*Por Brunna Condini
Bruno Luperi tem uma missão grande pela frente orquestrando ‘Renascer‘, próxima trama das 21h da Globo que estreia nesta segunda-feira (22), segundo remake que ele assina a partir da obra do avô, Benedito Ruy Barbosa. E missão dada, é missão cumprida? “Espero que seja (risos). É muito difícil mexer num clássico, ainda mais do seu avô. E ele está vivo, graças a Deus, para acompanhar. Espero honrar o seu legado”, diz, em entrevista exclusiva. “Meu avô ficou muito feliz quando soube que eu iria fazer ‘Renascer‘. Me colocando no lugar dele, não deve ter recompensa maior neste momento da vida do que ver que os frutos que plantou geraram outros e estão caminhando sozinhos em cima do caminho que trilhou”.
Para o autor o atual trabalho é nostalgia pura. “Essa é a novela mais especial para mim, porque toca no sensorial, na memória da minha infância e está muito presente. Nunca sonhei que iria escrever um remake, mas sonhava em um dia me emocionar com o meu trabalho como meu avô fazia com o seu. Isso aconteceu e me deixa muito feliz. Tenho memórias muito vivas de ‘Renascer‘, foi a novela que vi acontecer e guardo essas lembranças. Frequento muito a casa do meu avô desde pequeno, então recordo de ele escrevendo essa novela, chorando, sorrindo, se emocionando. Lembro das reuniões de produção que aconteciam em sua casa, e depois, passado um tempo, daquilo tudo acontecendo na televisão e virando um sucesso estrondoso”. E compartilha mais uma memória afetiva:
Tenho uma lembrança também na época da Páscoa, de pegar os ovos de chocolate com meu irmão e colocarmos na cama, pisando como se fosse o cacau, porque tinha essa imagem do Marcos Palmeira pisando no cacau na primeira versão, como João Pedro. Era tudo muito marcante – Bruno Luperi
Bruno conta que já tem 104 capítulos escritos, o que é número bem adiantado para uma trama que deve chegar aos 200. “Tem que ser assim, para seguirmos bem produzindo uma novela como esta, com a realidade de mercado de hoje, com o dinheiro cada vez mais contado. E dinheiro não leva muito desaforo, então precisa ser muito bem aplicado. Ter essa frente de capítulos ajuda a todos, a produção, a andamento da história”.
É uma novela cara por conta da quantidade de externas? “Eu não tenho esse dinheiro (risos). Não sei dizer, é um cheque que não assino. Procuro é escrever uma boa novela. Esse é o meu departamento, escrever com muito carinho, amor. Essa coisa de ser cara é relativa, depende do retorno que dá. Acho que ‘Pantanal‘, por exemplo, do ponto de vista do retorno que deu, não foi uma novela cara, por exemplo. E pisou novamente em um espaço afetivo das pessoas que era difícil de ser alcançado, fazendo conexões entre o público de décadas atrás e o de agora. Nosso trabalho é esse, investir em uma boa história”.
Com a queda da audiência de tantas novelas na Globo, o que faz suas releituras da dramaturgia criada por seu avô serem tão bem-sucedidas? “Todo projeto tem uma característica única. A desses projetos fala dessas duas gerações trabalhando em uma mesma obra, que consagrou o autor original. Mas todos os trabalhos têm suas especificidades, então não acho que isso seja exatamente uma fórmula de sucesso. Isso não quer dizer que se eu pegar toda obra dele para fazer terá o mesmo resultado. Todo trabalho precisa de um coração pulsando, uma alma, muita doação. Aprendi com meu avô a doar o que tenho de melhor”, avalia.
Observei meu avô a vida toda trabalhando muito. Minha avó sempre dizia que ele viveu mais os personagens do que a nossa família. É preciso muita dedicação e ele deixa isso como legado. A fórmula do sucesso é trabalho duro. E carregar nas tintas humanas. Vejo esses valores na obra dele e tento colocá-los no meu texto, passar isso para os meus filhos em casa. Um autor precisa se despir de tudo e embarcar de corpo e alma no que está criando. É isso que procuro fazer – Bruno Luperi
Entendendo que seu trabalho como autor é o de dialogar com o seu tempo, Bruno fala sobre algumas das transformações que poderão ser vistas na versão atual de ‘Renascer‘. “É como se eu tivesse a oportunidade de entrar no jardim que foi plantado há 30 anos. Nesse tempo conseguimos perceber quais temas evoluíram e quais permanecem atemporais. E também os assuntos que não evoluíram e precisam ser revisitados. Vocês vão perceber muitas mudanças na novela atual, mas sempre respeitando o espírito da obra”, diz.
“A Buba (hoje Gabriela Medeiros, e no original, feita por Maria Luísa Mendonça), por exemplo, tem uma nuance da primeira versão de questionar um pouco esse espaço do que se deve esperar de um filho do coronel do cacau, desses herdeiros. Quem é o melhor filho desse cara? Ela fala muito de coisas que há 30 anos não tínhamos tão claro, como esse lugar do patriarcado, do machismo e minha ideia é poder discutir ainda mais sobre isso. Ao mesmo tempo que essa personagem tem um compromisso com o original, não pode se omitir em relação às pautas dos dias de hoje”. E se atenta à estreia da novela no Mês da Visibilidade Trans: “Acho que o universo conspira quando fazemos um trabalho com o coração aberto. Essa é uma coincidência que vem para abençoar. Toda essa pauta de gênero, racial, de religiosidade, todas essas questões estarão em ‘Renascer’. Tem muitas questões, a transformação do Padre Lívio em pastor, tem a Inácia com a questão da ancestralidade dela, se ser uma candomblecista. É uma novela que fala com todos, amplifica discussões, isso é urgente. O folhetim é esse canal de diálogo também”, reflete Bruno.
A minha ideia de transformar a Buba, uma personagem intersexo, em transgênero, é amplificar mais a questão de gênero, trazer pra dentro da história e poder falar disso – Bruno Luperi
Vem aí
Depois do sucesso de ‘Pantanal’, Bruno espera que o público abrace ‘Renascer‘ com o mesmo afeto. “Queria que ‘Pantanal‘ fosse bem recebido pelo público, mas não imaginei que o carinho fosse ser tão grande, até imaginei que pudesse gerar conflitos com o espectador mais saudosista, e foi muito bom porque aconteceu o que meu coração esperava, agradou as pessoas que assistiram a primeira versão, homenageou todo aquele trabalho, nunca competiu com a história, nem quis ser maior. As histórias bem escritas não precisam de um novo autor. Meu trabalho é adequar ao nosso tempo, revisitar todas as tramas, contar uma história bonita de novo. Nada além disso. Então, a expectativa para ‘Renascer’ é fazer também um trabalho bom. A gente não sai de casa para fazer um trabalho ruim”.
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