Direto de Paris, Maria Fernanda Cândido divulga filme, diz que sente saudade das novelas e revela planos perto dos 50


Morando em Paris, a atriz lança ‘A Paixão Segundo G.H.’,inspirado no livro homônimo de Clarice Lispector, o novo longa-metragem de Luiz Fernando Carvalho, que entra em cartaz nos cinemas a partir do dia 11 de abril. Nesta super entrevista por vídeo, Maria Fernanda descortina seu processo e impressões sobre o longa, um marco em seus 30 anos de carreira. E também fala da participação em ‘Renascer’ e se deseja fazer outra novela, compartilha seus pensamentos sobre a maternidade na maturidade, divide experiências sobre a vida fora do Brasil e revela o desejo de fazer mais pela sociedade daqui para frente. Ela diz ainda, ao pensar nos 50 anos que completa em maio: “O melhor da maturidade é ter menos ansiedade e uma fruição do próprio percurso. Você talvez fique menos preocupada em conseguir resultados e mais atenta em percorrer o caminho. É aquela coisa: não é tanto o destino da viagem, mas a viagem em si. Você fica mais consciente disso e menos ansiosa para chegar. Acho que se vive melhor”

*Por Brunna Condini

Maria Fernanda  Cândido conversou com o site por vídeoconferência, direto da sala do seu apartamento em Paris, sobre o lançamento de ‘A Paixão Segundo G.H.’, filme de Luiz Fernando Carvalho, em cartaz nos cinemas a partir de 11 de abril. A atriz tem sido vista no cinema nos últimos anos, mas quebrou o jejum de sete anos na TV com uma participação afetiva em ‘Renascer’, como Cândida mulher que muda a vida de José Inocêncio (Humberto Carrão / Marcos Palmeira), quando o acolhe. Foi nas terras dela que ele começa o seu império. “O Gustavo (Fernandez, diretor artístico da trama), me chamou para fazer um papel maior, mas morando aqui não dá. Então, dias depois, ele me ofereceu a Cândida. Topei porque é uma personagem inspiradora, pela minha parceria com ele que é antiga, e também por ser uma obra do Benedito (Ruy Barbosa, autor da história original). Estreei na Globo em uma trama dele, ‘Terra Nostra‘ (1999). A participação foi um presente dessa família, que adoro. O Benedito, as filhas, os netos. Conheci o Bruno (Luperi, autor do remake e neto de Benedito) ainda criança”, conta Maria Fernanda, que completa 30 anos de carreira.

Sentiu vontade de atuar na novela inteira? “Sim, é muito gostoso. Quando fui gravar, já conhecia todo mundo, fui recebida com o maior carinho. Como estou fora do Brasil, recebi abraços apertados e gostei desse calor humano que a gente só recebe dos brasileiros. Foi uma experiência muito reconfortante”, analisa.

A atriz se prepara para filmar um novo longa e fazer uma segunda temporada do recital dramático com a pianista Sonia Rubinsky agora em maio por lá. A primeira temporada do projeto foi em 2022 e homenageou Clarice Lispector (1920- 1977): “E o primeiro dia da nova temporada acontece no meu aniversário, 21 de maio (ela faz 50 anos). Será um presentão”, revela.

Maria Fernanda Cândido divulga novo filme, fala que sente saudade das novelas e revela desejos perto dos 50 (Foto: Jairo Goldflus)

Maria Fernanda Cândido divulga novo filme, fala que sente saudade das novelas e revela desejos perto dos 50 (Foto: Jairo Goldflus)

Morando há sete anos em Paris, com o marido, o empresário francês Petrit Spahija, com quem está casada desde 2005, e os dois filhos do casal,Tomás, de 18 anos, e Nicolas, 15, ela fala da escolha de morar fora do seu país. “O trabalho do meu marido é aqui. Ele morou no Brasil por 14 anos, por conta do meu trabalho, até que disse que era minha vez. E é justo, não dá para privilegiar um só, não é? Na verdade, é uma dupla residência, porque mantemos nossa casa no Brasil e vou muito. Quando estou no meu país, aproveito o melhor daí, e quando estou aqui, o melhor de Paris”, comenta.
Maria Fernanda Cândido no primeiro capítulo de 'Renascer' (Foto: divulgação/Globo)

Maria Fernanda Cândido no primeiro capítulo de ‘Renascer’ (Foto: divulgação/Globo)

Maria Fernanda avalia o que acredita ser o melhor de estar em Paris. “É uma cidade central, importante no cenário europeu, muito convergente, todo mundo passa por aqui. Em termos culturais, apresenta uma quantidade grande de eventos. Muitas exposições, peças de teatro, óperas, espetáculos de dança, fotografia, pintura…tento aproveitar o máximo que posso. Também vejo muito meus amigos aqui, talvez até mais que no Brasil, porque as pessoas vêm muito pra cá. Gosto também da vida mais caseira, é uma característica minha, que posso vivenciar bem aqui em Paris”.

O melhor da maturidade é ter menos ansiedade e uma fruição do próprio percurso. Você talvez fique menos preocupada em conseguir resultados e mais atenta em percorrer o caminho. É aquela coisa: não é tanto o destino da viagem, mas a viagem em si. Você fica mais consciente disso e menos ansiosa para chegar. Acho que se vive melhor – Maria Fernanda Cândido

A atriz também reflete sobre os planos e desejos daqui para frente: “Quero me dedicar mais a mim. Fazer coisas paralelas ao trabalho, de que goste. Também é um momento em que sinto vontade se me envolver em causas em que possa ajudar mais as pessoas. Com meus filhos crescidos, a profissão estabilizada, quero criar um espaço maior para isso, encontrar as parcerias certas. Tem tanta gente fazendo coisas maravilhosas, quem sabe eu também consiga? Já venho fazendo coisas pontuais, ligadas à cultura e à educação”.

A atriz em Paris, na França, onde vive há sete anos com a família (Foto: Reprodução/Instagram)

A atriz em Paris, na França, onde vive há sete anos com a família (Foto: Reprodução/Instagram)

Ao pensar na proximidade dos 50, Maria Fernanda continua: “Já estou curtindo meus 50 anos desde os 48 (risos). Quando você chega tão perto de uma idade simbólica assim, já se sente nela. Estou na segunda metade da minha história, dessa passagem por aqui. Meio século vivido é muito bacana e é um momento que te faz olhar para trás, como se fosse um filme, vendo tudo o que fez, as pessoas e lugares que conheceu. Você já tem um recuo para olhar para trás e ver uma linha do tempo, que não é pequena, são décadas. É muito bom mesmo”.

E quando olha para trás, qual é o resumo desse filme? “É um filme de quem viveu com muita paixão. Pelo meu ofício, amo cinema, sou apaixonada pelo teatro, sempre me dediquei com muito respeito, amor a tudo isso. Sou muito ligada à cultura e à educação, que considero alicerces fundamentais para um povo”. E faz questão de destacar:

E claro, também sou muito apaixonada pelos meus filhos. Sempre trabalhei, viajei muito, e sei que estive ausente em vários momentos de suas vidas. Mas tenho um pacto bom com eles, que sabem que gosto muito do que faço. Meu trabalho não é um emprego, é como se fosse eu mesma. Sou eu. É um ofício, uma profissão, que acaba me definindo. Sou muito feliz por isso ser compreendido pela minha família – Maria Fernanda Cândido

Maternidade

Discreta sobre a vida pessoal, a atriz observa a maternidade nesta fase da vida. “É diferente. Tomás, o de 18, já passou daquela fase da adolescência, e o de 15, Nicolas, apesar de estar nela, parece viver um momento posterior. A adolescência é uma fase importante, em que vão se constituindo, mas agora já estão carinhosos de novo, fofos (risos). Temos uma relação maravilhosa, não posso reclamar. Meus filhos são meninos ótimos, do bem, de coração bom, queridos”, compartilha.

Maria Fernanda Cândido em clique raro e antigo com o marido e os filhos (Foto: Reprodução/Instagram)

Maria Fernanda Cândido em clique raro e antigo com o marido e os filhos (Foto: Reprodução/Instagram)

A maternidade me ensina muito, principalmente que você não controla as coisas. E quando começa esse trajeto, tem a sensação que pode tudo, vai resolver tudo. E não é sobre isso, é sobre criar um espaço para o outro existir, um espaço de escuta. Dar espaço para essa existência que provavelmente não vai ser um espelho do que você esperava, queria… é uma existência própria, com individualidade, identidade. Meus filhos estão ficando maiores, cada um com sua história, vida. É uma graça acompanhar isso – Maria Fernanda Cândido

Paixão pelo processo

A Paixão Segundo G.H.’ é um filme inspirado na obra de mesmo nome de Clarice Lispector, que foi publicada em 1964. Nele, Maria Fernanda vive G.H., uma escultora da elite de Copacabana que embarca em uma jornada intensa e libertadora. A história coloca o feminino em sua potência máxima, como bem traduziu o diretor Luiz Fernando Carvalho.

Fazer esse filme foi uma espécie de via crúcis. Foi fascinante e terrível ao mesmo tempo – Maria Fernanda Cândido

E recorda: “Fizemos muito fiel ao livro, que é um atirar-se no precipício. Sem saber se vai ter uma rede ou não. E o livro é essa via crúcis, uma ‘paixão’ no sentido bíblico. Essa trajetória que só a personagem tem que percorrer, sobre esse estar vivo, estar aqui. É um livro muito transgressor, ele questiona o sistema moral, a religião, os dogmas”.

Maria Fernanda Cândido em ' A Paixão Segundo G.H.' (Foto: Divulgação)

Maria Fernanda Cândido em ‘ A Paixão Segundo G.H.’ (Foto: Divulgação)

Maria Fernanda compartilha sobre o intenso processo, que incluiu uma preparação diária com vários profissionais de corpo, voz e palestras com especialistas. “Não tínhamos roteiro, tínhamos o livro. Eu dormia colada à locação, não falava com ninguém, nem ao telefone, fiquei um mês mergulhada no que estava fazendo. Não sabíamos exatamente o que faríamos, então era realmente um salto no escuro, esse movimento diário de caminhar em direção ao desconhecido. É um exercício que não é confortável, mas é fascinante. A discussão deste filme não é apenas sobre uma mulher, mas sobre o modo de existir. Acho que para fazer um filme desses, você precisa da sua própria vida. É um trabalho que propõe para a atriz uma despersonalização. É o anti filme, a anti interpretação. Normalmente construímos máscaras, uma pessoa, uma persona, e, neste filme, é o oposto. Essa personagem vai se desconstruindo, se libertando de todas as máscaras, até chegar neste neutro vivo”

Tem uma frase muito impactante no livro que me acompanha desde a minha primeira leitura dele, quando eu tinha 28 anos e ganhei a obra do Luiz Fernando, que diz: “A trajetória não é apenas um modo de ir. A trajetória somos nós mesmos. Em matéria de viver, nunca se pode chegar antes”. É bonito – Maria Fernanda Cândido

"A discussão deste filme não é apenas sobre uma mulher, mas sobre o modo de existir" (Foto: Divulgação)

“A discussão deste filme não é apenas sobre uma mulher, mas sobre o modo de existir” (Foto: Divulgação)

O filme

Na sinopse lemos: Rio de Janeiro, 1964. Após o fim de uma paixão, G.H. decide arrumar seu apartamento, começando pelo quarto de serviço. No dia anterior, a empregada pediu demissão. No quarto, G.H. se depara com uma enorme barata que revela seu próprio horror diante do mundo, reflexo de uma sociedade repleta de preconceitos contra os seres que elege como subalternos. Diante do inseto, G.H. vive sua via crúcis existencial. A experiência narra a perda de sua identidade e a faz questionar todas as convenções sociais que aprisionam o feminino até os dias de hoje.

"A discussão deste filme não é apenas sobre uma mulher, mas sobre o modo de existir" (Foto: Divulgação)

“A discussão deste filme não é apenas sobre uma mulher, mas sobre o modo de existir” (Foto: Divulgação)