* Por Carlos Lima Costa
Um dos maiores nomes da teledramaturgia, o ator Francisco Cuoco, 88 anos, está de volta à televisão através da reprise de Pecado Capital. A trama, que originalmente estreou em novembro de 1975, onde ele interpreta o motorista de táxi Carlão, acaba de entrar no catálogo do Globoplay por conta do projeto que resgata novelas clássicas. “Ele está entre os melhores personagens da minha vida. Era um homem bom, simples, do povo, com comportamento e valores próprios onde prevaleciam o amor ao trabalho e o espírito de união”, relembra emocionado.
E acrescenta que se identifica com o personagem no senso de justiça, com a trajetória e os sonhos buscados: “Eu e o Carlão tínhamos uma ligação com o volante, por exemplo. Em um determinado momento da minha vida, cheguei a dirigir um caminhão indo trabalhar em uma feira livre com meu pai”.
Há um ano, no programa Conversa Com Bial, o ator surpreendeu o público ao revelar que havia desenvolvido uma depressão durante a pandemia. Mas foi se recuperando com ajuda dos três filhos. “Foi devagarinho. Acho que hoje em dia estou bem melhor”, disse. Na mesma entrevista, falou sobre o desejo de voltar ao trabalho: “Eu gostaria de em algum momento estar fazendo novela novamente. Acho que ainda tenho o vigor para isso”, afirmou. No meio do ano, queixou-se de um problema na lombar. Vinha até usando bengala para ajudar na locomoção.
Na metade dos anos 70, Cuoco dividia todas as atenções com Tarcísio Meira (1935-2021). Os dois eram considerados os maiores galãs da TV. Na época, até o comportamento das fãs era mais enlouquecido. “Era algo que ecoava forte. Procurei sempre atendê-las. Mas teve momentos em que eu evitava para não parar a cidade. Mas era realmente extraordinário”, frisou recentemente no Altas Horas.Triste com a partida do amigo, dois dias após a morte de Tarcísio, em agosto do ano passado, Cuoco o homenageou postando no Instagram uma foto deles com Chico Anysio (1931-2012). “A vida me ensinou a dizer adeus às pessoas que amo, sem tirá-las do meu coração”, escreveu Cuoco, que começou a ser chamado de galã durante a novela Redenção, da Excelsior, exibida entre 1966 e 1968. “Interpretei o doutor. Fernando, a mocinha era Miriam Mehler. Foram 596 capítulos, dois anos no ar. Por isso que estou assim caído”, brinca.
Em Pecado Capital, Carlão era um motorista de táxi de bom coração, mas que começou a viver uma crise de consciência depois que assaltantes em fuga esqueceram dinheiro roubado em seu veículo. Ficou em dúvida entre usar o dinheiro para resolver os próprios problemas ou entregá-lo à polícia. Na história, Carlão é noivo de Lucinha (Betty Faria), funcionária de uma fábrica de confecções do industrial Salviano Lisboa, interpretado por Lima Duarte. Ela acaba escolhida para campanha publicitária, faz sucesso como modelo e se envolve com Salviano. Estava criado o triângulo amoroso.
E, para provar a ex que pode competir com o empresário, ele gasta parte do dinheiro encontrado no seu carro comprando uma frota de táxi. “Espero que a novela seja apreciada pelo público. A Janete Clair (1925-1983) escrevia capítulos com boas indicações e o público se vê refletido nas tramas e personagens como um espelho. O dilema moral cria uma grande dúvida dentro do espírito de retidão do Carlão e conseguimos passar essa dúvida para o público”, ressalta Cuoco, que no remake, em 1998, interpretou Salviano Lisboa.
Betty Faria e Francisco Cuoco estiveram juntos no ano passado para as gravações do especial 70 anos de novelas na Globo. A atriz relembrou a parceria com Cuoco. “Nós somos muito amigos, a gente se quer muito bem. Nunca namoramos, acho que por isso somos amigos até hoje. Não rolou nada”. A novela Boogie Oogie, entre 2014/2015, marcou o mais recente encontro deles em cena como um casal, quase 40 anos depois de fazerem par em Pecado Capital.
O tema de abertura de Pecado Capital, homônimo ao título da novela, foi um capítulo a parte: “Dinheiro na mão é vendaval/É vendaval/Na vida de um sonhador/De um sonhador/Quanta gente aí se engana/E cai da cama/Com toda a ilusão que sonhou/E a grandeza se desfaz/Quando a solidão é mais/Alguém já falou/Mas é preciso viver/E viver não é brincadeira não/Quando o jeito é se virar/Cada um trata de si/Irmão desconhece irmão/E aí dinheiro na mão é vendaval/Dinheiro na mão é solução/E solidão”, dizia parte dos versos compostos e cantados por Paulinho da Viola, que até hoje estão no imaginário brasileiro. Quem viveu a época, recorda bem que a novela foi um grande sucesso, mesmo tendo sido feita às pressas, em situação de emergência, quando a censura vetou a exibição de Roque Santeiro.
Naquela década 70, Cuoco estabeleceu uma parceria com a autora, sendo protagonista de inúmeras tramas escritas por ela e vivendo os personagens mais memoráveis de sua carreira na televisão. O primeiro deles foi Cristiano Vilhena, em Selva de Pedra (1972/1973). Depois vieram Alex Garcia, em O Semideus (1973/1974); Carlão, de Pecado Capital (1975/1976); Victor Amadeu, em Duas Vidas (1976/1977); Herculano Quintanilha, em O Astro(1977/1978); Tião Bento de Sétimo Sentido (1982); e Lucas Cantomaia, em Eu Prometo (1982/1984), última novela feita por Janete, que escreveu somente até o capítulo 60. Ela lutava contra um câncer de intestino e morreu em 16 de novembro de 1983. Gloria Perez ficou encarregada de terminar a novela, sob a supervisão de Dias Gomes (1922-1999), viúvo de Janete. A novela contava ainda com nomes como Milton Gonçalves, Rosamaria Murtinho, Elizangela e Marco Nanini.
Nessa fase como galã, Francisco Cuoco, como outros artistas da época gravaram compactos. No caso, de Cuoco, ele declamava as letras como em Amo, de 1974. Mais maduro, no início dos anos 2000, mostrou a voz potente cantando As Rosas Não Falam, de Cartola (1908-1980), no Altas Horas. “Eu poderia ter sido cantor, mas não estudei, aí fui fazer teatro. Fiz 4 anos de Escola e Arte Dramática e depois sete anos ao lado da Fernanda Montenegro (eles trabalharam juntos na companhia Teatro dos Sete)”, lembrou este ano para Serginho Groisman.
No programa, recordou ainda a mistura de estudo e emoção que empregava nos personagens. “É uma carga que você vai carregando a medida que vai desenvolvendo um trabalho com a impressão de que nunca está totalmente pronto, sempre arriscando, sempre tentando, carregando uma emoção extraordinária, porque você sabe que por incrível que pareça muita coisa que eu fiz eu já nem lembro mais, porque já ficou para trás, esquecido mesmo, foi realizado, a alma foi transferida”, disparou ele, que falou ainda sobre os beijos serem técnicos ou reais. “Diria que realmente acontece, é tudo fingido, ao menos que haja uma relação amorosa casualmente entre o casal que está participando. Foi assim, sempre”, comentou o ator.
Nos tempos atuais, é um defensor da vacina contra a Covid-19. “Dia de tomar a segunda dose. Obrigado aos cientistas pela grande descoberta. Vamos tomar para (chegar) o fim da pandemia”, postou em março do ano passado, Cuoco, que nos últimos anos atuou em novelas como Passione, Amor À Vida, Sol Nascente, Segundo Sol, e Salve-se Quem Puder, a mais recente , em 2020, quando fez uma participação como ele mesmo.
Cuoco atravessou várias fases na televisão, participando até mesmo da TV ao vivo, com o Grande Teatro Tupi, teleteatro idealizado por Sérgio Britto (1923-2011). “Ensaiávamos a semana toda, após o teatro, para na segunda-feira, quando não tínhamos teatro, mas apresentávamos uma peça em 3 atos”, disse.
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