Duas décadas, atrasos, problemas e polêmicas. Esses foram alguns dos contratempos de Guilherme Fontes ao rodar “Chatô, o rei do Brasil”. A história do livro de Fernando Morais, que teve seus direitos comprados pelo ator e diretor em 1994, virou parte da história indústria cinematográfica brasileira antes mesmo de estrear e, agora, chega ao público mundial na 20ª edição do Brazilian Film Festival of Miami. “É a primeira vez que participamos de um festival internacional. O filme vai para a Espanha e Canadá em outros festivais e é uma sensação incrível, porque uma das três narrativas foi transformada em TV show e nasceu aqui. Então, de alguma forma ou de outra, há um pé americano nesse roteiro”, explicou Guilherme, que, agora, lança seu projeto na plataforma digital Netflix. “Quando estreamos eu jamais pensei ser tão elogiado. Nunca fui, como ator, como fui como diretor. Digamos que fiquei três meses em cartaz, em 30 cidades. Aí a Netflix apareceu encantada com o longa e fez a proposta para todas as janelas de exibição. Então foi invertido: a Netflix foi na frente. Achei que seria a melhor maneira de o filme ser visto o mais rápido possível por todos, me apaixonei pela Netflix, foi incrível”, contou. O desfecho do casamento? “Netflix mundial exibe o filme a partir de 1o de outubro. Sei que quebro muitas janelas no mundo, mas é muita gente e essa é a maneira mais eficiente, rápida e sob meu controle de vender o filme”, defendeu.
E afinal, o que aconteceu durante os anos de produção? “Foi o seguinte: eu comprei o livro há vinte anos, comecei a produzir o filme como uma série multimídia, talvez uma das primeiras do Brasil, que teria documentário, seriado e o longa. Começou em 1999 a produção do longa e foi lançado em novembro de 2015. Foram 16 anos. Ao longo deles tiveram 3 filmagens: em 1999, 2002 e 2004, mas foi finalizado efetivamente agora”, explicou ele, que foi além: “Eu sou ator, conhecido há anos no Brasil. Adiciona isso ao homem que trouxe a televisão para o país e ao fato de eu estar produzindo um filme de 12 milhões de dólares em um momento que o Brasil produzia de 1 a 2 milhões. Desde o começo fui motivo de cobiça, intrigas, invejas… e a produção de notícias foi incontrolável desde o primeiro dia. Tanto falando bem – durante os três primeiros anos – quanto mal”, disse. O motivo das fofocas? “Na véspera de iniciar as filmagens o governo me chamou e disse que tinha que fazer meu filme… mas eu ainda não tinha levantado todo o recurso que precisava e o governo disse que tomaria meu dinheiro. Então comecei a filmar sem todo recurso… quando não tinha mais para continuar me usaram de bode expiatório pra justificar a ineficiência das leis de incentivo na época. Enfim, misturou tudo com passionalidade. Digo sempre que se eu escrevesse um título pra essa produção seria ‘O crime não foi tributário, foi passional’”, declarou.
Pois bem, como não poderia deixar de ser… a distribuição também foi rodeada de polêmicas. “Pequei porque resolvi distribuir sozinho. Apresentei o filme, mas não gostei das propostas sem segurança de retorno. Optei por dirigir e distribuir. Sempre achei interessante ir até o fim. Não me dei bem na distribuição das salas, resolvi lançar no dia de ‘Jogos vorazes’, o maior blockbuster do Brasil. Aí coloquei ‘Chatô’ em 100 salas, uma coisa possível. Adoraram, fiquei encantado e resolvi ir direto, eu e exibidores. Minha estratégia não deu tão certo. Mas o mais importante agora é que haja reconhecimento do filme. Eu estreei em São Paulo e uma hora depois estava ovacionado nos jornais, algo que jamais esperei. Por mais que sonhemos em ter críticas boas, não pensei que seria assim”, disse.
Agora, ao final de uma “saga” bem-sucedida, Guilherme já tem novos planos. “Juntando esses pedaços de mim que sobraram nos últimos anos vou reabrir a produtora, fazer documentários em séries e imediatamente vou fazer um filme de terror e outro de religião. Bem simples, falando sobre a religião no futuro, seu impacto e como se transformou após 20 anos de um meteoro bater no Rio de Janeiro. Passa-se em Copacabana, conta a história de um bastardo que, para ter a graça divina, precisava ser reconhecido pelo pai e a única maneira é que o irmão morresse. É um roteiro meu”, adiantou ele, que faz questão de dizer: “Tenho vários projetos na cabeça: um sobre o resultado da UPP no Rio que mistura um pouco com a Lava-Jato. O outro é serie de TV…”.
E será que o financiamento será, novamente, um problema na vida de Guilherme? “Apareceram novas formas de financiamento direito, já está provado que o cinema bem organizado dá lucro. As distribuidoras ganham dinheiro. O resultado está proporcionando a sobrevida das empresas. O problema é que as políticas são voltadas para os filmes, não para as empresas que o fazem. Quando financiamos a agricultura, estamos preocupados com o agricultor. Acho que falta isso com o cineasta. Mas tem melhorado lentamente”, defendeu.
E, afinal, quando os fãs poderão ver Guilherme do lado de lá das telinhas novamente? “Em 2017 no canal Space. Fiz uma série chamada ‘A lei’, criada pelo argentino Patrício Veja, com direção do uruguaio Adrián Caetano e do brasileiro Tomás Portella”, adiantou ele, que viverá um “apresentador inescrupuloso de televisão que se transforma em político”. “Foi a primeira vez que eu trabalhei fora da TV Globo. Fui muito bem tratado, muito feliz. O futuro está aí, nesses programas mais fechados. Depois de um tempo a ideia da novela é boa, mas, para o ator, é frustrante não saber o final de seu personagem. Eu sempre gostei de histórias fechadas”, disse.
E será que isso significa um ponto final na carreira de Guilherme nas novelas? “Pagando bem, que mal tem? Se o personagem for bom, claro que vou topar, na hora. Acho que um personagem por ano é mais do que suficiente”. Palavras de quem, aos 33 anos de profissão, sabe: “Felicidade são passagens. Sou feliz por momentos. Estou realizado. A vida é curta, vamos aproveitar o que há de melhor. Uma das frases em relação a minha profissão é ‘dedicado a criação de clássicos’. É disso que o artista precisa: algo que fique. Não trinta que joguem no lixo”.
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