando decidi fazer jornalismo, eu já sabia que queria trabalhar em televisão. Tinha isso muito claro na minha cabeça – Christiane Pelajo
Dentro do que pôde revelar, já que tudo que envolve o lançamento da CNBC ainda está envolto de muito mistério, fruto da estratégia de lançamento do canal, ela antecipou que uma das prerrogativas da emissora é ser multiplataforma. “É uma TV por assinatura, mas estaremos em absolutamente todas as plataformas que você possa imaginar. Essa é a ideia. Trata-se de uma emissora que tem mais de 500 milhões de telespectadores no mundo. A ideia é unir essa credibilidade, solidez e pioneirismo com um jornalismo feito para o público brasileiro. Lembro que no dia que a GloboNews foi ao ar pela primeira vez, nossa emoção foi de lágrimas nos olhos. Tenho certeza que isso vai acontecer de novo quando a CNBC Brasil entrar no ar”.
Não é de hoje que há um grande debate sobre a saúde mental dos jornalistas em tempo de hipermodernidade. Os casos de Burnout não são raros, pelo contrário. Christiane revela-se atenta com isso tanto com relação a si como por seus colegas de ofício. “Desde 2017, entrei nessa jornada de autoconhecimento que fez toda a diferença na minha vida. Tenho muita preocupação com saúde mental. A pandemia intensificou isso, com as pessoas trancadas dentro de casa e trabalhando muito mais. Temos que saber nossos limites e cuidar da nossa saúde mental”. Em tempos de eleições aguerridas e discursos ferinos, o que a preocupa é a integridade dos profissionais de comunicação. No dia em que esta reportagem estava sendo escrita, uma repórter do Maranhão foi agredida por um pré-candidato a vereador, do Maranhão. Na semana anterior, repórteres que cobriam um evento político também foram agredidos. “Já sofri agressões verbais, nunca físicas. A liberdade de expressão é algo que conquistamos há décadas e não vamos prescindir disso de maneira alguma. É fruto do amadurecimento da nossa democracia. Claro, temos que procurar ferramentas para nos protegermos, mas a liberdade de expressão é fundamental”.
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