* Por Carlos Lima Costa
Como diz a velha máxima, o espetáculo não pode parar. Uma semana após sentir-se mal, adiar a estreia do Cine Circo Teatro Itinerante Dedé Santana, no Porto Maravilha, Rio, constatando, após exames clínicos, estar com pedra no rim, o eterno trapalhão, mesmo sabendo que precisa se submeter a uma cirurgia, optou por adiá-la para não interromper o projeto que é a realização de um antigo sonho. “Ainda estou com dor e vou ter que operar. Não vou poder fugir disso. Mas o médico disse que dá para esperar um mês. Então, vou aguardar o encerramento dessa temporada para não atrapalhar, pois sonhei muito tempo com isso aqui, sabe, queria juntar as três maneiras de arte em uma só, o circo, o teatro e o cinema e fazer de graça para o público, que era o meu maior desejo. Consegui, então, não vou parar agora”, ressalta Dedé Santana, que há três meses retornou à TV, no humorístico A Praça É Nossa, no SBT.
Com exceção da pedra no rim, o eterno trapalhão garante que a saúde vai muito bem. Mas confessa, com bom humor, que não é adepto de uma rotina de atividades físicas. “O Renato (Aragão) faz hidroginástica, acupuntura, é todo certinho. Eu não faço nada. Fiz tanta ginástica na minha vida no circo desde os sete anos de idade, indo para o picadeiro às seis horas da manhã, saindo meio-dia, saltando, equilibrando, fazendo trapézio, globo da morte, que, hoje, não quero fazer nada, fico com muita preguiça mesmo”, conta, às gargalhadas.
Mesmo assim, mostra vigor físico, não deixando transparecer nem a dor resultante da pedra no rim. Em meio às apresentações do espetáculo de variação circense dirigido por ele com números aéreos e de palhaços, Dedé encena a peça tragicômica Palhaços, de Timochenco Wehbi (1943-1986), sob o comando de Alexandre Borges, dividindo o picadeiro com o ator e produtor Fioravante Almeida, com quem idealizou o atual projeto. E desabafa: “Comecei a encenar essa peça a convite deles. Tenho 62 filmes, dirigi muitos longas, ajudei a escrever vários roteiros e nunca ganhei um prêmio de Cinema, nem uma menção honrosa. Aí fui fazer o teatro e com essa peça ganhei”, diz, se referindo ao Aplauso, onde foi eleito por voto popular, em 2019.
Atualmente, além estar em cena, ele, como espectador, assiste e aplaude a filha Yasmim Sant’Anna que integra a trupe circense, que até o próximo dia 12, vai poder ser vista de forma gratuita, no Porto Maravilha. “Eu não deixei nenhum filho seguir a carreira, essa foi escondida e eu não sabia que ela era tão boa. A Yasmim dança, canta, faz um pouco de acrobacia. Ela vem atuando na peça Violetas na Janela ao lado da Ana Rosa (ex-mulher do humorista), então, pedi para que viesse participar desse projeto comigo e me surpreendeu. Fico olhando ela no palco e me emociono bastante. Não estamos juntos no palco, nessa peça não, mas pretendo encenar algo com ela”, explica Dedé. No local, o público tem oportunidade também de assistir a filmes de longa carreira de Dedé, como Atrapalhando a Suate e Os Saltimbancos Trapalhões, com curadoria do roteirista e diretor Victor Lustosa.
Yasmin carrega o DNA de uma tradicional família circense. Estar sob a lona traz muitas emoções para Dedé, filho do palhaço Picolino (Oscar Santana) e de Ondina Santana, que chegou a ser considerada a maior contorcionista do Brasil. Nascido no circo do pai, com três meses de idade, ele entrou no palco, pela primeira vez, no colo da mãe. Sendo assim, pode-se dizer que tem 85 anos de trajetória artística. Além de trabalhar como o palhaço Picolé, fez números na barra, no trapézio e no globo da morte. Sobrinho de Colé (1919-2000), um dos maiores comediantes do país, Dedé, batizado como Manfried Sant’anna, conta como surgiu o apelido que ele adotou como nome artístico e com o qual se tornou conhecido. “Meu irmão ainda não falava direito e quando me via, dizia ‘Dedé, Dedé’”, lembra ele, cujo irmão, Dino Santana (1940-2010) foi ator e assistente de direção de Os Trapalhões.
“Eu nunca abandonei o circo. E como sou Embaixador do Circo no Brasil, visito todos eles pelo país. Entre o cinema, o teatro e o circo, é no circo que eu me sinto mais à vontade. Quando estou no picadeiro parece que estou na minha casa. E a peça que estamos encenando aqui é tragicômica, me lembra muito a minha família, o meu pai e a minha mãe, tanto é que fizeram uma surpresa para mim. Dentro de um armário no palco, tem uma foto da minha mãe e da minha irmã. Me emociono toda vez que eu olho”, conta ele, que há 17 anos mora em Santa Catarina com a esposa, Christiane Bublitz, primeira rainha da Oktoberfest, em Santa Cruz do Sul, e os filhos do casal, Marcos, que é tatuador, e Yasmim (ele foi pai oito vezes, sendo que o primogênito, com Ana Rosa, morreu criança).
Na fase da pandemia, apesar das dificuldades, se manteve trabalhando, em sua rede social, como garoto propaganda de algumas marcas. E há três meses, retornou à televisão no programa A Praça É Nossa, no SBT. “O Carlos Alberto (de Nóbrega) me chamou. Faço uma dupla com o Bananinha (Marcelo Beny). Ele é muito engraçado, tem muito valor. No SBT, o nosso quadro é o mais assistido. Se você procurar na rede social, o quadro mais assistido na rede social é o meu e do Bananinha (o Bar do Dedé, no canal do jovem humorista, no YouTube). Ele tem um público infantil muito grande e de internet. E eu trago aquele que me acompanha desde Os Trapalhões. Nossa química deu certo e está funcionando. Todo lugar que vamos é casa lotada”, vibra.
O fato é que, hoje, é mais ativo nas redes sociais. Até integrar o elenco de A Praça É Nossa, vinha afastado da TV da mesma forma como estão Renato Aragão e Jô Soares, outros dois ícones do humor de sua geração, que em determinado momento não tiveram contrato renovado na Globo. “Eu fui um dos primeiros que eles dispensaram e de uma maneira feia. Foi covarde, porque para contratar eles te chamam, conversam, levam para almoçar. Agora, na hora de mandar embora… eu recebi um telegrama no dia 23 de dezembro dizendo para ir lá que eu estava fora. Você imagina o Natal que eu passei. A Globo fez muito pelos Trapalhões, mas nós também fizemos muito pela Globo, nós demos o sangue lá dentro e na época eles foram muito legais. Mas a maneira que fizeram comigo foi muito covarde. O Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, responsável pelo padrão Globo de qualidade) faz falta. Eles podiam ter me segurado, falado: ‘olha, vamos diminuir o salário’. Meu salário nunca foi milionário, que eu nunca fiz muita questão. Eu faço mais questão de ver o que vou fazer do que o que vou ganhar. Se eu gostar do projeto, não olho o salário”, dispara.
O quarteto que tanto cativou o Brasil é homenageado no final da apresentação circense, quando atores entram em cena vestidos como bonecos de Didi, Dedé, Mussum (1941-1994) e Zacarias (1934-1990). “Não esqueci deles, não esqueço nunca. Eu me sinto privilegiado de ter pertencido a esse grupo maravilhoso. Eu já era fã do Mussum, do Zacarias, sou fã do Didi até hoje. Dou muita risada com ele. Hoje, a gente se vê pouco (Dedé mora em Santa Catarina e Renato no Rio de Janeiro), mas quando vou lá sou tratado com as honras da casa. A gente se fala muito. Eu não considero o Renato meu amigo, meu colega, eu o considero meu irmão. Ele é aquele irmão que, às vezes, me puxa a orelha. Às vezes, brigo com ele, ele briga comigo, mas nunca no lado pessoal, sempre foi por conta de trabalho, porque ele era produtor dos filmes e eu era diretor, então, a gente quebrava o pau de vez em quando. Ele achava que tinha que ser de um jeito, eu achava que tinha que ser de outro, somente isso”, explica. E acrescenta que o público ainda deve vê-los atuando juntos. “O Renato tem um seriado e um filme para a gente fazer junto e tem outras coisas que ele não me conta, diz que se fizer isso, eu vou revelar para as pessoas. E eu falo mesmo”, diverte-se ele, que ainda sem data definida tem para estrear o longa-metragem Coronacirco, que aborda o problema da pandemia no circo, onde ele interpreta um palhaço dono do espaço, e vai filmar agora O Poderoso Chefão Ou Quase, que terá também a filha Yasmim no elenco, e onde vai fazer uma imitação do Marlon Brando(1924-2004).
Com tranquilidade, fala de sua situação financeira, apesar dos hiatos na televisão. “Durante a pandemia, as contas pesaram um pouco e me descobri na rede social. Isso me salvou, sabe, tenho feito os comerciais das empresas que me contrataram como garoto propaganda. Agora, acho que todo mundo tem que trabalhar. Não sou rico, mas também não estou como o pessoal fica falando aí, ‘O Dedé tá pobre’. Eu não gosto de falar o que eu tenho, mas assim, dizem que estou pobre, porque coloquei minha casa à venda. Agora, a Luciana Gimenez colocou um apartamento à venda e ninguém falou que ela está pobre. Eu fiz isso, porque a maioria dos filhos não mora comigo. Vou ficar em uma mansão enorme de não sei quantos quartos? Eu quero vender para pegar um espaço menor”, ressalta ele, que também tem uma casa no Rio e durante o atual projeto sentiu vontade de voltar a viver na cidade. “Mas não depende de mim, tenho que falar com a mulher. Elas que mandam na gente (risos). Estamos casados há quase 40 anos, deu certo porque ela não é do meio”, finaliza ele.
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