‘Atualmente, os melhores filmes brasileiros são feitos no Nordeste’, acredita a atriz Suzy Lopes


Aos 40 anos, a paraibana, que ingressou no cinema há apenas nove anos e está em duas produções no Festival do Rio, acumula participações em histórias filmadas na região ou por cineastas nordestinos, como ‘Bacurau’ e ‘Divino Amor’, entre outras

*Por Jeff Lessa

Em 1996, ao vencer o Festival de Brasília, o longa “Baile Perfumado”, de Lírio Ferreira e Paulo Caldas, tornou-se imediatamente um marco do cinema brasileiro. Mas antes de “brasileiro”, o filme pode ser considerado um marco da cinematografia nordestina que, de lá para cá, não saiu mais da mira da crítica e do público que acompanha mais atentamente a produção made in Brazil. Só neste ano, o longa “Divino Amor” foi selecionado para os festivais de Sundance e Berlim, onde também se destacou “Estou Me Guardando Para Quando o Carnaval Chegar” – os dois foram produzidos em Pernambuco. O também pernambucano “Bacurau” e o cearense “A Vida Invisível” brilharam em Cannes. “Pacarrete”, do Ceará, levou oito Kikitos (inclusive o de melhor filme) no Festival de Gramado, de onde também saiu vencedor o curta pernambucano “Marie”. E isso é apenas uma amostra.

A atriz atua no cinema desde 2010, embora já tenha 24 anos de carreira (Foto de Pedro Garrido)

É nesse vitorioso cinema nordestino que a atriz e produtora paraibana Suzy Lopes vem se destacando como uma das mais ativas de sua geração. Neste ano, já participou dos elencos de “Bacurau”, de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornellas, “Divino Amor” (PE), de Gabriel Mascaro, “Sol Alegria”, de Tavinho Teixeira, “Beiço de Estrada”, de Eliezer Rolim, e “Ambiente Familiar”, de Torquato Joel (paraibanos). Suzy também está em dois filmes selecionados para o Festival do Rio deste ano: “A Febre”, de Maya Da-rin, que teve quatro exibições ao longo dos 10 dias do evento, e “Fim de Festa”, do premiado cineasta e roteirista pernambucano Hilton Lacerda, que teve pré-estreia no domingo (15) e foi exibido nesta terça (17), no Kinoplex São Luiz 1.

A atriz em cena de 'Bacurau', que brilhou em Cannes neste ano (Foto de Victor Jucá)

A atriz em cena de ‘Bacurau’, que brilhou em Cannes neste ano (Foto de Victor Jucá)

Fim de Festa” se passa entre a Quarta-Feira de Cinzas e o domingo pós-carnaval no Recife, quando a cidade é abalada pelo assassinato de uma turista francesa. Suzy, que completou 40 anos em março, interpreta Alice, mãe do jovem casado com a estrangeira, autoritária e extremamente arrogante, que faz de tudo para salvar o filho de um destino infeliz. O filme é uma alegoria da ressaca em que o Brasil mergulhou depois do período de entusiasmo que desaguou nas manifestações de rua de 2013 e no traumático impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Alice é o tipo de pessoa que impõe suas vontades falando alto e abrindo caminho à força, passando por cima de quem for para “chegar lá”. Um tipo bastante comum nos dias que correm, aliás.

Em ‘Fim de Festa’, de Hilton Lacerda, ela vive Alice, uma mulher arrogante e impositiva (Foto de Victor Jucá)

“Adivinha em quem ela votou nas últimas eleições”, pergunta a atriz, brincando, logo depois da exibição do filme, no Shopping da Gávea. “Hilton dirige com muita parceria e cumplicidade no sentido de entregar a cena à atriz ou ao ator. Ele aposta na intuição da gente e se diverte junto. Alice é um presente. As personagens me encantam mais à medida que se distanciam de mim. Assim que conheci Alice, a achei tão absurda, tão distante. Mas tudo que fez na vida inteira foi legítimo, ela tentou viver bem. Tentou, mesmo que por vias duvidosas, sobreviver da forma mais digna possível. Como todas as mães, tentou extrair o melhor da vida para seu filho, mesmo que muitas vezes tenha escolhido o caminho errado, ou não correto. Tudo sempre fez sentido para ela”.

Segundo Suzy, ‘A Febre’, de Maya Da-rin não é panfletário ao tratar da questão indígena (Foto Pedro Garrido)

Em “A Febre”, Suzy foi dirigida pela primeira vez por uma mulher desde que ingressou no cinema, em 2010, quando participou do elenco do filme “Era Uma Vez Eu, Verônica”, do cineasta pernambucano Marcelo Gomes. “Esse projeto é muito importante para mim, pois traz à tona e bota na roda as questões indígenas sem ser panfletário. Tentamos fazer com que a sociedade, ou parte dela, se sensibilize com o povo indígena, que há 519 anos é massacrado, roubado e desrespeitado”, explica. “A verdadeira família tradicional brasileira é indígena”.

Susy Lopes chegou a praticar aeróbica e balé no Teatro Santa Roza, em João Pessoa, mas sua paixão era mesmo atuar. Quem descobriu isso foi a mãe da atriz, que a matriculou, quando a menina tinha 15 anos, num curso de teatro. “Eu não entendia porque que minha mãe tinha feito sem me perguntar se eu queria fazer”, contou Suzy em uma entrevista, revelando que sua intenção era ser psicóloga.

‘Nos festivais a que tenho ido, temos a certeza que vamos seguir em frente”, afirma Suzy Lopes (Foto de Pedro Garrido)

Em 1998, ela entrou para a companhia Rataplan, onde permaneceu por quase dez anos. Foi um tempo de muita animação de festas e eventos, quando aprendeu a improvisar em qualquer situação, encarando os inevitáveis – e, muitas vezes, hilários – imprevistos do teatro. Formada em pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), fez mestrado na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), em que abordou o teatro paraibano dos anos 1990. Deu para sentir que Suzy é apaixonada pelo Nordeste, não?

“Tenho orgulho de ser nordestina. Por tudo que esse país deve culturalmente e historicamente aos nordestinos. Me sinto muito privilegiada na vida por ter sido dirigida por Marcelo Gomes, Hilton Lacerda, Kleber Mendonça Filho, Juliano Dornelles, Gabriel Mascaro, Fellipe Fernandes, Rodolpho de Barros, Tavinho Teixeira, Diego Lima… Todos nordestinos. Acredito que, atualmente, na cinematografia brasileira, os melhores filmes são feitos no Nordeste”.