*Por Brunna Condini
Um ano após o primeiro registro de Covid-19 no Brasil, a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) ainda é de ficarmos mais em casa do que na rua, ou seja, de continuar com o distanciamento social e com as precauções para evitar a propagação do vírus. É nesse cenário, que os realities show vêm bombando no interesse e audiência. Vide o sucesso de a 12ª edição de ‘A Fazenda’, que foi ao ar em 2020, superando em 60% a audiência da atração no ano anterior. E claro, destaque para a atual edição do Big Brother Brasil 21, que também vem fazendo bonito nos números: as três primeiras semanas (21 dias) superaram a média de audiência no acumulado das oito edições anteriores em São Paulo (27 pontos de audiência e 47% de participação). No Rio de Janeiro, as três primeiras semanas do BBB superaram a média de audiência e participação das cinco edições anteriores (27 de audiência e 48% de participação).
Sim, o BBB 21 ainda está na terceira semana e já vem rendendo pautas para lá de polêmicas. Mas qual o motivo de brigas, desentendimentos, conflitos, o melhor e o pior da vida alheia – e quando pensamos neste BBB, tem muito do pior – atrai tantas pessoas como observação e pauta? O que causa essa mobilização em torno de um reality, principalmente no Brasil? “O primeiro fator que explica o sucesso dos realities shows é que todos nós gostamos de saber da vida dos outros. Tanto das pessoas comuns, quanto das celebridades. E o reality acaba estabelecendo uma relação de mistura entre realidade e ficção muito forte, entre comportamentos naturais e a artificialidade provocada pelas câmeras”, esclarece Valmir Moratelli, pesquisador e especialista em audiovisual e teledramaturgia.
“O público nestas duas décadas da entrada do gênero no país – falo pensando muito desde o início do Big Brother que é o reality mais popular e forte na nossa cabeça – acabou aprendendo a se divertir com essas contradições todas. E também começou a detectar os comportamentos que nem sempre são naturais nos participantes, então há uma relação muito forte também entre o reality e o voyeurismo. E quando falamos de voyer, entre vários significados, é aquela pessoa que tem curiosidade ao que é privativo, íntimo, fechado. Assistir a um reality é uma forma segura de ter acesso às experiências e informações que de outra forma seriam inacessíveis, ilegais. Ninguém vai poder assistir a uma pessoa tomando banho, dormindo, dentro de uma festa privada, se não for em um reality. A não ser que seja consentido. Gostamos de assistir, observar e também ser vistos. Acho que esse é o motivo número um para o sucesso do formato”.
Mobilização e engajamento
Mas esse interesse todo no BBB21 nem sempre vem gerando entretenimento sadio para o telespectador. Entre os participantes muitas brigas, falta de escuta, intolerância, violência psicológica, ‘ameaças’ de cancelamento. Uma pesquisa realizada pela Hibou, empresa de monitoramento de mercado e consumo, indica que os temas no reality show tem incomodado e despertado ‘gatilhos’. Mas por que a opção de continuar consumindo? Moratelli segue seu raciocínio, tentando analisar o interesse pelo formato, mesmo quando ele não ‘entrega’ muito do que promete. “Outro fator de sucesso, ao meu ver, é que por ser uma forma engessada, como uma novela, não muda muito sua fórmula. Então, onde é possível surpreender o público? Quebrar um pouco essa moldura fixa? Na seleção dos participantes. Nesta edição do BBB, como já falamos, têm mais diversidade e também tentaram na escalação não se render aos padrões estéticos. Mas, no geral, as emissoras dependem da empatia e da química que pode ter entre público e participantes. Então o segundo ponto seria essa questão da renovação entre os participantes”, opina o especialista.
“O terceiro lugar, tem o ponto da interação e do engajamento virtual. As redes sociais são quase que como um reality também. Quem acompanha e produz conteúdo para histórias no Instagram está fazendo seu próprio reality. A vida comum da pessoa colocada nas redes sociais, acaba sendo um show também. Cada um pode fazer seu reality, a diferença é que nas redes você escolhe o que vai ser exposto da sua vida, o que quer mostrar. Na TV, é a produção que seleciona. a inteiração e engajamento virtual são fortes porque promovem a possibilidade de extensão do que está acontecendo na TV. O programa não acaba quando acaba a exibição na televisão”.
Ainda sobre o interesse da população no formato, ele completa: “Tem o quarto fator, e talvez o mais polêmico, que deixei propositalmente para o final, que é a questão da alienação. O Big Brother Brasil e outros programas são muito acusados de serem programas alienantes. Em parte, concordo com isso. Mas é importante ser cuidadoso ao colocar a questão da alienação, para não parecer algo pejorativo. Nós assistimos o BBB para nos mantermos afastados de nós mesmos e, por algum momento, afastados do mundo. Não é fácil lidar com as questões da vida o tempo todo, da violência urbana, de tudo que está acontecendo com a pandemia. Antes dela, já convivíamos com assuntos espinhosos no país. Ao consumir a vida dos outros, dentro de uma suposta realidade, na tela da TV, parece que por um momento, estamos desviando dos nossos próprios problemas. A gente ‘adora’ odiar a Lumena e o Projota, por exemplo. É como dar um respiro em meio à tanta tragédia da vida real. Transferimos momentaneamente os nossos afetos para o programa. Infelizmente, não conseguimos ainda eliminar a homofobia e o racismo do nosso cotidiano, mas dá para eliminar os racistas e os homofóbicos do programa. Assistindo a atração, temos maiores condições de lidar com aquela realidade ali dentro, mais facilmente manipulável”.
“Certa vez, entrevistei o Pedro Bial sobre o programa e ele disse: “O Big Brother é tão importante quanto ler Graciliano Ramos”. Isso gerou um ti ti ti, os letrados chatos de plantão se ofenderam, dizendo que Graciliano estava acima disso tudo. Mas é a mais pura verdade. Acompanhar o BBB é uma experiência muito próxima de ver um filme do Woody Allen, ler Machado de Assis ou Graciliano, ou ainda, assistir a uma live da Maria Bethânia, como teve esses dias. O ser humano precisa se desligar da realidade e daí recorre a essas simulações fajutas que a TV propõe como realidade”.
Banalização dos realities show?
O gênero show tem se mostrado nos últimos anos cada vez mais diversificado e, ao que parece, uma fonte ainda bem frutífera de entretenimento para o espectador. “Ultimamente tem surgido reality de tudo, vide o Big Brother Brasil que já chegou na vigésima primeira edição, ‘A Fazenda’, na décima segunda, com ótimos índices de audiência, ao contrário das anteriores, muito por causa da pandemia também. Tem reality de gastronomia, como desdobramentos do MasterChef Brasil, de doces, de tortas salgadas. Tem para solteiros, ‘De férias com o ex’, que compete com ‘Soltos em Floripa’. Para casados, para reforma de casas. Outro dia vi um reality que era uma competição entre casais que compram casas ao redor de lagos, nos Estados Unidos. Olha que coisa específica. Tem o RuPaul’s Drag Race é um reality show, de drags, que caiu nas graças do público além LGBTQIA+. E agora tem o da Anitta, patrocinado em tempo recorde desde que ela teve a ideia, por uma marca de cerveja. Tem um aquecimento de mercado para as produções de reality show. E quando falamos isso, é bom entendermos como um gênero dentro da programação televisiva que pressupõe documentar um improviso da vida real. Para que ele possa ser considerado como tal, não pode ter um roteiro fixo, como por exemplo tem uma ficção”, observa Moratelli. “A Anitta, por exemplo, acabou de criar o seu, levando as pessoas para uma ilha, aproveitando uma brincadeira sua de ser telespectadora do gênero. Saiu na imprensa há pouco tempo também, que o Enzo Celulari e o Gabriel Davi, também estavam criando um. Tem o Carlinhos Maia, em Alagoas, criando com personagens da Vila e ainda colocando mulheres como ele diz “gostosonas”.
Mas por que os famosos estão também querendo criar seus próprios realities? “Primeiro pela questão financeira, têm empresas querendo patrocinar. Existe mercado para isso. E a segunda questão, é a visibilidade. Têm pessoas querendo exibir sua vida e gente querendo assistir, é a questão da inteiração. A Anitta fazendo um reality para ela, por exemplo, não precisa mais de uma emissora de TV, ela tem canal no Youtube, Instagram, passa a ser produtora de um programa”, encerra o pesquisador.
Paredão com aposta certa
Nesta terça-feira (16) vai ao ar no BBB21 o resultado do terceiro paredão do programa. A disputa está entre Sarah, indicada por Karol Conká, a líder da semana, e Nego Di, puxado no ‘contra-golpe’ por Sarah para a berlinda. Completa o trio na disputa, o ator e cantor Fiuk. Várias enquetes na internet apontam a saída de Nego Di com o maior índice de rejeição da atração. O humorista tem sido criticado após excluir Lucas Penteado (que saiu do jogo) junto com Karol Conká, Projota e Lumena. Aliás, por suas atitudes, o grupo vem sendo colocado no posto de ‘vilões’ do jogo. Ao contrário de Gilberto, Sarah e Juliette, que ganham cada vez mais a empatia e simpatia do espectador. Mesmo que Gil, no intuito de ser ‘aceito’ pelos demais, venha ‘escorregando’ nos posicionamentos por conta da instabilidade emocional, ainda é um dos favoritos nas redes. Aguardemos as cenas dos próximos capítulos.
Artigos relacionados