Carlos Tufvesson apresenta doc-reality ‘Vestidas de amor’, no Globoplay, sobre diversidade e fala da saudade do marido


Com seis episódios, o estilista mostra o amor em formas plurais, com histórias emocionantes. Nesta entrevista, Tufvesson fala de como a atração foi concebida e relembra a sua própria história com o arquiteto André Piva, que morreu há pouco mais de dois anos, vítima de leucemia, com quem ficou casado por 25 anos. Comenta a sua atuação à frente da Coordenadoria Executiva da Diversidade Sexual da Prefeitura do Rio de Janeiro com a militância de uma vida em prol da liberdade e do direito de todos. “Tem muito trabalho pela frente. Junho é o Mês do Orgulho LGBTQIA+, estamos preparando nossa campanha. E quero, como em ‘Vestidas de amor’, poder contar mais histórias de amor. Quem sabe escrever um livro sobre o tema? Gostaria”, revela

*Por Brunna Condini

Carlos Tufvesson desmarcou a primeira tentativa dessa entrevista por um bom motivo. Depois de ficar uma madrugada inteira ‘maratonando’ o programa ‘Vestidas de Amor’, que estreou nesta quinta-feira (11) no Globoplay, apresentado por ele, o estilista, que na atração de seis episódios tem o desafio de assinar e produzir os vestidos feitos exclusivamente para as noivas, incorporando elementos simbólicos dentro do universo de cada casal, como o pomerano, candomblé, indígena, árabe, evangélico e melhor idade, afirma que a possibilidade de falar de amor em sua diversidade, o seduziu no formato.

“O programa está lindo, não resisti e perdi a hora, desculpe (risos). Esse projeto nasceu de um papo meu com o Rafael Dragaud (diretor executivo da atração) há cinco anos. Hoje, no mundo tem muitas coisas nos separando, mas pensei: o que une pessoas? O amor. As noivas que vão no meu atelier são unidas pelo amor, até por isso acabam se parecendo no fim das contas, até brincamos com isso no programa. Nosso país está precisando de amor. Um amor que eu tive e que tantas pessoas têm, e deve ser a base de tudo”, diz Tufvesson, que viu seu companheiro de 25 anos, o arquiteto André Piva, partir há pouco mais de dois anos em consequência de uma leucemia.

Recebo desde a passagem do André mensagens com textos muito bonitos, são lindas histórias de amor, como foi a nossa. Adoraria estar contando no programa a nossa história (se emociona). Mas é até difícil falar – Carlos Tufvesson

“Quando falei pela primeira vez sobre esse programa, o André ainda estava vivo. E o mais louco é que me ligaram um mês e meio após a morte dele para dizer que faríamos a atração. Talvez a gente tivesse mesmo que contar essa história nesse momento. Muitas pessoas ali tiveram que lutar por seus amores, sonhos, estão celebrando esses encontros, curas. Mas sempre tendo como ponto de partida o amor. Mostrar o ritual de casamento de cada uma dessas pessoas foi uma grande honra, porque eu revi o meu. A festa da estreia do programa foi no Cine Leblon, cujo prédio passou por um retrofit assinado por André Piva. Não acredito em coincidências. É uma coisa muito louca, porque estamos falando de amor e ele deu um jeito de estar lá. O gatão está sempre comigo”.

Carlos Tufvesson mostra o amor nas suas mais diversas formas em 'Vestidas de Amor', produção Globoplay (Foto: Globo/Ellen Soares)

Carlos Tufvesson mostra o amor nas suas mais diversas formas em ‘Vestidas de Amor’, produção Globoplay (Foto: Globo/Ellen Soares)

Um dos pioneiros na luta pelo reconhecimento oficial das relações homoafetivas, o empresário e ativista se casou com Piva oficialmente em 2013, após recorrer ao STF para conseguir legalizar a união que já existia desde 1995. O casamento dos dois inspirou muitos casais homoafetivos. “Cada vez que vejo um casal de mãos dadas na rua lembro como era mais difícil, quantas agressões sofridas, ataques. Vejo como foi importante mostrar nosso amor, que existem dois maridos, como podem haver duas esposas. No programa temos um casal homoafetivo casando em uma cerimônia religiosa e sei que muitas pessoas ao assistir vão se sentir abençoadas por Deus, porque não tem como Deus não abençoar o que é amor”.

André Piva e Carlos Tufvesson foram casados por 25 anos (Reprodução/ Instagram)

André Piva e Carlos Tufvesson foram casados por 25 anos (Reprodução/ Instagram)

Acha possível essa coisa de ressignificar a ausência dele? “Tomei um ‘bode’ dessa palavra, ressignificar. As pessoas dizem que eu vou, mas acho que não dá para ressignificar nada, quanto mais o tempo passa, mais saudade eu sinto. Não consigo aceitar que ele não está aqui, que Deus o levou, uma pessoa com tanta luz, tanto talento. Sigo acreditando no amor, afinal vivi 25 anos da mais plena felicidade. Minha mãe me lembrava disso. Perdi minha mãe (Glorinha Pires Rebello) oito meses depois do meu marido. Ela via o quanto nos amávamos e me avisou que eu sofreria muito com a perda dele, não teria jeito. Não tem como falar do André sem me emocionar, ele é o meu amor. Quando vejo uma pessoa amando, casando, fico feliz por ela. Celebro o amor, como faço neste programa”.

O estilista em 'Vestidas de amor' com Lindinha, que experimenta o casamento na "melhor idade" (Foto: Globo/Fábio Rocha)

O estilista em ‘Vestidas de amor’ com Lindinha, que experimenta o casamento na “melhor idade” (Foto: Globo/Fábio Rocha)

Pelo direito de amar

Há dois anos, ele aceitou o convite do prefeito Eduardo Paes para assumir, em plena pandemia, a Coordenadoria Especial de Diversidade Sexual (CEDS), em que atuou de 2011 a 2016, agora com o nome Coordenadoria Executiva da Diversidade Sexual, e vem reestruturando o órgão. “Tem muito trabalho pela frente. Junho é o Mês do Orgulho LGBTQIA+, estamos preparando nossa campanha. E quero, como em ‘Vestidas de amor’, poder contar mais histórias de amor. Quem sabe escrever um livro sobre o tema? Gostaria”, revela.

Tufvesson reconhece que muitas transformações por um mundo mais diverso e inclusivo vêm se tornando realidade, no entanto pontua: “Hoje o Brasil tem uma legislação vigente graças ao trabalho de muitos ativistas, que vieram até antes de mim. Mas ainda falta diminuirmos o índice de crimes de ódio contra a comunidade LGBT. Ano passado tivemos um aumento de 33% em relação a esses crimes e de 8% de suicídios dessa comunidade. Acho que são números que envergonham o nosso país. Precisamos lembrar que ninguém precisa ser LGBT para lutar contra a LGBTfobia”

E mais: “O cidadão precisa denunciar e quem tiver seus direitos violados também, para isso existem as leis. O Poder Público só pode se manifestar quando provocado. Da mesma forma que quando aprovamos o casamento no Supremo mudou muito a concepção da sociedade sobre o que era a união de duas pessoas do mesmo gênero, as denúncias sobre essa violência não são mi mi mi”.

Infelizmente ainda somos uma minoria que é constantemente expulsa de casa por ser quem somos. Infelizmente existem pessoas que se acham no direito de agredir até a morte alguém pela orientação sexual e identidade de gênero. Isso é inadmissível em um Estado Democrático de Direito como diz ser o nosso país – Carlos Tufvesson

Cena do programa 'Vestidas de amor' da Globoplay (Foto: Globo/Ellen Soares)

Cena do programa ‘Vestidas de amor’ da Globoplay (Foto: Globo/Ellen Soares)