Do desconhecido para enredo de cinema, Candé Salles lança documentário sobre o trabalho do médium João de Deus após cinco anos de convívio na Casa Dom Inácio


Nesses anos como médium, Oprah Winfrey e Naomi Campbell foram algumas das artistas que procuraram o dom do personagem do documentário. No entanto, isto não aparece em “João de Deus – o silêncio é uma prece”. “Eu não quis usar registros de arquivo para esse documentário”

Um cenário desconhecido e surpreendente. Longe dos centros urbanos e de toda a correria cosmopolita, Candé Salles achou a paz e a serenidade em seu novo documentário, que estreia amanhã, 14, no Festival do Rio. Em “João de Deus – o silêncio é uma prece”, o diretor registra o trabalho e um pouco da história de João Teixeira de Faria, o médium conhecido como João de Deus. Para o documentário, Candé ficou por cinco anos na Casa Dom Inácio, em Goiás, registrando o dia-a-dia de seu personagem na intimidade. Lá, ele aprendeu e descobriu sobre a importância de olhar para o lado e traz esta mensagem potencializada no documentário. No longa “João de Deus – o silêncio é uma prece”, Candé Salles contou que o resumo desses cinco anos na Casa Dom Inácio é uma mensagem de fé, amor e caridade.

No entanto, todos esses ensinamentos e descobertas foram frutos de uma curiosidade do diretor. De acordo com Candé, a vontade de contar sobre a história e o trabalho do médium veio depois de um amigo lhe contar sobre o caso de sua mulher que fora curada de um câncer pelo poder espiritual de João de Deus. “Eu tinha acabado de lançar o filme sobre Caio Fernando Abreu e estava em busca de documentar a vida de pessoas interessantes. Quando fiquei sabendo dessa história, fiquei curioso e fui conhecer o João. E aí, quando estive com ele, tive a certeza de que esse seria o meu próximo documentário”, lembrou.

Foi então que Candé Salles arrumou as malas para uma experiência transformadora na Casa Dom Inácio, em Goiás. Lá, o diretor disse que fez um mergulho dentro de si e descobriu valores que haviam sido esquecidos com a correria da cidade grande. “Aquele é um lugar em que a gente trabalha o silêncio e a meditação. Sendo que eu sou muito agitado e estou o tempo todo ligado no 220 volts. Então, essa experiência me proporcionou um autoconhecimento. Durante o tempo que fiquei lá, precisei apreender a desacelerar e me escutar mais”, explicou o diretor que, antes dessa viagem, não conhecia o trabalho do médium João de Deus e nem da Casa Dom Inácio. “Eu não tinha a menor ideia do que iria encontrar lá. Eu fui para Goiás em uma mistura de documentarista e detetive”, confessou.

Candé Salles e João de Deus (Foto: Divulgação)

Mas a surpresa foi boa. Neste trabalho de autoconhecimento, o diretor contou que se impressionou com os valores e ideias defendidos pelas pessoas que fazem parte deste cenário. “No dia-a-dia das grandes metrópoles, muitas vezes nos esquecemos de olhar para o outro e ver se podemos ajudar de alguma maneira. Muitas vezes, apenas um olhar e um sorriso são o suficiente para mudar o dia de quem não conhecemos. E lá eu pude ver o espírito de doação das pessoas. A minha vida sempre foi muito acelerada e, por isso, até individualista. Mas a Casa Dom Inácio me fez mostrar que no mundo existem outras mil pessoas ao meu redor com problemas e desafios”, disse.

Neste trabalho, mais do que o bom resultado profissional, Candé Salles comemorou a experiência positiva na vida pessoal. E, como regente disso tudo, estava o protagonista do documentário, o médium João de Deus. “O tempo todo o João foi maravilhoso”, afirmou o diretor sobre o documentário que o apresentou uma nova forma de trabalhar. “Na Casa Dom Inácio, eu precisei estar sempre na minha para não atrapalhar o trabalho dele. Foi uma experiência muito difícil de filmar em um lugar em que as leis não são regidas pelo campo terrestre. Então, para mim, foi enriquecedor entender como e o que eu poderia filmar para conseguir registrar a verdade daquele cenário sem que isso atrapalhasse”, lembrou.

Aliás, foi justamente por isso que Candé Salles recebeu o aval do médium para seguir com seu documentário. De acordo com o diretor, mesmo depois de um tempo registrando o trabalho na Casa Dom Inácio, João de Deus ainda não tinha entendido o propósito da presença de Candé ali. “Uma vez, ele me perguntou se eu iria fazer um filme sobre a verdade. Eu respondi que sim e ele me disse que, sendo assim, eu poderia filmar tudo o que quisesse e precisasse. A partir daquele momento, tudo fluiu”, contou o diretor que considera João de Deus, depois dessa experiência tão intensa, mais que um personagem, um pai e um guia espiritual.

Depois desses anos de convívio, Candé considera hoje o médium seu pai e guia espiritual (Foto: Divulgação)

Assim como o médium passou a ter um espaço especial na vida de Candé Salles, que até então desconhecia este cenário, João de Deus também já atraiu nomes fortes das artes mundiais por causa de sua força espiritual. Nesses anos como médium, Oprah Winfrey e Naomi Campbell foram algumas das artistas que procuraram o dom do personagem do documentário. No entanto, isto não aparece em “João de Deus – o silêncio é uma prece”. “Eu não quis usar registros de arquivo para esse documentário. A única imagem que aparece e não fui eu que fiz foi o encontro do João com Chico Xavier. De resto, os artistas que estão no filme foram frutos de encontros desses cinco anos”, explicou sobre a presença de Juliana Paes e Claudia Raia no documentário.

Sendo assim, a ideia de Candé Salles com seu novo documentário é que as pessoas conheçam esse símbolo de fé e agreguem um pouco do comportamento doador destacado na Casa Dom Inácio. “Eu quero tentar mostrar que todos nós precisamos olhar um pouco mais para os lados e identificar onde podemos ajudar. Ninguém está sozinho neste mundo e só iremos conseguir mudar algo se tivermos esse espírito agregador. Nós precisamos espalhar amor entre as pessoas”, defendeu o diretor que em momento nenhum se preocupou com a carga de intolerância religiosa moderna que o filme poderia ter.

Ah, e sobre o caso que motivou tudo isso, Candé Salles acredita que, depois desses cinco anos ao lado de João de Deus, a cura está dentro de nós. Católico, o diretor acredita que o equilíbrio da vida é um dos elementos que possibilita a autocura. “Se cada um conseguir se conhecer melhor, se limpar e ser uma pessoa boa energicamente, é possível identificar um caminho melhor. Com o seu João, eu aprendi que a cura está dentro de cada um de nós. Ele sempre diz que ele não resolve nada, quem nos cura é Deus. O trabalho dele é ajudar a fazer uma conexão direta de nós humanos com o plano celestial”, explicou.

Candé Salles (Foto: Divulgação)

E toda essa história de, de fato, fé, amor e caridade, como Candé Salles destacou no começo da entrevista, será descoberta amanhã. Como parte da programação da 19ª edição do Festival do Rio, o diretor irá lançar o filme “João de Deus – o silêncio é uma prece”. “Em 2014, eu também participei do festival e foi maravilhoso. Me abriu muitas portas quando eu estreei o filme dobre Caio Fernando Abreu. Eu acho que um evento como esse na cidade representa um sopro de cultura. É um momento em que a gente consegue respirar e trocar ideias sobre a arte”, analisou Candé que ainda destacou o bom momento da criação audiovisual no Brasil. Para o futuro, o diretor contou que irá lançar seu próximo documentário, desta vez, sobre Marina Lima. “Nós fomos casados e moramos juntos por muitos anos. Desde então, eu já venho registrando ela e, desde quando ela se mudou do Rio de Janeiro para São Paulo, eu tive a ideia de seguir nesse projeto”, explicou Candé Salles sobre o trabalho que será lançado no canal Curta.