Daniel Rangel estará em ‘O Coro’ no Disney+, direção de Falabella, e relembra polêmica da sua estreia no cinema


Após realizar quase três trabalhos simultâneos na Globo – ‘Malhação: Vidas Brasileiras’, ‘Eu, a Vó e a Boi’ e ‘Salva-se Quem Puder’, Daniel Rangel prepara-se para o projeto para streaming fora da “aldeia global”: a série musical “O Coro”. Sobre seu primeiro filme, “Fala Comigo”, que lhe valeu indicação a prêmio de Melhor Ator no Festival do Rio, ele diz: “O fato de serem dois homens jovens explorando a sua sexualidade gerou uma discussão. Ainda assim, acho que com o passar dos anos as pessoas vão entender que amor é amor e não há diferença nenhuma”

*Por Vítor Antunes

“Já estou até vendo, meu nome brilhando / E o mundo aplaudindo / Ao me ver cantar. O sucesso de Rita Lee, de 1970, parece ser a premissa de “O Coro: Sucesso aqui vou eu”. Coincidentemente, a canção de Rita e a série de Miguel Falabella têm o mesmo nome. A vontade de ascender na carreira artística é o norte do projeto da Disney+, que terá em Daniel Rangel um dos personagens principais. No projeto audiovisual da plataforma americana, o ator interpreta Leandro, um personagem que, a contrário dos últimos que vivera na televisão, não é um adolescente-vivido-por-um-adulto. Talvez seja este um dos primeiros papéis em que dá vida à alguém de uma idade próxima à sua, 27 anos, e sob uma ótica diferente do que costumava apresentar nas telinhas. Rangel diz que nesta série “todos têm uma idade próxima àquela que possuem de fato. Os personagens vivem os dilemas de jovens adultos”.

Conta-nos ele que n’O Coro, o seu rosto de menino estará camuflado em uma caracterização mais amadurecida: “Meu personagem usa barba, é um motoboy da quebrada, tem uma atividade na vida um pouco maior, diante de haver perdido a mãe muito cedo e haver assumido as responsabilidades da casa em razão de ter o pai alcoólatra. Tudo isso, precisa ser equilibrado diante do seu sonho de ser ator de teatro musical”. E aí que reside o conflito de seu personagem.

O Coro” trata-se do primeiro projeto de Daniel do gênero musical. Nunca havia investido nesta verve, senão nas aulas de canto da CAL (Casa das Artes de Laranjeiras), onde estudou. Tratou-se de uma aposta do diretor e autor, Miguel Falabella.  Ele diz: “Eu não tinha relação nenhuma com a música, além de cantar no chuveiro. Este é o meu primeiro trabalho musical onde houve uma demanda de canto e dança. Um desafio, já que havia atores do teatro musical no elenco. E todos foram muito generosos comigo”.

Daniel chegou ao “Coro” por convite do próprio Falabella. Afinal, protagonizara um dos últimos trabalhos escritos pelo louro na Globo, a série “Eu, a Vó e a Boi”. Rangel conta que, inicialmente, o contato entre eles “se deu nas leituras de texto. Haver podido aprender com ele neste projeto foi um privilégio. Miguel é um professor. Ele conduz os atores de um jeito muito particular, muito dele e tem uma vocação de passar tudo o que aprendeu na carreira. Dava para ver o brilho em seu olhar neste projeto. Foi muito bom ser dirigido por ele”, elogia.

Ainda sobre a série, o intérprete relata que uma de suas riquezas está em apresentar músicas do cancioneiro popular brasileiro às novas gerações. “As músicas de Chico Buarque e Caetano Veloso têm uma profundidade muito boa para interpretação. Há, porém, canções de uma época em que eu ainda não havia nascido”.

É muito importante estar trabalhando com um repertório de músicas que fazem parte da nossa cultura e é desejo do Miguel apresentar esses clássicos para as novas gerações” – Daniel Rangel

Daniel Rangel vê na exibição de “O Coro”, a chance de apresentar músicas populares de outras gerações para os jovens (Foto: Vinícius Mochizuki)

NOVOS PROJETOS NO CINEMA E ESTREIA COM PÉ DIREITO

O primeiro filme de Daniel Rangel foi alvo de discussão. “Fala Comigo”, rodado em 2015 e lançado em 2017, traz uma cena de sexo entre ele e o personagem de Tom Karabachian, dois adolescentes. “O fato de serem dois homens jovens explorando a sua sexualidade gerou uma discussão. Ainda assim, acho que com o passar dos anos as pessoas vão entender que amor é amor e não há diferença nenhuma. Não há razão para se polemizar em cima disso. É uma coisa natural, normal. Os anos vão passando e eu tenho essa esperança, talvez um pouco otimista, de que a gente está indo para um caminho legal (nesta temática)”. O filme, dirigido por Felipe Scholl, ganhou o Prêmio de Melhor Filme do Festival do Rio e valeu a Daniel a indicação ao Prêmio de Melhor Ator Coadjuvante.

Quanto aos novos projetos na telona, ele é mais discreto. Disse-nos que estará em um novo filme com a mesma equipe, mas não entrou em maiores detalhes. Além deste, falou sobre “Tudo Bem”, um curta que realizara durante a pandemia e que teve uma excelente repercussão. A atriz Heslaine Vieira também fez parte do elenco. Sobre “Tudo bem“, o ator diz ter sido “uma experiência maravilhosa. Inicialmente, a ideia era de fazer um curta, despretensiosamente. O fato de ser um filme sobre uma história de amor tendo a pandemia como pano de fundo, acabou tocando as pessoas e fez um sucesso inesperado, surpreendente”.

Tom Karabachian e Daniel Rangel em “Fala Comigo” (Foto: Reprodução)

INTERCÂMBIO DE GERAÇÕES

Em seu primeiro papel protagônico na TV, em “Malhação: Vidas Brasileiras”, o ator viveu Alex, filho das personagens de Camila Morgado e Felipe Rocha. Em seu segundo papel, também protagonista, na série “Eu, a Vó e a Boi”, foi neto de Arlete Salles, Vera Holtz e Otávio Augusto. Com este último, voltaria a contracenar em “Salve-se quem puder”. Diante de tantas feras, o nervosismo era mais que natural: “Na série do Globoplay, eu e Valentina Bulc conversávamos entre nós, dizendo sobre a importância em estarmos contracenando com Arlete Salles e Vera Holtz e que teríamos muitas cenas com eles nos meses seguintes. Eles se mostraram tão abertos, tão gente como a gente, que não demorou para que estivéssemos dando risada, numa relação de muita cumplicidade. Vera Holtz, assim como eu, gosta do universo geek  e pusemo-nos a falar sobre a Comicon [Um festival de temática nerd]. Quanto ao Otávio, a gente dividiu camarim, de modo que conversávamos muito. Essa troca é muito rica pra mim, tanto como artista como pelo lado humano”.

Habitualmente escalado para viver papéis mais jovens que ele, Daniel não vê um problema nisso, pelo contrário: “Acho ótimo, por que eu acabo fazendo personagens para os quais eu não seria mais habilitado. Os personagens mais maduros chegarão com o tempo, já que não há escapatória para o envelhecimento, mas enquanto eu puder me comunicar com esse público jovem, o farei. Naturalmente me interessa fazer trabalhos para outros perfis. Eu tenho muita vontade de fazer um vilão”

Daniel Rangel e Arlette Salles em cena de “Eu, a Vó e a Boi” (Foto: Estevam Avellar/TV Globo)

SALVE-SE QUEM PUDER. UMA NOVELA DIVIDIDA PELA PANDEMIA

Novela inicialmente gravada em 2019, “Salve-se Quem Puder” exibiu 54 capítulos quando precisou ser paralisada em razão do agravamento da pandemia. Ela e “Amor de Mãe” foram as principais obras atingidas pelo agravamento da crise sanitária oriunda da pandemia. Quando a gravação de capítulos inéditos foi retomada, a obra passou por todo tipo de dissabores. Desde a perda de um sem número de capítulos, a ter personagens idosos afastados da trama em razão de serem eles grupo de risco para a Covid. Como se isso não bastasse, o ator protagonista, o português João Condessa, precisou deixar o elenco.

Rangel estava no olho do furacão. Ele diz que o momento parece ter sido “um parêntese na vida, parece que aquilo não era real”. O ator prossegue dizendo que os problemas também se arrastaram para o lado técnico da produção: Todo mundo descobrindo como tocar a vida e ainda não havia vacina. Foi uma grande fase de experimentação voltar a trabalhar dentro desses protocolos. A equipe tendo que reaprender tudo, desde caracterização, ao figurino. A Globo – que habitualmente é muito ligeira – teve que alterar o ritmo de produção em face da pandemia”, conta.

Daniel conta que a novela meio que “virou cobaia” sobre formas de lidar com as limitações impostas pela Covid. “Eu lembro da equipe técnica toda de EPI, dos desafios de gravar cenas de intimidade. Nas cenas de beijo entre mim e a Valentina Bulc, experimentávamos várias formas de beijar, diante das limitações: Eu beijava uma  bolinha de tênis, ela beijava a mim de mascara, assim como o contrário. Experimentamos usar uma placa de acrílico que seria tirada na pós produção… Muita coisa! Mas sentíamo-nos muito seguros, em razão do cuidado que a Globo tinha conosco”.

Em “Salve-se Quem Puder”, Daniel Rangel foi Tarantino, um atleta da ginástica olímpica (Foto: João Miguel Júnior/ Divulgação TV Globo)

Para “Salve-se” Daniel precisou aprender ginástica olímpica. Treinou no Flamengo, conheceu Arthur Zanetti – que era da mesma modalidade que seu personagem –  e aprendeu muita coisa, da qual não consegue realizar mais. Segundo ele, sempre que era possível, ele fazia acrobacias – as simples. As mais complexas eram feitas por dublês. Lamentou o fato de o investimento no esporte haver sido diminuído na novela, também por conta dos rígidos protocolos. Assim como lastima o fim de “Malhação”, também eliminada da grade da TV como consequência da piora da Covid. Diz ele que a novelinha teen foi “um sonho, desde que vim de Campos (dos Goytacazes, interior do Rio). Ela foi muito importante pra mim e fez parte da minha história”.

O ator diz que desde que fez “Malhação”, acumulou um grande número de seguidores nas redes sociais. Para ele, o que o faz ter um número tão grande de fãs é sua autenticidade: “As pessoas passaram a querer saber o que eu faço da minha vida pessoal. Nesta época, eu fiquei um pouco inseguro sobre a exposição e sobre como as pessoas veriam as minhas opiniões. Hoje e tenho uma relação tranquila com as redes sociais. É muito difícil eu receber um direct negativo ou um hate”. E prossegue:

Eu vejo as redes sociais de maneira leve , não me sinto na obrigação de ter de me mostrar o tempo todo e fazer um milhão de stories por dia. Minha relação com os seguidores é muito leve, muito transparente – Daniel Rangel

Ygor Marçal, Daniel Rangel, Thiago Fragoso e Alice Palmar. Família em “Salve-se Quem Puder” (Foto: Paulo Belote/Divulgação TV Globo)

CÁPSULA DO TEMPO

Para encerrar a matéria perguntamos a Daniel como ele se imagina com a idade de seu pai – 55 anos. Ele, 27 anos, mas aparentando muito menos, a ponto de haver sido confundido com um menor de idade no supermercado, disse não ser dos que projeta muito o futuro, mas se dedica a construí-lo: “Já fui mais de pensar como estaria nesse futuro. Hoje não tenho muito de projetar. A vida se encarrega disso. Recentemente fomos apresentados a uma experiência, a Covid, que mostra-nos que não temos controle de nada, então é difícil imaginar onde estaremos. Mas aponto um caminho: aos 55 penso em mim como um cara leve, feliz com suas escolhas, fazendo projetos desafiadores, que me deixem com um brilho no olhar. Quero trabalhar com gente que eu admire, quero ser menos ansioso, ter uma família e vivendo a minha história da melhor forma possível”, projeta.

Quando falamos a palavra “futuro”, a primeira sílaba já pertence ao passado. A distância das horas na leitura deste parágrafo talvez abra um vinco de sorriso no rapaz. Mas quando os vincos se abrirem no rosto, esperamos que o Daniel do futuro encontre com este aqui (d)escrito. E sorria com a lembrança de uma menino que ousou sonhar.