Parece que o feminismo finalmente chegou aos roteiros de comédia brasileira. Inspirado nas revolucionárias histórias em quadrinho da argentina Maitena, lançados nos anos 90, ‘’Mulheres Alteradas’’ mergulha no universo feminino por meio do cotidiano das quatro protagonistas Keka (Deborah Secco), Mariati (Alessandra Negrini), Sônia (Monica Iozzi) e Fernanda (Maria Casadevall) com muito bom humor. Para Alessandra Negrini, o filme representa uma transformação da sociedade junto à luta das mulheres. ‘’É a construção de um novo lugar nas artes, no mundo. Agora não tem retrocesso, né? Nós estamos andando rápido e o mais importante disso tudo é você poder falar e estar junto. As mulheres hoje estão unidas e isso que conta. Então, vamos discutir as nossas questões. Essa união é o que traz realmente a força’’, conta a atriz que fugiu das gravações de ‘’Orgulho e Paixão’’ para marcar presença na pré-estreia que foi realizada nesta segunda-feira, 25, no Shopping Leblon.
Apaixonada pelo trabalho da argentina Maitena, a atriz Grace Gianoukas, que está no ar como Petúnia em ‘’Deus Salve O Rei’’, foi atraída para as salas de cinema nesta pré-estreia exatamente pela originalidade e relevância do roteiro. ‘’Eu gosto muito da cartunista e de todas as atrizes. Me interessa muito o cartoon adaptado, principalmente com o tema feminino. Existem pouquíssimas mulheres cartunistas no mundo e eu estou aqui para apoiar’’, conta Grace que não consegue decidir qual personagem é a sua favorita e decide sair pela tangente. ‘’Eu me identifico com a autora. Ela é bárbara. Se eu escolher uma, eu vou estar sendo injusta’’, brinca.
Com estreia marcada para o dia 5 de julho, o longa-metragem aborda questões que afligem mulheres de diferentes idades, como maternidade, crise dos 30, carreira e, claro, o machismo diário, mostrando o impacto que elas têm na vida de cada uma. Na trama, Mariati, uma advogada workaholic, coloca a carreira em primeiro plano e se recusa a ter qualquer tipo de distração, inclusive relacionamentos. No entanto, sua vida vira de cabeça para baixo quando conhece o playboy de meia idade Christian, interpretado por Daniel Boaventura, durante a festa de uma amiga e precisa aprender a conciliar sentimento com a profissão. Apesar de nunca ter vivido a experiência de ter que escolher entre um ou outro, Alessandra compreende o lado da sua personagem. ‘’Nunca vivi algo exatamente assim, mas quando você se apaixona você esquece do mundo. É uma metáfora. No auge da paixão, você fica cor de rosa, você só vê aquela pessoa na sua vida’’, afirma.
Já Keka, que rouba a cena ao lado da chefe Mariati, é uma secretária e mãe de dois filhos que tenta recuperar o que resta do casamento com Dudu, personagem de Sérgio Guizé, a todo custo. Para isso, ela propõe uma viagem romântica, onde o casal irá passar por situações hilárias e um tanto quanto reveladoras. Feminista, Deborah Secco redita que muitas mulheres se colocam nessas situações por influência da sociedade conservadora e patriarcal na qual vivemos. ‘Fomos criados por uma sociedade machista e hipócrita. Eu tenho 38 anos, mas durante 35 anos da minha vida eu fui ensinada que o me cabia era isso, sabe? Nós ficamos, infelizmente, com o inconsciente muito preconceituoso e julgador. Temos que mudar para que a próxima geração venha totalmente limpa desse preconceito”, afirma a atriz que, apesar de já ter insistido muito em relacionamentos fadados ao fim, nunca mais se colocaria na mesma situação que a sua personagem.
E ela nem precisa se preocupar com isso. Acompanhada do marido Hugo Moura, Deborah Secco recebeu diversos elogios apaixonados do companheiro que fez questão No ar como Robinho em ‘’O Segundo Sol’’, Hugo enxerga o filme como a personificação do lado mais alterado da atriz: o de renovação artística e pessoal. ‘’O lado mais alterado da Deborah que me atrai é esse de não ter apego ao que já deu certo. Quando ela recebe novos trabalhos, ela fala que não sabe fazer e joga fora tudo o que remete a algo que ela já tenha feito. Ela fica alterada de um jeito bom nesse gap de tempo de criação até chegar em um lugar que ela queira. Ela já fez grandes sucessos e mesmo assim ela não quer mexer nisso, ela quer continuar criando mais. Isso é muito impressionante’’, declara.
As outras confusões hilárias ficam por conta das irmãs Sônia e Fernanda, interpretadas por Monica Iozzi e Maria Casadevall, respectivamente. Enquanto Sônia é casada e mãe de dois filhos que não sai de casa para se divertir há mais de um ano, Fernanda é a jovem que chega aos 30 anos sem ter conquistado nada e que, finalmente, quer desistir da vida de balada, dando início a famosa crise dos 30. Cansadas do cotidiano, as duas decidem trocar de vida por um dia a fim de descobrirem como lidar com as suas aflições.
Com direção de Luis Pinheiro, que tem no currículo outras produções centradas no universo feminino, como as séries ‘’Lili, a ex’’ e ‘’Samantha’’, ‘’Mulheres Alteradas’’ traz as características das histórias em quadrinho por meio das ilustrações que interceptam diversas cenas e pela impressionante fotografia que se destaca na narrativa, tornando-se um personagem à parte. ‘’Nós tentamos fazer com que as cores representem os momentos vividos pelas atrizes. Nós não levamos isso tão a cabo, mas você pode perceber quando a Mariati se apaixona. As cores ficam mais avermelhadas, por exemplo’’, diz. Além disso, para trazer um tom mais irreverente para a adaptação dos cartoons de Maitena, o diretor decidiu filmar em plano sequência com a câmera na mão, oferecendo à narrativa um ritmo mais frenético.
Toda essa originalidade do roteiro e, principalmente, da produção cinematográfica foi exatamente o que atraiu Deborah Secco ao projeto. Apesar de já ter participado de filmes que abordam a comédia de alguma forma, como ”Entrando numa Roubada’’ (2015) e ‘’Meu Tio matou um Cara’’ (2004), a atriz, que não se sentia segura nesse gênero por não ser comediante, sempre desejou explorar esse seu lado, mas não encontrava um roteiro que lhe atraísse. Até chegar o convite para participar do ‘’Mulheres Alteradas’’, o qual Secco aceitou de primeira por ter se apaixonado pela forma que Luis Pinheiro propôs trabalhar com os quadrinhos no cinema. ‘’O que me atraiu foi a forma de filmar que essa comédia tem. É uma comédia de total qualidade, 100% bem filmada. É cinema na veia, sabe? Ela é feita para a telona, por pessoas da área e isso é o que mais me fascina: fazer cinema de verdade’’, afirma.
Apesar de todas as técnicas cinematográficas utilizadas, no fim, o que realmente chama a atenção do filme é a sua base: o empoderamento feminino. Com o auxílio do humor, a atriz Alessandra Negrini espera que mulheres de todos os tipos e idades consigam se fortalecer individual e coletivamente. ‘’Espero que esse filme só propicie que as mulheres se identifiquem, riam de si mesmas, que elas percebam que todo mundo vive as mesmas coisas e que nós não estamos isoladas. Quero que esse filme tire as mulheres do isolamento e essa é a principal função da arte’’, declara. Assim como Negrini, Hugo Moura, que é pai da Maria Flor, de dois anos, também espera que o filme cause transformações e que faça todo mundo entender o que as ‘’Mulheres Alteradas’’ estão há anos tentando dizer: ‘’o mundo tem que ser feminista!’’
Artigos relacionados