Diego Montez: participação em ‘Vai na Fé’, ‘Mamma Mia’, ator fala sobre homossexualidade e relembra o pai, Wagner Montes


Filho do polêmico e autêntico apresentador de TV e ex-deputado Wagner Montes (1954-2019) com a atriz Sônia Lima, o ator é um dos principais nomes de “Mamma Mia’ que estreia no Rio de Janeiro, com música do Abba. Fala sobre a representatividade LGBTQIAPN+. “Quanto a mim, eu nunca estive no armário, nunca precisei me assumir. Eu tenho namorado, sou gay, mas isso nunca foi uma questão para conseguir emprego” e entrega sua paixão pelas novelas mexicanas e o desejo em encenar “A Usurpadora” como musical

*por Vítor Antunes

Diego Montez, que acaba de fazer uma participação especial na novela”Vai na Fé“, revivendo William, seu personagem em “Bom Sucesso” (2019), estreia “Mamma Mia“, musical inspirado no famoso filme homônimo e considera este o seu melhor momento profissional. Ator fala sobre a felicidade em reencontrar pessoas que participaram ativamente da sua carreira, além de destacar sua participação junto à também atriz Gabi Camisotti no programa social Cena1, que insere jovens desassistidos economicamente em cursos de formação no teatro musical. Em entrevista exclusiva, ele relembra a história de seu pai, o ex-deputado e apresentador de TV Wagner Montes (1954-2019) a o interpretá-lo tanto na série “O Rei da TV” como na montagem teatral “Sílvio Santos vem Aí“. Segundo ele, Wagner, ligado nos 220 volts, era o mesmo em casa tal como era na televisão. Artista celebra a versatilidade dos papéis que lhes são oferecidos e que não perpassam por sua orientação sexual. Ele acredita que representa um avanço junto aos atores LGBTQIAPN+.

Até bem pouco tempo, os atores escondiam o fato de serem gays, temerosos de que essa condição pudesse segmentar seus personagens. Diego aborda sobre o apoio do público no que tange a um casal homoafetivo, pois que o seu personagem e o de Rafael Infante em “Bom Sucesso” repercutiu tão positivamente que houve a mudança da trajetória do perfil deles: “Eu nunca senti que minha sexualidade tenha ofuscado o meu trabalho e isso nunca me trouxe entraves, tanto para mim como para meus personagens. Eu jamais estive no armário bem como não senti a necessidade de ter que me assumir gay. As pessoas comentaram da minha orientação sexual por causa do meu personagem na novela, e, coincidentemente, ator e personagem são gays”.

Nunca me neguei a falar sobre minha sexualidade e isso não me prejudicou em nada. Entrei na Globo fazendo um personagem gay e o William tem muita coisa de mim, do meu humor ácido, assim como da ótica cômica dos gays do Twitter – Diego Montez

Reforça ainda: “Eu fico muito orgulhoso por ter feito parte desse momento, porque nunca foi discutida a sexualidade do William na novela e eu acho que existia apenas uma resistência do personagem Pablo em assumir sua homossexualidade. Quanto a mim, eu nunca estive no armário, nunca precisei me assumir. Eu tenho namorado, sou gay, mas isso nunca foi uma questão”.

Diego Montez estreia em “Mamma Mia” e fez uma participação em “Vai na Fé” (Foto: Julia Assis)

O NOME DO JOGO

Mamma Mia” é um dos maiores sucessos tanto da Broadway como de Hollywood. Estrelado por Maryl Streep e Pierce Brosnan, o filme é um clássico da categoria. Bem-sucedida na primeira montagem em 2010, a peça volta ao cartaz com novo elenco, trazendo Diego Montez no papel de Sky. E, pela primeira vez o espetáculo estará sendo encenado no Rio de Janeiro. Coincidentemente ou não, Diego Montez assinala que este elenco tem “a cara do Rio. Especialmente por conta de serem eles de muito fácil identificação ao público carioca: Maria Clara Gueiros, Claudia Netto, Renato Rabello… O diretor, Charles Möeller escolheu um elenco  de modo que parece que estamos na sala de casa assistindo”.

Segundo o ator, esta é uma montagem que pretende atingir, especialmente, o público que não tem por hábito assistir musicais. Tanto por conta de lançar mão dos imorredouros sucessos do grupo Abba, como por sua atmosfera familiar e acolhedora. “Eu sempre penso: Será que a minha mãe (a atriz Sônia Lima) vai se identificar com a peça, ou a minha avó, que não tem vínculo com a arte, irá se identificar? Há muita gente que acha que a premissa da encenação é ingênua e sai de lá emocionada, tocada. É o poder de um texto que é muito inteligente, uma peça de fácil identificação junto ao público”, comenta. Ainda de acordo com ele, que é fã de “Mamma Mia“, e cuja estreia nos palcos se dá no dia 2 de fevereiro, este título acabou por influenciá-lo a escrever e produzir “Brilha La Luna“, musical este que conta com referências diretas ao espetáculo americano, além de trazer como trilha sonora as músicas da banda Rouge, e que foi encenado no ano passado.

Diego Montez compõe o elenco de sua peça favorita: “Férias remuneradas” (Foto: Julia Assis)

Diego Montez faz no teatro o papel que Dominic Cooper interpretou no cinema (Foto: Julia Assis)

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CONHECENDO A MIM, CONHECENDO A VOCÊ

Brilha La Luna” teve uma montagem recente. Em 2022, a peça roteirizada e produzida por Montez voltou aos palcos em quarta temporada. Perguntado sobre a possibilidade de uma nova remontagem em razão de uma das componentes do Rouge, Aline Wirley, estar no BBB, ele diz que “neste momento não temos planos imediatos de trazer a peça à cena, até por que não esperávamos pela entrada dela no reality. Mas desde a última reunião da banda pensamos em remontar o espetáculo. Ainda que seja de médio porte, ele tem uma fanbase importante.  Além disso, é interessante observar que alguns adolescentes creem que as músicas da peça foram escritas por mim, já que desconhecem o grupo Rouge”. A banda citada pelo ator fez sucesso entre os anos de 2002 e 2005. Quanto à sua torcida, Montez relata que a presença da musicista no programa “é algo surreal. Ela é uma pessoa que irradia luz e que é muito positiva. Tenho minha torcida por ela, assim como pelo Gabrielzinho”, conta, referenciando-se ao ex-intérprete do personagem Mosca na novela “Chiquititas“.

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Outro momento artístico de Diego Montez neste ano aconteceu na televisão. O ator fez uma participação especial em “Vai na Fé“, revivendo William, seu personagem em “Bom Sucesso” (2019). Na nova trama das 19h, ele fazia dupla com Alexia Máximo, papel de Deborah Secco em outra novela, “Salve-se Quem Puder” (2020). Ambos contracenaram com os personagens de Samuel de Assis (Ben) e Carolina Dieckmann (Lumiar). Perguntamos ao ator como foi reviver o personagem neste crossover tão transgressor, pois Alexia, a contrário de William, era de uma novela de outro autor, Daniel Ortiz, ao passo que “Vai na Fé” e “Bom Sucesso” são da mesma autora, Rosane Svartman.

O jovem explica: “Eu e Deborah nos conhecemos em “Bom Sucesso” mesmo. Alexia participou da reta final da trama na qual eu trabalhava, como forma simbólica de uma novela estar passando o bastão para outra. Coincidentemente, gravamos esta cena juntos. E agora na nova trama das 19h, conseguimos dar uma continuidade coerente a esses personagens. É muito curioso entrar de paraquedas numa história que a gente não conhece. Eu mesmo não sabia quase nada dessa novela, de modo que nesta participação acabei tendo de vivenciar o personagem mesmo, sobre como ele agiria diante daquelas pessoas – Lumiar e Ben – que ele também não teve contato. Precisei estudar um pouco o William revisitando cenas antigas, observando aquela composição e depois segui adiante, ainda que tivesse me apoiado na Alexia, que já era uma personagem que eu conhecia pouco, para enfrentar essas outras pessoas e brincar dentro do universo da autora, que nos oferece o realismo colorido com uma tinta fantasiosa. Além disso, pude contar com a generosidade da Deborah Secco”.

Deborah Secco e Diego Montez entre Samuel de Assis e Carolina Dieckmann em “Vai na Fé” (Foto: Manoella Mello)

A cena de “Vai na Fé” a qual o ator se refere, protagonizada por ele e Deborah,  trouxe à discussão a questão da violência doméstica, haja vista que Alexia, após separar-se, inicia um novo relacionamento com um rapaz que a agride. Ela e William procuram apoio jurídico no escritório dos advogados do atual cartaz das 19h como forma de pedir auxílio no que tange à Lei Maria da Penha. Na trama de 2019 o personagem de Montez, bem com o de seu namorado naquela novela, o ator Juan (Rafael Infante), propunha-se a trazer à discussão a dificuldade de um artista gay assumir sua orientação sexual sob risco de ter descredibilizado o seu talento por ser o que é. Algo semelhante aconteceu com atores como Rock Husdon (1925-1985), assim como muitos outros artistas brasileiros preservaram sua sexualidade preocupados em sofrer algum revés. Porém, na trama de “Bom Sucesso” o personagem foi bem aceito e o telespectador torceu para que Juan e William terminassem juntos. “O público adotou-os. Tanto que esse conflito nem desenvolveu-se tanto. Acabou havendo outras questões mais importantes naquele relacionamento e o grande barato foi o fato de ele não ser tratado como um tabu”.

Montez conta que a abordagem afetiva desses personagens foi feita por um dos colaborardes da equipe de roteiristas, Felipe Cabral, que é militante LGBTQIAPN+ e auxiliou na condução do casal #julliam, de modo que o beijo entre eles não teve problematização prévia à sua exibição. Tudo aconteceu depois que ele foi ao ar. “O beijo gay de “Bom Sucesso” não foi documentado não virou noticia antes. Eu e Infante demos um selinho e a notícia acabou sendo a falta de notícia. Ele entrou num quesito de não-discussão e isso foi o grande barato da novela”. A fala do ator pontua que, numa das poucas vezes um beijo gay aconteceu em cena sem que houvesse um estardalhaço anterior à mostra de afeto entre os personagens. Historicamente, houve circunstâncias em que o beijo provocou tanta discussão que acabou por não ser exibido – algo que aconteceu em “América” (2005). Na série “Mãe de Santo“, da Manchete, 1990, o beijo aconteceu entre sombras. Na Globo, só haveria um beijo mais tradicional entre homens em 2013/2014, na novela “Amor à Vida”.

Rafael Infante e Diego Montez em “Bom Sucesso”. Personagem de Infante não lidava com com a sua homossexualidade (Foto: Reprodução/TV Globo)

Para falar do avanço na abordagem da questão LGBTQIAPN+, Diego cita o filme “Mundo Estranho“, da Disney, na qual o protagonista é um adolescente gay que tem um crush e isso é naturalizado por sua família, não é algo problematizado. Segundo ele “É isso que eu quero pra os meus filhos. Não existe esse questionamento, esse estranhamento. Acho que o importante é expandir essa linha de raciocínio para além da manchete que destaca um relacionamento homoafetivo. Cabe a nós, em entrevistas, inclusive, naturalizar essas relações afetivas”.

A contrário do temor dos atores dos anos 1980 que nunca tornaram públicas as suas orientações sexuais, ou tentaram camuflá-la às vezes de maneira até infantil, Diego afirma categoricamente que esta sua condição nunca se refletiu de maneira desfavorável em sua profissão. Pelo contrário “Não percebi em nenhum momento que o fato de eu ser gay me impediu de arrumar trabalho, tanto vivendo personagens LGBT como héteros. Não é algo determinante. E isso é algo que me deixa muito feliz quando acontece”.

Neste ano, além da participação na novela e da estreia em “Mamma Mia“, o ator estará no longa “O Sequestro do Voo 375”, filme de ação que aborda o sequestro do voo 375, da Vasp, em 29/09/1988, cujo objetivo era colidir a aeronave contra o Palácio do Planalto brasileiro, como forma de protestar pelas medidas adotadas pelo presidente de então José Sarney. Outro projeto no qual Montez está envolvido e aguardando lançamento é o filme “Perdida” de Katherine Chediak Putnam e Dean Law baseado no livro de Carina Rissi, sobre uma menina que faz uma viagem no tempo. E mais: estará em “Herança”, dirigido por João Cândido Zacharias, onde atua ao lado de Cristina Pereira e Analu Prestes, neste que é um filme de terror.

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Diego Montez tem um papel de destaque no filme que trata sobre o sequestro do voo Vasp 375 (Foto: Divulgação)

TUDO AO VENCEDOR  

Uma presença notável na fisionomia de Diego Montez é  a sua semelhança com seu pai, o jornalista e ex-deputado Wagner Montes (1954-2019). Ele diz acreditar que seu irmão, Wagner Montes Filho é mais semelhante que o patriarca. Porém, um trabalho desempenhado na série “O Rei da TV” fê-lo perceber essa maior semelhança entre si e a figura paterna. Afinal, Diego deu vida ao próprio pai naquela encenação “Quando vi a mim vestido como meu pai, em roupas que eram cópias exímias às dele, e uma atriz caracterizada de Sônia Lima, minha mãe, foi uma experiência única. Entrar nos estúdios do SBT e gravar tendo tantas memórias foi algo como voltar ao passado, como passar um dia com meu pai”.

E Wagner Montes folclórico, excêntrico da televisão era muito distante daquele que havia dentro de casa? Diego é categórico: “Não. Ele era mesma coisa. Era o apresentador do jornal, só que sem terno. Ele sim era um livro aberto. O Wagner que eu conheci era o mesmo que o telespectador teve acesso. Inclusive, para interpretá-lo jovem, tive de estudar a época em que ele não era esse “personagemzão”, carregado nas tintas. Momento em que ele tinha uma outra postura, outra voz, outro corpo”, declara, mas não sem destacar que o famoso era “um cara muito amoroso e orgulhoso de mim”.

Tenho mais o gênio da minha mãe. Esse lado extrovertido do meu pai nunca foi o meu, mas ele era aquilo mesmo, sem nenhum pano sobre si – Diego Montez

Por ter tido uma vida um pouco mais privilegiada e acessado a algumas possibilidades de estudo que outras pessoas não tiveram, Diego, junto à atriz Gabi Camisotti optaram por desenvolver um projeto social, o Cena1, que “visa democratizar o estudo de teatro musical. Viajamos pelo Brasil buscando 16 jovens, de várias cidades do País, para ganhar aulas de teatro em meio período diário, das 9h às 14h. Muito da criação desse projeto surge por causa do meu pai que amparava muita gente através de obras sociais, e isso eu só descobri em seu velório. Gabi, minha sócia, também é de uma família privilegiada, pois é filha da atriz Ciça Simões, então decidimo-nos em fazer essa roda girar e compartir as oportunidades das quais tivemos acesso. Essa ação social nos dá muito orgulho. Vários alunos já foram inseridos no mercado, em montagens como Wicked e Grease e em projetos na TV”. O ator diz que as inscrições estão abertas, encerram no meado de fevereiro, e que basta aos interessados procurarem o Instagram oficial do projeto, o @cena1, e ficarem atentos as seletivas das cidades.

Diego Montez vivendo seu pai no teatro (Foto: Divulgação)

Wagner Montes em sua faceta pouco falada, a de cantor (Foto: Reprodução/SBT)

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“EU TENHO UM SONHO”: TELEVISA, ME LIGA!

Todos os títulos que abrem esta matéria são nomes traduzidos de músicas do Abba e que compõem a trilha sonora de “Mamma Mia“. Por mais que este seja o atual trabalho de Montez e ele seja fã tanto do longa como do musical que retrata uma família grega, a sua, a contrário, tem raízes muito mais próximas às nossas e sangue latino. Sua ascendência é mexicana e é daquele país que o rapaz tira suas referências mais importantes. Diz ele adorar as novelas latinas. Diferente das pessoas da sua geração, não é ligado nos filmes da Disney, mas nas tramas protagonizadas por Thalia. “Eu cresci vendo “Marimar” e “Maria do Bairro“, e esta última, inclusive é a minha novela favorita”.

Eu sou obcecado por TV mexicana. Há ali uma suspensão de realidade que deixa tudo mais divertido e com cara de TV – Diego Montez

Diego confidencia-nos de que um sonho seu é produzir o musical da novela mexicana “A usurpadora”, sucesso protagonizado por Gabriela Spanic. E com o mesmo bom humor de William, seu personagem em “Bom Sucesso”, encerrou, bem humorado, dizendo “Televisa, me liga”.

“¡Me haces dano, corazón!” Diego Montez sonha em montar “A Usurpadora” no teatro (Foto: Júlia Assis)