Kani com tofu: no novo “Cavaleiros do Zodíaco”, metrossexuais e integrantes do One Direction brincam de salvar deusa grega


Maldade japa: nova empreitada do anime pela tela grande traz vilão que faz frente à canastrice de Paola Bracho, a pérfida-mor das novelas mexicanas, em roteiro mais que simplório!

Em qualquer almanaque dos anos 1980 certamente consta, a título de curiosidade de quermesse, o verbete “Os Cavaleiros do Zodíaco” (Saint Seiya), o anime criado nos idos de 1986 por Masami Kurumada que fazia o maior sucesso também no Brasil, dentro da programação matutina de desenhos animados na TV. Parte da formação de toda uma fornada de crianças, a série ocupa até hoje o imaginário dos nerds na faixa de uns trinta e poucos, competindo na memória afetiva com outros enlatados nipônicos da mesma época, em carne e osso, como “Dengeki Sentai Chenjiman” (por aqui, “Changeman”), “Sekai Ninja Sen Jiraiya” e “Jáspion” – abominações mal feitas que iam na contramão da produção mainstream, tipo Hanna Barbera, mas que, por isso mesmo, eram repletas de charme.

Naturalmente, essa febre oitentista se sucedeu às batalhas capitaneadas por “National Kid” versus seus incas venusianos nos 1960’s e abriu espaço para aquilo que viria na década seguinte – “Dragon Ball Z“, “Pokémon” e “Digimon” nos 1990’s –, provando que cada geração de guris tem o cartoon japa que merece, mesmo que tire dez em álgebra e mantenha o quarto arrumado, sem deixar as meias e cuecas pelo chão. Sim, japonês é cruel e não dá para confiar num povo que come peixe cru, pratica harakiri, é kamikaze de carteirinha e curte ver suas casas pisoteadas por monstros da estirpe de Godzilla. Ou pior, veste suas adolescentes em Harajuku, o bairro moderninho de Tóquio, com modelitos sumários e misóginos capazes de transformá-las em petisco de velho babão. Haja cosplay!

Agora, “Cavaleiros do Zodíaco – A Lenda do Santuário” (Seinto Seiya: Legend fo the Sanctuary, de Keiichi Sato, Toei Animation, 2014) chega aos cinemas repaginado por efeitos especiais de ponta, ainda em 2D, com um duplo objetivo: capitalizar a atenção dos marmanjos que degustavam o programa na tevê e apresentar os personagens a um público mais novinho, que não pegou necessariamente a atração na telinha em inúmeras reapresentações, mas que cresce às custas de recursos modernos como os 3D atuais. Por isso, esta sexta empreitada da franquia nos cinemas inaugura nova fase, toda em CG (computer graphics), ainda que a eloquência visual (fato!) deixe a desejar em alguns aspectos técnicos, faltando certa profundidade de planos. Ainda assim, em resultado plástico infinitamente superior ao dos longas anteriores e da série clássica, provando que a fila anda.

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Fotos: Divulgação

A história continua girando em torno do kabuki do samurai doido que caracteriza a série, misturando mitologia grega, astrologia, aventura fantástica, moralismo de samurai, muitos raios, golpes de karatê e quatro rapazes poderosos de cabelos super espetados modelados no secador, com aspecto que, não se sabe, pode ser de metrossexuais, integrantes do One Direction ou dignos representantes da turma alegre. Esses jovens cavaleiros de bronze são bonitões cujo destino é proteger o pitéu Saori Kido, uma garota que usa saia colegial sobre pernocas longilíneas e torneadas, passível de fazer Quentin Tarantino uivar feito lobisomem em noite de lua cheia. A menina é a reencarnação de Atena, a deusa da sabedoria do Olimpo e protetora da Terra, sofrendo perseguição do Grande Mestre, uma espécie de versão masculina de Paola Bracho (de “A Usurpadora”), com voz grossa, armadura e canastrice no mesmo patamar de Gabriela Spanic Utrera, a venezuelana que dá vida à vilã na novela-master da mexicana Televisa. Precisa dizer mais?

Naturalmente, ninguém na plateia está preocupado com coerência, personagens menos maniqueístas e muito menos um roteiro bem resolvido. Este está a cargo de Tomohiro Suzuki, profissional que certamente entrou no métier através de algum curso por correspondência. E, em era na qual os desenhos animados são cada vez mais sofisticados, tanto estilística quanto dramaturgicamente – vide a complexidade dos argumentos inserida dentro da simplicidade formal nos longas da Pixar, uma delícia até para adultos –,  a obviedade do plôt pode ser vista tanto como defeito quanto qualidade, já que essa falta de nuances não deixa de ter certo apelo em um mundo com excesso de desdobramentos, mesmo causando estranheza à parcela do público que nunca foi fã de “Os Cavaleiros do Zodíaco”.

Trailer oficial (Divulgação)