*por Vítor Antunes
Não é de hoje que as mulheres que surgem na televisão têm seu talento colocado à prova. Quando Hebe Camargo (1929-2012) surgiu como apresentadora, deixando para trás uma bem sucedida como cantora, muito se questionou dela, inclusive sobre sua inteligência – ou a falta dela. Até que hoje, Hebe está no lugar que merece, inatingível, como Rainha da TV Brasileira. O começo da carreira de Daniela Albuquerque não foi diferente. A todo tempo teve seu talento questionado e posto à prova. Além de tudo, ela tinha um plus: é a mulher do dono da emissora. Demorou para que tivesse seu lugar consolidado e compreendido como apresentadora e comunicadora. Há quase 10 anos, ela está à frente do “Sensacional”, um programa de entrevistas na Rede TV!. “Muita gente desfazia de mim, não sabiam de minha origem, e também por eu ser mulher do Amílcare [Dallevo]. Mas me agarrei e me dediquei a melhorar como profissional. Isso não é todo mundo que faz. Ninguém começa no auge, todo começo é difícil, ninguém está 100% pronto no começo. Eu fui me aperfeiçoando como apresentadora, eu não tive pressa para que entendessem e nem para amadurecer profissionalmente. Entendo que, por estar entrando na casa das pessoas, eu não podia chegar querendo que elas me amassem ou me achassem o máximo só por estar na TV. Via o que precisava melhorar e a me concentrar nas coisas. Às vezes as críticas vão mais para o lado pessoal que para o profissional, ou são para machucar e ferir, justamente diante do incômodo de me verem à frente de um programa”.
Daniela Albuquerque olha para o passado com muita coragem. Fala com orgulho de ter trabalhado desde muito jovem em sua terra natal, o Mato Grosso do Sul, como “muambeira” e relembra de sua história o fato de ter sido registrada seis anos depois de nascida. Seu pai, que tinha outra família, relutou ao máximo para reconhecê-la e a seu irmão como filhos. Quando o fez, morreu logo na sequência. “Eu entrei na escola na primeira série e tarde por ter demorado para ser registrada, algo que só aconteceu quando eu já estava com cerca de seis anos. Meu pai tinha outra família e três filhos. Ele trabalhava em um cassino e dizia que não estava mais casado, mas morava com a esposa por causa dos filhos com ela. Eu nasci em 1982 e só fui registrada em 1988, e entrei na escola na 1ª série direto. A minha dificuldade no colégio me travou um pouco [na vida]. Quando comecei a estudar, não sabia nem segurar um lápis”.
Sobre o passado como camelô, ela se diverte em lembrar: “Tínhamos uma banquinha que vendia coisas do Paraguai na época em que morávamos em Nova Andradina (MS). Aos 14 anos, eu já vendia muamba. Inicialmente, minha irmã era quem fazia as compras, mas eu queria ir ao Paraguai para fazer a minha primeira viagem internacional. Num primeiro momento, a gente comprava coisas triviais como fraldas, cigarros, uísque, assim como outras coisas mais sofisticadas para a época, como agenda eletrônica e Tamagotchi (um brinquedo famoso nos anos 1990), que vendiam muito. Ali viram que eu tinha tino para comerciante”.
Ela também comenta sobre a mística que envolve seu nome, após uma entrevista para a Veja, na qual se dizia que ela teria virado jornalista por conta de uma caixa de achocolatado. “Eu dou risada com essa história e me divirto. Eu era foca (jornalista iniciante), já tinha escolhido a minha profissão. Dei a entrevista para a Veja falando isso. Ressaltei que eu era muito espiritualizada, de receber sinais, desde sempre, e contei que no dia do vestibular, eu fui tomar café da manhã e pedi para Deus um sinal. Estava tomando Toddynho, apreensiva, e coloquei a bebida na mesa. Atrás da caixinha estava escrito “jornalismo” e vi nisso um sinal, que me motivou e estimulou. Colocaram na revista como se eu tivesse escolhido a profissão por causa de uma caixa de Toddynho, quando não foi assim. E mesmo se fosse, não acho um demérito”.
A jornalista [da Veja] quis que saísse dessa forma para gerar clique. E olha como a vida é engraçada: Depois de terem me feito de chacota, eu pautei a Veja outras vezes – Daniela Albuquerque
SORRISO NA LENTE E LÁGRIMAS SECAS À LUZ DO REFLETOR
Não foram poucas as vezes que a crítica foi impiedosa à Daniela Albuquerque, especialmente no início de sua carreira. “Houve muita crueldade na minha estreia como apresentadora. Acho que todo processo é assim. E para falar a verdade, nas profissões, sempre tem gente que fica feliz [com o nosso sucesso] e outras não. Por vezes eu ficava chateada, mas sabia que tinha força, e essa força me fez não me apegar a isso. Via que precisava melhorar. Eu percebia ter muito sotaque, por exemplo, e a Hebe brincava comigo com relação a isso, já que ela era de Taubaté e também tinha sotaque. No começo da minha carreira, ela foi fundamental. Eu sentia que as pessoas me ofendiam, desfaziam de mim, mas depois eu via tanto afeto vindo dela que isso me ressignificou a vida. Hoje, quando eu revejo minha participação no programa “Dr. Hollywood”, noto o quanto me transformei e melhorei. Eu parecia ser uma apresentadora virtual, de tão engessada. Havia quem achasse que eu era uma boneca. Além da formação em jornalismo, o teatro me ajudou muito [a ganhar desenvoltura]”.
Eu tinha medo de ser julgada, apontada, mas queria mostrar para as pessoas que eu estava me dedicando. Fui me concentrando em mim, e as coisas foram ficando mais orgânicas e tranquilas quando eu comecei a me entregar melhor a elas – Daniela Albuquerque
A rainha da TV, inclusive, foi a primeira a saber de algo muito pessoal da vida da apresentadora do “Sensacional“: “A gente foi para Minas num show do Andrea Bocelli, e eu estava grávida da minha primeira filha. Eu disse que precisava contar um segredo para ela, que percebeu no ato que eu estava grávida e foi muito carinhosa. Vimos o show do Bocelli e semanas antes do parto preparei uma playlist com várias músicas, e no momento em que Alice, minha filha, nasceu, tocou uma música do cantor italiano”.
UM BRILHO
A menina do interior que se tornou uma apresentadora famosa. Essa transformação já era esperada? “De modo algum”, diz Daniela. “É tudo tão longe do que eu vivia, que nunca imaginei isso. Sempre tive sonho de ser modelo, de ter minha família, isso, sim, era meu sonho. As coisas foram acontecendo. Daí acaba se justificando a história de que Deus não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos. Ele me escolheu para eu ser uma comunicadora”.
Eu sou super tímida, tinha vergonha de falar, de gaguejar e era insegura. Era uma pessoa improvável para ser uma comunicadora – Daniela Albuquerque
Por ser vaidosa e cuidar da sua imagem, Dani é tida como uma diva e intocável. Algo que está muito distante da sua realidade. “Não me sinto assim. Quando a gente coloca uma roupa, uma joia, e estamos arrumados, as pessoas criam essa imagem. Gosto de me vestir bem, mas sou super acessível. Eu vou ao mercado, saio à rua sempre com muita tranquilidade, chego na TV de tênis e roupa de moletom, não tenho essa coisa de estar impecável”.
Graças a Deus, me comunico com todo mundo. Eu gosto de gente, de conversar, e eu tenho plateia, eu converso com a plateia, eles me acarinham, me trazem presentes, e quando veem coisas brilhosas lembram de mim. Isso é um carinho. Meu público me conhece e sabe dos meus gostos, e isso passa muito pelo cuidado, pois elas gostam de me ver assim – Daniela Albuquerque
Quase 20 anos de casada e quase 10 anos de “Sensacional”, também não a impedem de ser o que é nem a impressionam quanto ao tempo: “Não tenho problema com idade e nem com o tempo, não me preocupo com isso. Não tenho essa questão de estar envelhecendo. Me sinto realizada, tenho uma filha de 12 anos e uma de 9, e adoro. Temos 25 anos de diferença, eu e Amílcare, e 17 anos de casados. Ainda me sinto uma menina sonhadora, divertida, e acho que a cabeça da gente é jovem. O corpo pode até mudar, e não temos como fugir disso. Aproveitar a vida e ficar atrelado a não envelhecer é uma bobagem. Acho que quando se pensa positivo, as coisas boas vêm. Preocupação envelhece”.
Por ora, Dani pensa em formas de tornar o “Sensacional” sempre moderno e conectado com o que há de melhor. “Estamos trabalhando bem as pautas e bons artistas, boas pautas em histórias nunca contadas. Nossa meta agora é celebrar os 25 anos da Rede TV!. Estamos com o intuito de fazer algo especial para essa comemoração, mas sempre trabalhando com novidade, em temas relevantes que o público quer saber e que são assuntos do momento. Sempre olhando para o factual, o programa pensa sempre em educar, ensinar, debater”.
Diante de sua sensibilidade, a apresentadora finaliza dizendo o que mexe com o seu coração: “Me emociona as coisas que minhas filhas fazem para mim, já que temos muito afeto em casa. O que me deixa triste no dia a dia são as covardias relacionadas às crianças, como agressão, violência e abusos, isso me toca muito. No meu cotidiano, eu penso em ser feliz e tenho como frase que me resume a seguinte: ‘O dia em que se é feliz, não se é triste”‘. Ou seja, o quanto as escolhas fazem diferença no rumo do dia.
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