Daniel Satti sobre ‘Carrossel’ na Netflix: ‘A novela aborda valores fundamentais deixados de lado na sociedade atual’


Para o ator, que esteve no elenco deste sucesso do SBT entre os anos de 2012 e 2013, diz que a trama retornou com mais força na Netflix, atingindo uma nova geração de crianças por conta da tecnologia. “No streaming está disponível em todos os possíveis veículos de acesso, ou seja, na Smart TV, no celular, no tablet. Isso é genial. Percebi que a maior parte das crianças continuam trazendo os pais para assistir juntos e se envolvem justamente porque essa dramaturgia tem valores importantes tanto para as crianças quanto para os adultos”, reforça ele, cujo trabalho mais recente na TV foi na novela Salve-se Quem Puder e está com três filmes para 2022

Com a estreia de Carrossel, na Netflix, Daniel percebe o aumento de seguidores nas redes sociais (Foto: Bruno Matteo)

Com a estreia de ‘Carrossel’, na Netflix, Daniel Satti vê uma nova geração de crianças conferindo a novela que foi sucesso na TV aberta há anos (Foto: Bruno Matteo)

* Por Carlos Lima Costa

Desde que todos os capítulos foram disponibilizados na Netflix, em julho, a novela Carrossel, sucesso absoluto do SBT entre os anos de 2012 e 2013, vem conquistando uma nova geração de crianças. Muitas nem haviam nascido durante sua exibição original. Esse revival do frisson causado nas crianças é atestado pelos atores que trabalharam na produção, como Daniel Satti, intérprete de Frederico Carrilho, que até hoje ainda é conhecido com ‘o pai da Carmen’ (Stefany Vaz), uma das principais personagens infantis da história.

Carmen Carrilho (Stefany Vaz) entre os pais, Frederico (Daniel Satti) e Inês (Rennata Airoldi)

“Nunca tinha feito um produto audiovisual para público infanto-juvenil. Na época foi uma explosão. Hoje, não imaginava, mas realmente está sendo muito maior. Vejo esses resultados quando abro meu Instagram e do nada vejo que tem um movimento diferente com inúmeros novos seguidores, incluindo aí várias crianças. Estamos alcançando as crianças da mesma faixa etária, porém de outra geração. É uma novela que aborda valores fundamentais e básicos para toda e qualquer educação e cultura de uma civilização e que, ao meu ver, estão deixados de lado na sociedade atual, como a importância da família, do respeito ao próximo, da amizade e do preconceito”, analisa.

O ator acreditava que essa dramaturgia conquistaria apenas o público jovem. “Percebi que a maior parte das crianças puxavam e continuam trazendo os pais para assistir juntos e estes se envolvem justamente porque essa dramaturgia tem valores importantes tanto para as crianças quanto para os adultos. Então, o sucesso de fato agora é maior em função da Netflix estar disponível com todos os possíveis veículos de acesso, ou seja, na Smart TV, no celular, no tablet. Isso é genial. Todos nós sabemos a força da TV Globo, então, o Viriato de Novo Mundo, e o Donato de Salve-se Quem Puder, são personagens que me deram muita visibilidade, mas o Frederico de Carrossel é realmente o mais marcante. Nessa nova explosão, me reconhecem e falam: ‘você é o pai da Carmen’”, atesta ele, cujo nome artístico na época era Daniel Satixe. A partir de 2014, por orientação de uma astróloga, passou a assinar o sobrenome Satti.

O ator relembra um fato curioso ocorrido em 2012, quando entendeu a dimensão do sucesso. “Era a faixa de horário estreante do SBT desse tipo de produto para esse público totalmente segmentado. Começamos a gravar em novembro de 2011. Quando estreou em 2012, foi assustadoramente um sucesso a ponto de uma vez nos corredores do SBT, eu, o Fábio Di Martino, que fazia o pai da Maria Joaquina (Larissa Manoela) e o Marcelo Batista, pai do Cirilo (Jean Paulo Campos), fomos parados pelo Carlos Alberto de Nóbrega, que virou pra gente e falou: ‘Quero agradecer, porque vocês salvaram o SBT. A novela de vocês trouxe números absurdos que foram importantes para cobrir uma série de demandas que a emissora tinha’. Esse feedback me deu toda a panorâmica dessa história”, relembra.

“Percebo na sociedade que uns olham meio tortos para os outros. Que pena que essas pessoas tem uma consciência tão pequena e não entenderam ainda que somos todos iguais", frisa Daniel (Foto: Bruno Matteo)

“Percebo na sociedade que uns olham meio tortos para os outros. Que pena que essas pessoas têm uma consciência tão pequena e não entenderam ainda que somos todos iguais”, frisa Daniel (Foto: Bruno Matteo)

Daniel reforça os valores abordados na novela, ressaltando a curva de seu personagem na história. “No começo, ele era inseguro, um cara pobre que tenta buscar emprego como todo brasileiro, se sente impotente, incapaz de cuidar da família e por esse motivo desce a ribanceira. Na época, entendi que era a história do brasileiro. Existe uma entrevista da Irís Abravanel, onde ela disse que a história que mais se identificava com a família brasileira e que mais a emocionava a escrever era a da família da Carmen. Na história, com ajuda da professora Helena (Rosane Mulholland), ele consegue um emprego e acaba voltando para casa. Era o resgate da família, da importância de estarmos juntos independentemente das dificuldades. Se tem amor, entendimento e compreensão, juntos vão mais longe mesmo com pouco dinheiro”, pontua.

Daniel prossegue avaliando sobre os valores que não tem visto. “Percebo na nossa sociedade que uns olham meio tortos para os outros. Que pena que essas pessoas têm uma consciência tão pequena e não entenderam ainda que somos todos iguais. O que interessa é o caráter da pessoa. Por exemplo, hoje em dia existe muita discussão perdida em cima de identidade de gênero. Desde que não prejudique, nem invada o espaço do próximo, o que tem a ver se alguém gosta de água e o outro de vinho? Somente por isso não olha na sua cara. O ser humano, hoje, está muito doente, por esse motivo que perderam-se esses valores que a novela resgata, fora as questões do preconceito. Como eu gostaria de ser tratado é como eu devo tratar o próximo. Aí você começa a expandir a consciência e a entender muitas questões que não são explicadas nem exercidas na nossa sociedade”, frisa.

Ele, inclusive, abriu um canal no YouTube, onde direciona o foco justamente para esses valores. “Gosto de falar das minhas experiências, da espiritualidade que eu busco, que eu percebi que me melhorou muito como ser humano. Conto sobre essa minha evolução dando dicas para quem quiser pegar. Obviamente, deixo claro que não sou terapeuta, psicoterapeuta, nada disso. Sou apenas um ator querendo falar das minhas experiências e tomara que ajude alguém. Da minha parte é uma doação que eu acho que posso fazer, sabe, usar a minha voz como artista para ajudar outras pessoas a clarear ideias. Hoje em dia a palavra é tão poderosa que você pode estar falando e estar curando alguém que você nem sabe. Uso a hashtag #medeixeviver no sentido de ‘me deixa ser eu pleno, como sou e como quero ser. Me deixa fazer o que gosto”, observa.

Daniel explica que possui humildade suficiente para entender a própria evolução. “Estou com 47 anos, quando olho para 30 anos atrás, eu falo ‘que menino bobo’. Eu também não tinha orientação, instrução. Gosto muito de ver novelas antigas para poder entender essas questões da sociedade. Achava que o mais importante era o que o outro ia pensar de você. Olha que loucura! Hoje, literalmente é o contrário. Não me interessa o que as pessoas pensam. O que interessa é o que eu penso de mim. É quem eu sou pra mim. Afinal, se você não se valoriza, quem vai te valorizar? Se você não acredita em você, quem vai acreditar? Então, hoje, sou esse cara, que aprendeu a acreditar em si próprio. Não abro mão dos meus sonhos”, frisa.

"Quando você abre mão de você mesmo, do seu sonho, a vida vai te cobrar lá na frente e aí você vai olhar pra trás e já não vai dar mais tempo”, ressalta Daniel (Foto: Bruno Matteo)

“Quando você abre mão de você mesmo, do seu sonho, a vida vai te cobrar lá na frente e aí você vai olhar pra trás e já não vai dar mais tempo”, ressalta Daniel (Foto: Bruno Matteo)

Daniel aponta que se tornou ator tardiamente com 22 anos. “Cursei engenharia civil por influência do meu pai e do meu irmão serem engenheiros. Mas tinha uma voz que me dizia ‘vá fazer teatro’. As minhas brincadeiras da infância eram voltadas para reproduzir novelas, personagens, escrever histórias. Olha que interessante, eu não tinha coragem. Hoje, atribuo a falta de amadurecimento, de entendimento, de apoio familiar. Na sociedade dessa época para se ganhar dinheiro, ter sucesso, você deveria ser médico, advogado, engenheiro. Cheguei a fazer estágio de engenharia em uma construtora, fui contratado, porque sou comprometido com tudo que faço. Aí comecei a ter de novo essa voz perturbando dentro de mim ‘vá fazer teatro’. Eu não tinha coragem. Por isso, comecei a me espiritualizar. Um amigo me falou que estava pensando em fazer teatro, queria saber o que eu achava. Eu tinha 21, 22 anos. Seis meses depois, esse amigo meu saiu do curso, ele não é ator e eu nunca mais deixei. Deus colocou esse cara na minha frente para me levar, já que eu não tinha coragem”, observa.

E deixa um recado aos fãs, que tem a ver com superação. “Independentemente da dificuldade, não abra mão do seu sonho nunca. Quando pisei no palco eu acendi por dentro, vi que ali era o meu lugar. Em mais de 20 anos de carreira, nunca consegui juntar dinheiro e ficar rico, mas uma coisa garanto: Sou feliz, não tenho vazio. Me sinto preenchido em relação a minha carreira e ao que passei. Dinheiro é algo que você não tem, mas pode conseguir. Mas quando você abre mão de você mesmo, do seu sonho, a vida vai te cobrar lá na frente e aí você vai olhar pra trás e já não vai dar mais tempo”, analisa.

Em sua mais recente fase de trabalho, está muito feliz com o resultado do curta-metragem Entreolhares, de Ivann Willig, que ainda não é conhecido do público, mas com o qual conquistou três prêmios internacionais de Melhor Ator, dois nos Estados Unidos (no The Scene Festival, de Maryland, e no Flight Deck Film Festival, em Nova York), e um na Inglaterra, além de um no Brasil, no Festival de Cinema de Bento Gonçalves. “Me trouxe muito reconhecimento. Mostra a validação de um trabalho bem feito. Isso me deixou muito feliz.

"Como vai ter filho sem dinheiro nos dias de hoje no Brasil? Acho complexo", observa Daniel (Foto: Bruno Matteo)

“Como vai ter filho sem dinheiro nos dias de hoje no Brasil? Acho complexo”, observa Daniel (Foto: Bruno Matteo)

Sempre empenhado na profissão que abraçou, Daniel, de certa forma, deixou a vida pessoal em segundo plano. “Propositalmente, eu não quis ter filho. Não quis me amarrar a mulher nenhuma justamente por priorizar o meu trabalho como ator. É preciso estar focado”, diz. Mas não existe um vazio por não ter experimentado a paternidade. “Eu me sinto preenchido, construí isso de verdade, não me despistei, não me boicotei. Eu tenho consciência plena do meu momento”, realça ele que namora há quatro anos com Amanda Santos, profissional da área de tecnologia da informação, que trabalha em uma multinacional.

Daniel tem dois filmes previstos para estrear em 2022, Amor Confuso Amor, rodado antes da pandemia, e Faixa Preta – A Verdadeira História de Fernando Tererê, realizado no início desse ano. No primeiro, interpreta o protagonista Jorge, que vive uma confusão mental, ao se apaixonar por outra mulher. O outro, conta a história de superação do lutador pentacampeão mundial de jiu-jitsu, nascido em uma comunidade do Rio de Janeiro. Daniel interpreta Alexandre Paiva, o Gigi, treinador do atleta”, conta. E tem ainda o filme documental, Quarentena Doc, com depoimentos de mais de 170 pessoas em mais de 20 países. “Estava trancado em casa na quarentena e fui convidado para participar dando depoimento sobre as mudanças que eu percebi na forma de viver com a pandemia em relação a tudo, a política, a forma como eu me exercitava, se as ruas do bairro estavam cheias ou não, então, entendo que vai ser um filme de referência cultural e histórica importante para a nossa geração e para as próximas que vierem”, finaliza.