*Por Jeff Lessa
O ator Rodrigo Pandolfo vive um momento iluminado em sua carreira. Além de brilhar pela terceira vez em sete anos como Juliano, o filho de Dona Hermínia no mega sucesso “Minha Mãe É Uma Peça 3”, que acabou de se tornar a maior bilheteria do cinema nacional de todos os tempos com arrecadação recorde de R$ 137,9 milhões, o ator gaúcho de 35 anos planeja montar a peça argentina “Heróis que Não Aterrissam”, passada na época da Guerra das Malvinas. Tem mais: “Neste primeiro semestre vou fazer a codireção de um espetáculo chamado ‘Alaska’, junto com meu amigo-irmão Pablo Sanábio. É um projeto idealizado pelo Eduardo Sterblitch e pela mulher dele, Louise D’Tuani, que também está no elenco com o Leonardo Brício”, conta. Vindo também do sucesso da minissérie “Chacrinha”, exibida recentemente pela TV Globo, em que interpretou o filho de um dos apresentadores mais emblemáticos do Brasil, Pandolfo fala, nesta entrevista exclusiva para o site Heloisa Tolipan, sobre sua relação com as redes sociais, a amizade com a atriz Mariana Xavier, que vive sua irmã em “Minha Mãe É Uma Peça”, a fama adquirida com o sucesso da trilogia e o momento difícil para as artes no Brasil, entre outros assuntos. Confira.
Site Heloisa Tolipan: Você foi indicado ao Prêmio Shell com 23 anos por seu papel na peça “Cine-Teatro Limite”, dirigida por Pedro Brício e Sergio Módena em 2006, e disse que essa distinção, além de uma alegria, pode ser, também, um peso. Por quê?
Rodrigo Pandolfo: Porque para um ator tão jovem uma indicação a um prêmio relevante como esse traz uma grande pressão para realizar apenas trabalhos à altura e não deixar a peteca cair jamais. Por um lado, é um excelente meio de se superar… por outro, porém, é um peso desnecessário.
HT: Como se sente “crescendo” diante do público como o Juliano de “Minha Mãe É Uma Peça”? Afinal, de três em três anos, desde 2013, você tem retomado o papel do filho de Dona Hermínia na tela…
RP: É maravilhoso fazer parte de uma trilogia de sucesso. O público vem se aproximando de mim cada vez com mais carinho. Agora, com o terceiro filme, tenho sido abordado com muito afeto e recebido mensagens emocionantes pelas redes sociais. É um momento marcante da minha carreira.
HT: Tem receio de que esse papel ofusque seus outros trabalhos aos olhos do público?
RP: Já pensei bastante sobre isso, mas não acredito. Eu já tinha uma carreira sólida antes da trilogia, com papéis bem distintos do Juliano. E continuo tendo. Claro, este é meu trabalho mais popular, mas a vida é longa. Daqui a pouco, qualquer possível estigma se dilui.
HT: Ainda concorda com o Paulo Gustavo que nas cenas do casamento do Juliano com o Thiago (Lucas Cordeiro) em “Minha Mãe É Uma Peça 3” não deveria mesmo haver beijo entre os noivos?
RP: Não concordo nem discordo. Os autores escreveram assim e eu realizei. O filme ficou lindo, sensível, orgânico.
HT: O que acha possível fazer para mudar a atitude da sociedade em relação à homofobia e a outros preconceitos arraigados, como racismo e machismo?
RP: O filme mostra isso: dois caras legais num relacionamento homoafetivo. Ou seja, o que podemos fazer é exatamente o que estamos fazendo: tratando a questão de forma natural. Acontece um casamento ali e essa é a maneira mais clara possível de expor uma relação de amor, seja ela homoafetiva ou não. O que acho curioso é o fato de um selinho gay (já visto tantas vezes, nenhuma novidade) tornar-se mais relevante que a união, o casamento em si.
HT: Já foi maltratado por conta de preconceito em sua vida?
RP: Na escola, quase todos nós sofremos em algum nível. Comigo não foi diferente. Eu já era artista desde criança. Cantava, fazia piada, tocava o Hino Nacional no piano para a escola inteira cantar. Ou seja, eu não fazia parte da massa. E tudo o que é diferente assusta. Até você se aproximar e perceber que o diferente não vai te atacar. Muito pelo contrário, vai somar.
HT: Acredita que a franquia tem fôlego para um quarto filme?
RP: Não haverá um quarto filme. Teoricamente, a trilogia acaba aqui. O que vai existir é uma série para a Globoplay. Com esse sucesso, fôlego é o que não falta.
HT: Você e a atriz Mariana Xavier se conhecem desde muito antes de interpretarem os filhos de Dona Hermínia. Como essa amizade começou?
RP: Eu e Mariana nos conhecemos num curso de interpretação para TV em 2014. Nos identificamos de cara e ali mesmo ficamos muito amigos. Logo em seguida, ela me convidou para substituir um ator num espetáculo que estava fazendo… e eu fui. Por ironia do destino, éramos irmãos em cena. Nunca perdemos o contato, mas reconectamos nosso elo no “Minha Mãe…”. Amo a Mari. Somos amigos, cúmplices, irmãos de alma.
HT: O trabalho na trilogia “Minha Mãe É Uma Peça” afetou o seu cotidiano?
RP: Sem dúvida. Foi o produto mais popular que eu já fiz. E a cada filme a popularidade foi aumentando, as pessoas foram me abordando mais e eu fui aprendendo a receber esse carinho. Quando saio na rua tenho a impressão de encontrar colegas da escola nas esquinas, primos na padaria, avós no supermercado, vizinhos no parque… me sinto em família. Existe um elo de ligação entre o público e nós atores. É bonito demais.
HT: A peça “Heróis que Não Aterrissam” trata de guerra, um assunto que, infelizmente, tem se aproximado do imaginário dos brasileiros nos últimos tempos. Em que medida o projeto tem a ver com o momento atual do país?
RP: Tem tudo a ver. Não à toa eu escolhi esse texto para ser meu próximo projeto no teatro. Não consigo entender, muito menos acreditar, que chegamos neste Brasil tão dividido. Quando penso na história da humanidade, percebo que a Segunda Guerra foi ontem e que o tempo é mesmo muito relativo, pois me parece que ainda existe (e talvez nunca deixe de existir) uma onda separatista, onde alguns valores são levados como verdade absoluta. Eu me pergunto: quem decidiu que fulano é melhor que sicrano? Que ordem foi essa, senão do próprio homem, que resolveu se colocar no centro de tudo, mais importante que todos os outros seres vivos, e, ainda por cima, criar suas regras equivocadas a respeito da humanidade, da sociedade, do bem e do mal, da moral, das relações e de todo sistema que vivemos? Existe no homem uma exagerada auto-exaltação do “eu”. Quando faço um paralelo com Jesus Cristo e penso que ele foi crucificado em praça pública pelos seus semelhantes, custo a acreditar que evoluímos muito, pois o que não falta é gente crucificada por aí. Então, como parte do meu propósito como ser humano e artista, escolhi falar da guerra e do quanto ela é traiçoeira, injusta, agressiva, traumatizante, “sequelante” e desnecessária. Ou seja, tudo de ruim. É inacreditável que tenhamos criado uma sociedade que desvalorize tanto o essencial e que se mate diariamente por dinheiro e poder. Está tudo errado. “Heróis que Não Aterrissam” é um grito de alerta com muita poesia e sensibilidade. Não é uma peça agressiva, muito pelo contrário. É uma ode à poesia e à vida.
HT: Como você chegou a essa peça?
RP: Passei 20 dias em Buenos Aires em fevereiro do ano passado. Fui de férias. Mas a intuição estava ligada em encontrar meu próximo projeto, pois, mesmo com a tirania, a vida teatral de Buenos Aires não deixa de existir e resiste bravamente, além de ser uma terra regada com excelentes autores jovens. E, assim, fiz meu papel: procurei interagir com a cena teatral da cidade, pedi indicações para amigos, procurei os melhores espetáculos na internet e fui fazendo a minha seleção. No penúltimo dia fui ver “Heróis que Não Aterrissam” num pequeno teatro de Almagro e fiquei estarrecido. A peça começou e eu quase não piscava. Fiquei descolado da cadeira, experimentando uma atenção rara de acontecer. Aquilo me pegou. Era um conjunto tão bom, um texto tão brilhante, atores tão geniais, um cenário tão lindo que, assim que acabou, saí perguntando quem tinha dirigido. Por sorte ou destino, a autora e também diretora da obra estava lá. Chama-se Pilar Ruiz, que esbanja sensibilidade, criatividade e ternura. Imediatamente eu expus meu desejo de montar o texto no Brasil e combinamos um café para o dia seguinte. E assim foi feito. Já havia um desejo antigo de dividir a cena com uma grande amiga, a Karen Coelho, que estudou comigo na escola de teatro. Ela será a minha parceira neste projeto, que vai ser dirigido pelo gênio Rodrigo Portella e produzido pelo Sérgio Saboya. A peça conta a história de um jovem artista que foi recrutado para lutar na Guerra das Malvinas pelo pai militar de sua noiva. Foi tido como morto pela família e volta dessa experiência terrível em que tudo se desintegrou, inclusive sua própria sanidade.
HT: Vamos falar sobre “Chacrinha”. Você chegou a conhecer o trabalho do apresentador? Trabalhar na série mexeu com a sua opinião a respeito dele de alguma maneira?
RP: Ainda muito jovem meu personagem, filho do Chacrinha, começa a trabalhar com o pai na produção de seus programas de televisão. Carrega em sua personalidade uma importante objetividade para assumir o cargo de administrador e produtor do pai. Na adolescência, sua relação com Chacrinha foi um tanto quanto dura, mas, ao longo dos anos, o carinho e a admiração mudaram esse panorama. O Chacrinha sempre foi um ícone. Eu cresci com sua figura no meu imaginário, mas quase não conhecia a história da vida dele. Com a série, pude mergulhar e entender mais a fundo a personalidade desse homem tão emblemático. A sua desenvoltura no palco, embora muito expansiva e brincalhona, já me sugeria a ideia de um cara com o pavio meio curto. E, de fato, esse era o Chacrinha. Em frente às câmeras, a alegria infantil tomava conta da sua performance, mas nos bastidores ele carregava um peso, não só por seu difícil temperamento, mas também por algumas passagens nada fáceis da sua história, como o acidente que levou Nanato, um de seus filhos gêmeos, a ficar paraplégico. Após o final do trabalho, o que ficou gravado em mim foi justamente o lado avesso do Velho Guerreiro: suas fragilidades, seus medos, suas inseguranças.
HT: Você sente algum temor em relação ao seu futuro como artista diante da realidade no país?
RP: Não só eu, como todos os artistas preocupados com cultura e produtividade. Mas eu sou do axé e gosto de cantar para subir. A vida é uma experiência maravilhosa, está sempre em movimento e tudo faz parte do pacote. Daqui a pouco a roda gira e o panorama muda completamente. Ao invés de lamentar, ando preferindo encarar os fatos como experiências e tento entender como posso tirar proveito. Afinal, tudo tem dois lados.
HT: Como é a sua relação com o universo virtual? Usa as redes sociais com frequência?
RP: Confesso que sempre tive uma certa dificuldade com as redes sociais. Gosto de ter Instagram, de divulgar meus trabalhos, trocar uma ideia com a galera. Mas ainda estou entendendo qual é o meu lugar de fala ali. Sinto dificuldade de expor o meu dia e dividir os meus passos com os seguidores, por exemplo, mas percebo que é isso que eles querem: intimidade. Então, estou no processo de fazer um acordo comigo mesmo e tentar abrir um pouco mais esse canal de comunicação com o público. E venho tendo um ótimo retorno. Afinal, o bicho papão do medo é criado por nós mesmos.
HT: Fala-se muito de gente que se informa através de Whats App e Twitter, o que estaria levando a uma imensa confusão gerada por fake news e desinformação. Como você se informa? Que fontes de informação julga confiáveis?
RP: Me informo através de telejornais e das redes sociais e, claro, caio, como todos, nas fake news. Mas, sabendo que elas existem, o importante é se certificar da veracidade do fato antes de sair espalhando notícia falsa por aí.
HT: Você costuma ler? Que tipo de leitura aprecia? O que costuma fazer nos momentos em que está livre de obrigações? Gosta de fazer exercícios físicos? De comer fora?
RP: Costumo ler, ir ao cinema, ao teatro, à praia, jantar com amigos. Não abandono os exercícios físicos, pois eles me salvam da minha ansiedade e melhoram a autoestima. E, sempre que possível, viajo. Entendi que a experiência de sair do nosso lugar comum é muito valiosa, um dos melhores investimentos pessoais… sobretudo se for possível aliar viagem e contato com a natureza. Isso cura tudo.
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