Christiane Torloni estreia filme sobre Amazônia no Globoplay e celebra o retorno de ‘Mulheres Apaixonadas’ à TV


No mês em que se celebra a maior floresta tropical do planeta, o primeiro filme de Christiane Torloni como diretora “Amazônia, o Despertar da Florestania” entrou para o catálogo da Globoplay nacional. Além disto, atriz comenta sobre o retorno de “Mulheres Apaixonadas” ao Vale a Pena Ver de Novo – sua segunda exibição na faixa e a quarta num cômpito geral. Atriz também traz à tona a discussão sobre os avanços da causa LGBTQIAP+, na qual três personagens suas foram alvo de preconceito, sobre seu livro de memórias e o projeto de documentário sobre a atriz Marilena Ansaldi (1934-2021)

*Por Vítor Antunes

No ano que a morte de Chico Mendes (1944-1988) completa seu 34º aniversário e na semana em que se celebra a Amazônia, o filme “Amazônia, o Despertar da Florestania”, dirigido por Christiane Torloni e Miguel Przewodowski estreou no Globoplay brasileiro. E não poderia ser em momento mais oportuno, já que, em julho, a floresta passou por uma de suas mais graves queimadas. Co-diretora do longa, Torloni celebra a entrada do filme no streaming nacional depois de rodar o mundo: “Eu acho que a gente tem que estar antenado nas ferramentas do nosso tempo, em instrumentos que dão amplitude à voz. A gente só quer que a ‘florestania’ ecoe. Então, quanto melhor a plataforma, melhor o nosso voo. Eu fico muito contente de o longa realmente agora estar entrando no catálogo do Globoplay nacional, embora esteja na versão internacional da plataforma desde setembro do ano passado”.

Embora mergulhada nas questões ecológicas, atriz fala sobre o prazer de estar de volta ao ar em “Mulheres Apaixonadas”, sucesso de Manoel Carlos de 2003, que será reexibida na sessão “Vale a Pena Ver de Novo” – após uma vitoriosa exibição no canal Viva, entre 2020 e 2021. Em entrevista, comenta ainda o projeto de um documentário sobre a atriz Marilena Ansaldi (1934-2021), e fala ainda dois trabalhos icônicos realizados nas novelas “A Viagem” e “A Gata Comeu“, além de abordar a extravagância experimentada em 1978, quando, aos 21 anos, viveu uma mulher de 60 na novela “Gina“, sua primeira protagonista.

Eu acho que eu consegui começar a me comunicar muito cedo. Meu primeiro recibo de trabalho, ainda na extinta TV Tupi Rio, lá da Urca, tem 52 anos. Eu não tenho do que me queixar. A minha vida é uma benção de papéis lindos e de trabalho. E eu só posso agradecer por poder ser útil como cidadã, como artista, como brasileira e como guardiã da Amazônia

Christiane Torloni. A plenitude da maturidade (Foto: Danilo Borges)

Christiane Torloni: O brilho da estrela (Foto: Danilo Borges)

Christiane Torloni sempre foi engajada nas causas ecológicas. Esteve em momentos – e movimentos – políticos importantes do Brasil. Embora tenha tido grande empatia pela causa amazônica, passou a agir de forma mais efetiva em sua proteção depois de 2007, quando fez a série “Amazônia – de Galvez a Chico Mendes”, da Globo. Uniu-se aos atores Victor Fasano e Juca de Oliveira e lideraram a campanha “Amazônia Para Sempre”. O projeto e a luta ambiental tomaram corpo e ganharam ainda maior urgência até que em 2018 foi gravado o filme “Amazônia, o Despertar da Florestania”, que percorreu festivais mundo afora, entrou no Globoplay internacional, e, finalmente, teve sua estreia no streaming brasileiro no dia 5.

Christiane Torloni, Benki Piyòko e Miguel Przewodowski (Foto: Divulgação)

No longa, cuja direção é dividida com Miguel Przewodowski, a atriz discute a importância de se debater a florestania – conceito criado pelo cronista, poeta e pensador acreano Antônio Alves, no final dos anos 1980 para promover a cidadania adaptada à realidade amazônica. Christiane destaca o filme no contexto atual: “Acredito que nunca foi tão apropriado falar sobre ecologia. Infelizmente, o filme é ainda mais atual que na época de sua feitura [em 2018]. Nós apontávamos questões que se não fossem abordadas e enfrentadas naquele momento, já com o atraso, nós estaríamos colhendo péssimos resultados e é justamente isto o que acontece”. A fala da atriz encontra eco nos dados divulgados pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Especiais). Em julho foram detectados 5.373 focos de incêndio na região amazônica, contra 4.977 no mesmo período, em 2021. Desde o início de 2022, foram detectados 12.906 incêndios na mata, o que denota um aumento de 13% em relação aos sete primeiros meses do ano anterior. A atriz não mostra-se animada com as políticas ambientais no país, embora saliente a importância desta temática ser debatida num ano de eleições.

Infelizmente um sistema democrático ainda muito frágil, com brechas na nossa democracia a nossa política ambiental é a pior das últimas décadas. Discutir a florestania nesse momento é importantíssimo, de modo que o filme está muito atual e eu só posso entender que as pessoas que têm algum tipo de consciência, de clareza, e que não sejam negacionistas, estejam escolhendo bem os seus candidatos, a partir de propostas de políticas públicas de preservação da floresta, porque ela é a nossa garantia de termos água – Christiane Torloni

Christiane ressaltou a importância fundamental de se preservar a Amazônia: “Trata-se do verdadeiro regulador da umidade do planeta e, infelizmente, estamos sendo inconsequentes. Então, a gente tem uma grande oportunidade agora, nessas próximas eleições, de fazer uma reflexão sobre isso, já que as informações estão mais transparentes do que nunca, e também observar as fake news.

Pode haver alguma mentira sobre o que está acontecendo, mas é impossível negar as mudanças. É impossível tapar o sol com a peneira – Christiane Torloni

Aliás, ainda sobre esta temática, a atriz lança luz sobre observar a pauta ecológica dos candidatos a presidente e sugere que, nas redes sociais, seja utilizada uma hashtag em prol da floresta: “Esse é um projeto maravilhoso do instituto que eu faço parte, a Fundação Amazônia Sustentável. Neste momento é importante a gente ratificar o voto em pessoas que objetivam ver a Amazônia viva e com sustentabilidade. Convido aos leitores a entrarem no site da Fundação Amazônia Sustentável e saber o que é o voto na Amazônia Viva através da hashtag #euvotonaamazoniaviva“.

Christiane Torloni em plena Amazônia. Atriz luta pela florestania (Foto: Divulgação)

PEÇA E DOCUMENTÁRIO À VISTA

A movimentada vida artística de Christiane conta ainda de outros momentos importantes. Recentemente montara um espetáculo em parceria com a Companhia de Dança Studio3, de São Paulo, na qual homenageia a atriz Marilena Ansaldi (1934-2021). Além da peça, deferência à grande atriz contará também com um documentário sobre a bailarina, coreógrafa, autora, produtora e atriz brasileira. Foi a primeira bailarina do Teatro Municipal de São Paulo e dançou no balé Bolshoi como convidada. A montagem, dirigida e roteirizada por José Possi Neto, foi coreografada por Anselmo Zolla e contou com apresentações tanto no Auditório do MASP como no vão do museu. Chris destaca esta apresentação como sendo algo “magnífico. Um momento inesquecível na carreira e do qual sou muito grata”.

Christiane e Marilena têm uma coincidência curiosa na televisão. A falecida atriz, de presença bissexta nas telinhas, fez apenas duas novelas na Globo. Nas duas fora mãe de Torloni. Na primeira, “Selva de Pedra” (1986) sua personagem chamava-se Vivi e a de Chris, Fernanda. Dez anos depois, Ansaldi fez “Cara e Coroa”. E, não mais curioso, a sua personagem chamada Fernanda e a da Christiane, Vivi. Para 2023, a artista, mãe de Guilherme (1979-1991) e Leonardo, também intenciona finalizar o projeto de seu livro de memórias.

Christiane Torloni e Marilena Ansaldi em “Selva de Pedra” (1986) [Foto: Divulgação Tv Globo]

HELENA, A MUSA DE MANOEL CARLOS

Após a parceria bem sucedida com Gilberto Braga (1945-2021) na coautoria de “Água Viva”, de 1980, Manoel Carlos teve a chance de escrever sua primeira novela solo na Globo. Tratava-se de “Baila Comigo”, cuja estreia deu-se em 1981 e iniciou a famosa dinastia de “Helenas”. A primeira foi Lílian Lemmertz (1937-1986). Nesta novela, Christiane Torloni viveu Lia, a filha de Helena, irmã dos gêmeos protagonistas interpretados por Tony Ramos. Vinte e dois anos depois seria a vez de a atriz dar vida à icônica heroína Manequiana. Segundo ela, a experiência tratou-se de “um divisor de águas. O Manoel Carlos é um autor que quantifica as suas musas”.

Chris Torloni foi Lia, a filha da Helena pioneira, em “Baila Comigo”, de 1981 (Foto: CEDOC/TV Globo)

A atriz contou-nos como se deu esse encontro com Maneco e o convite a protagonizar a novela: “Foi em Nova York e ele tem essa coisa ‘Manhattan’. Marcamos no Central Park para conversar sobre a novela e ali ele foi me enredando com a ambiência da personagem”. A atriz descreve também que as rubricas das personagens são “obras-primas, porque é ali onde o autor vai contando para os atores, realizadores e pesquisadores o que ele quer para as cenas. Ele tem uma  transversalidade na obra, o que contribui pra que todos sejam mais criativos. E isso acaba imprimindo na obra. Inclusive, se ele pudesse escreveria o capítulo no dia que ele fosse ao ar”, descreve. Destaca, de igual maneira, a longeva parceria entre ela e outros companheiros de cena, como José Mayer e Tony Ramos. Fora o par romântico de ambos em “Selva de Pedra” (1986) e repetira a experiência em “Mulheres Apaixonadas”: “Um encontro magnífico com parceiros de toda uma carreira”.

“O que que é muito bonito nessa novela que você não tem um herói. São os personagens protagonistas são todos anti-heróis com toda humanidade que um anti-herói tem. Então foi muito importante fazer. Eu acho uma obra icônica e fico muito feliz dela estar sendo reprisada trazendo toda uma contemporaneidade de reflexão sobre o Brasil. É muito interessante [observar], vinte anos depois, a atualidade dessa novela – Christiane Torloni

Em “Mulheres Apaixonadas”, Helena dividiu-se entre o amor de Téo (Tony Ramos) e César (José Mayer) [Foto: Divulgação/TV Globo]

“A VIAGEM”, “A GATA COMEU”, O SOBRENATURAL E O DOM DE IVANI

Quando Christiane Torloni foi escalada para fazer “A Viagem’, a atriz vinha de um momento trágico em sua vida. Estava morando fora do Brasil em razão de, após um acidente, haver perdido seu filho Guilherme, fruto do casamento com o diretor Dennis Carvalho. Estava decidida em não fazer novelas especialmente naquele momento quando fora convidada por Wolf Maya a protagonizar o remake da famosa novela espírita exibida na Tupi em 1975. Conta-nos a intérprete de Dinah, que o diretor lançou mão de um ardil para seduzi-la a fazer a obra. “Ele me convidou para fazer uma comédia. Brinco dizendo que fui enganada por ele”. De fato, na primeira fase da trama, a personagem protagonista mostra-se uma mulher frívola e enciumada, que muda de postura após o suicídio do irmão, Alexandre (Guilherme Fontes).
Chris prossegue dizendo que “depois, quando eu vi a extensão dramática do personagem, entendi que, sim, tratava-se de um chamado. Durante o período em que morei em Portugal eu tive um convite a ler a obra de Kardec (1804-1869), e é algo impressionante esse trabalho da mediunidade, dos espíritos…”

A novela “A viagem” foi como um portal de volta ao Brasil – Christiane Torloni

A transcedentalidade existente na obra de Ivani Ribeiro (1922-1995) é entendida por Christiane como uma “experiência metafísica em vários aspectos. Não há a menor dúvida”. E a atriz dedica à falecida autora os momentos mais felizes de sua carreira na TV: “Ivani reconheceu em mim uma missão muito clara. Quem poderia imaginar que eu faria papéis que foram da Eva Wilma (1933-2021). E eu vivi personagens interpretados por ela em três ocasiões, sendo duas em novelas da Ivani”. Além de “A Viagem”, Torloni viveu Jô Penteado, de “A Gata Comeu”, remake de “A Barba Azul”, da Tupi, na qual Wilma interpretou a protagonista. O terceiro personagem de Chris, anteriormente vivido por Eva foi a Rebeca de “Tititi” (2010). A novela dos anos 2000 usou parte da trama de “Plumas e Paetês” (1980) em sua narrativa e foi nesta última que a finada atriz trabalhara. Ao contrário de “A Viagem” e “A gata Comeu”, “Tititi” e “Plumas” foram escritas por Cassiano Gabus Mendes (1927-1993).

Torloni segue dizendo que entre ela e Ribeiro havia uma grande “sintonia e eu acho que essas coisas não se dissipam, elas são transcendentais, metafísicas. Jô Penteado e Dinah, de “A Gata Comeu” e “A Viagem”, respectivamente, são testemunhas de transformação através do amor”. Christiane segue dizendo que, devido à escrita de seu livro de memórias flagrou-se com um bilhete à mão, por Ivani, que a emocionara sobremaneira. Ainda na seara do sobrenatural, a atriz pensa que o mistério da vida passa pela arte.

A arte é o caminho para poder navegar nesse oceano que é a vida com todas as suas ventanias, calmarias, encontros de lugares incríveis, despedidas, reencontros… Como diria Fernando Pessoa (1888-1935), navegar é preciso, né? – Christiane Torloni

Christiane Torloni viveu Diná em “A Viagem”, novela de maior audiência na década de 1990 (Foto: Acervo/TV Globo)

Embora trate-se uma novela de muito sucesso, “A Gata Comeu” pode ter recortes problematizados quando olhada sob o matiz contemporâneo. Especialmente diante do fato de Jô e Fábio, o casal principal, se agredir mutuamente. A novela chegou a ter como nome provisório “Tapa de Amor não Dói” e frases como “Bateu, Levou” eram rotineiramente faladas por seus personagens. Sobre esta questão, a Christiane observa: “E eu acho que a gente deve observar essas novelas como os nossos clássicos. “E o Vento Levou”, por exemplo, tem uma perspectiva, traz o recorte do racismo estrutural, Quando olhado hoje observa-se tratar de um filme politicamente incorreto, mas, sob outra ótica, ele retrata o espelho da realidade daquele momento, está mostrando que aquilo existe. Então cabe à sociedade ver isto, observar estas obras como um espelho da sociedade naquele momento, ‘entre tapas e beijos’. Graças a Deus, agora nós temos leis que dizem que relações como aquela não podem ser. Acho que isso é antropologia dramatúrgica. A gente não pode cancelar o processo, já que nós somos fruto dele, então vamos fazer o nosso melhor. Mas nunca apagar o passado. A gente não pode esquecer dele. Tanto Manoel Carlos como Ivani Ribeiro são pessoas que lidavam na sua dramaturgia com situações absolutamente contemporâneas, daí a identificação com os personagens”.

“A Gata Comeu”, de 1985, foi uma novela icônica daqueles idos (Foto: Nelson Di Rago/TV Globo)

Em “A Gata Comeu”, Chris Torloni foi Jô Penteado (Foto: Nelson Di Rago/TV Globo)

A artista diz ser muito grata àquele momento de sua carreira: “A Gata Comeu tratou-se de uma combinação de valores e princípios, tanto com elenco, como com a direção, que é algo muito bom. A trilha da novela é maravilhosa, assim como a capa do disco, que é super pop, tem toda uma estética dos Anos 1980″. Torloni, inclusive, traz à tona a inclusão de campanhas sociais presentes em algumas novelas nas quais trabalhara. Como anteriormente citado, o suicídio estava presente em “A Viagem” – tema inclusive de discussão do atual mês, do Setembro Amarelo: “As campanhas que foram acontecendo durante as novelas são essenciais, porque tonificam a sociedade. E a teledramaturgia tem uma função pedagógica, sim. Cultura significa identidade de um povo. E a televisão tem um valor importante, inegável dentro da nossa cultura, principalmente agora nesse pós-pandemia (…). Se nós já estávamos bem doentes antes, agora estamos muito mais ainda. A depressão, por exemplo, pode ser o tipping point que leva uma pessoa a se matar. Então isso tem que ser debatido, discutido pra que as pessoas percebam. Personagens como a Haydée de “América” que era cleptomaníaca. É um sofrimento aquilo. E o fato de esta questão haver sido revelada, debatida e exposta ajudou muitas pessoas a realmente saírem daquela situação de aprisionamento. É muito importante esse espelhamento”.

TEMPOS DE MUDANÇA

Um dos primeiros papéis protagonistas na carreira de Christiane Torloni foi a “Gina”, da novela homônima. A trama de Rubens Ewald Filho (1945-2019) era baseada no romance de mesmo nome, escrito por Maria José Dupré (1898-1984).  A novela de 1978 revelou-se um grande desafio para a atriz, que precisava, aos 21 anos, viver as várias fases da vida da personagem que nomeava a trama – desde a sua mocidade à maturidade, de modo que Gina conclui a novela com cerca de 60 anos. Idade próxima a de Christiane atualmente.

Sobre o papel na única novela escrita por Ewald na Globo, Chris celebra e diverte-se ao relembrar da personagem: “Havia uma dúvida se eu deveria ou não protagonizá-la e o Boni foi definitivo nessa escolha, pois cria ser o momento de eu ser protagonista, de ser reconhecida imediatamente nesta função. O que eu acho um espanto é que na época tenha se acreditado que eu, aos 21 anos pudesse aparentar ter 60. Eu vejo algumas cenas que os fã-culbes postam e é impressionante, porque há ali todo um colágeno que você tem aos 20 anos, mas não tem aos 60. É meio fake, a ponto de ser engraçado. Eu sempre debati muito se eu não teria sido melhor que nessa segunda etapa da trama que a mamãe, a atriz Monah Denacy, fizesse a personagem. Mas nem mesmo ela tinha 60 anos naquele momento embora pudesse tranquilamente interpretá-la”, diverte-se.

Eu acho que a passagem do tempo acontece você ocupando o tempo na ação em viver. Não é filosofia, é caminho. Aos 20 anos, com certeza, eu não tinha caminhado tudo que eu caminhei até hoje. E não podia emprestar isso pra personagem por mais densidade, boa vontade e talento que eu tivesse – Christiane Torloni

Tanto em “Gina”, de 1978, foi um dos romances adaptados para a televisão escritos por Maria José Dupré. “Éramos Seis”, sua obra de maior sucesso, foi quatro vezes adaptada para a televisão. Em quase a todas as ocasiões, a autora não fora creditada em seu nome, mas como Sra. Leandro Dupré, ou seja, através do nome de seu marido, que era engenheiro. Apenas depois de morta, a autora foi deixou de ser invisibilizada em sua assinatura e somente na versão de 2019 de “Éramos Seis“, creditou-se como “Baseado em original de Maria José Dupré”. Marca de um tempo.

Christiane Torloni em “Gina”. Nesta foto, a personagem já vivia a sua fase madura, ao passo que sua intérprete tinha apenas 21 anos (Foto: Acervo TV Globo)

Outra marca do tempo diz respeito às personagens LGBTQIAP+ vividas por Torloni tanto na TV como no cinema. Em “Ariella” vivera uma lésbica, assim como na novela “Torre de Babel”. Nesta última, a grita popular fez com que a personagem fosse explodida junto à sua parceira, vivida por Sílvia Pfeifer. No remake de “Selva de Pedra”, havia, também uma sugestão de lesbianismo entre Fernanda, papel de Christiane, e Cíntia, vivida por Beth Goulart. Tanto que a canção “Perigo”, de Zizi Possi, foi escrita sob encomenda para as personagens. Porém o público torceu o nariz, assim como a Globo, que acabou demitindo o diretor, Walter Avancini (1935-2001).

Sobre suas personagens haverem sido alvo de preconceito, Christiane Torloni reitera a opinião sobre ser reflexo de uma época e acredita que atos assim tenham mais dificuldades de se estabelecer num âmbito mais contemporâneo: “A teledramaturgia do audiovisual é o espelho da sociedade, dos seus flagelos, riquezas e virtudes. Então, com toda a certeza, os personagens que eu fiz que tinham essa liberdade já absolutamente assumida. Essas mulheres são representativas.

Christiane Torloni e Sílvia Pfeiffer. Personagens lésbicas foram implodidas junto com o shopping. Preconceito (Foto: Reprodução TV Globo)