André Ramiro está em longa sobre descrença nos poderes constituídos, onde jogos escusos ocupam posição de destaque


Aos 40 anos, o ator vem rompendo barreiras e estigmas ao longo de sua carreira. Ficou conhecido do grande público ao Interpretar o policial André Matias, em Tropa de Elite. Agora, ele esteve na primeira temporada da série ‘Ilha de Ferro’, e acaba de encerrar as gravações do longa ‘Níobe’, do diretor Fernando Mamari. “Níobe trata da descrença da sociedade nos poderes constituídos do país, onde os jogos escusos parecem ocupar posição central em todas as bandeiras”, observa

Aos 40 anos, André Ramiro vem rompendo barreiras e estigmas ao longo de sua carreira (Foto: Camila Vedoveto)

*Por Rafael Moura

Aos 40 anos, André Ramiro vem rompendo barreiras e estigmas ao longo de sua carreira. O ator, que ficou conhecido por interpretar o policial André Matias, em Tropa de Elite, e esteve na primeira temporada da série ‘Ilha de Ferro‘, acaba de integrar o elenco do longa ‘Níobe’, do diretor Fernando Mamari, e já está às voltas com as filmagens do filme ‘Tração’. Nesse intervalo, conversou com o site Heloisa Tolipan e contou sobre essas experiências no mercado audiovisual e muito mais. “Níobe trata da descrença da sociedade nos poderes constituídos do país, onde os jogos escusos parecem ocupar posição central em todas as bandeiras”, observa.

O filme ‘Níobe‘ conta uma história que se passa em um único dia, quando um encontro promovido por um influente empresário reúne um presidente da República, seu mais graduado general, um deputado corrupto, seguranças e prostitutas de luxo. Em estilo noir, a obra se passa nos dias de hoje, porém contém elementos visuais dos anos 50, ambientando as escalas de poder numa sociedade em que algumas poucas pessoas podem decidir o futuro de milhares.

André Ramiro, o Chicão, no longa ‘Níobe’ (Foto: Carol Mamari)

André Ramiro, que vive Chicão, contracenou com nomes como Bárbara França, Timóteo Heiderick, Kadu Moliterno, Roberto Pirillo, Breno de Filippo, Charles Paraventi, Mario Hermeto. “Foi muito especial em vários sentidos. Nosso diretor, Fernando Mamari, além de uma pessoa incrível é um gênio. Seus filmes e roteiros ainda vão dar muito o que falar não só por serem bons, mas por suas mensagens, visão de mundo e sociedade. Foi um grande encontro e vou guardar no coração os momentos com nossos parceiros dessa equipe especial. Fazer cinema no Brasil é um ato de resistência, principalmente nos tempos atuais. Mas somos vencedores, estamos vivos e unidos”, pontua.

Como todas as vertentes culturais no mundo, as filmagens tiveram de ser adaptadas por conta dos casos de Covid-19, no Rio de Janeiro. “Apesar de boa parte da população estar vacinada, ainda estamos em meio a uma pandemia. Nossa preparação foi basicamente através das leituras individuais e análises do roteiro, com cada ator fazendo seu dever de casa. Fizemos reuniões por chamadas de vídeos entre nós e logo após com o Fernando para batermos as ideias. Ele foi muito atencioso com todo o elenco”, afirma.

André Ramiro em cena de ‘Níobe’ (Foto: Carol Mamari)

O ator fala sobre as instabilidades financeiras, principalmente no Brasil, em se trabalhar com arte. “O pouquíssimo incentivo para o audiovisual é um grande equivoco. É necessário que isso mude urgentemente. Está mais do que provado que o audiovisual brasileiro está no topo das indústrias que mais geram renda em nosso país. Representa empregos e o sustento de muitas famílias. Pobre e ignorante é o país que não faz da cultura sua aliada”, frisa.

Ramiro ainda acredita que a falta de educação financeira no mundo é um enorme problema e que é necessário que aprendamos a usar o dinheiro a nosso favor. “No Brasil, não somos educados a lidar com nosso dinheiro, isso explica muita coisa sobre essa ‘corrida de ratos’ que vivemos em um país capitalista. A consciência financeira é um despertar. Acredito que o dinheiro tenha muito a ver com energia. Por isso é necessário que saibamos usá-lo a nosso favor. A real é que estamos em meio a uma inflação enorme, os impostos aumentaram absurdamente e tudo está tão caro que mal conseguimos pagar as contas. No meu caso, como não sou assalariado e fazer cinema não deixa ninguém rico nesse país, tenho que agir com sabedoria quando o assunto é dinheiro. Estou sempre pensando em como diminuir gastos e custos tentando guardar 20% do que ganho sempre que possível. Não é nada fácil mas se tivermos consciência funciona”, explica.

‘A cultura hip hop foi minha primeira escola, levo seus ensinamentos para a vida’, diz André Ramiro(Foto: Carlos Sales)

Para quem não sabe, nosso entrevistado é rapper e manda muito bem no universo das rimas. E, apesar de estar mais atuante nas telas, ele nunca abandona o universo musical. “No final das contas, todas as artes convergem. A cultura hip hop foi minha primeira escola, meu primeiro amor, levo seus ensinamentos para a vida. Quando estou fazendo cinema, televisão ou teatro, naturalmente estou levando o hip hop comigo para esses ambientes. É nas relações humanas que tudo se cruza e essa é a graça”, conta o artista, que teve seu primeiro CD de lançado em 2012. O álbum intitulado ‘Crônicas De Um Rimador’ foi gravado e mixado no Estúdio Fábrica de Chocolate, com a produção de Damien Seth e co-produção do DJ Pachu.

Muitos atores negros reclamam sobre interpretar sempre os mesmos papéis na televisão, cinema, afirmando sempre estigmas e trazendo pouca ou nenhuma diversidade para a produção audiovisual nacional. “O ideal é tirar a palavra ‘negro’ do lado da palavra ator. Somos atores e atrizes e ponto. Quanto ao estigma com os papéis isso ocorre com todos os atores, mas o fato é que no caso dos pretos, o que geralmente nos é oferecido são papéis marginalizados e isso reflete como a sociedade classifica o povo preto brasileiro. Para que isso mude, inclusive dentro das artes, é necessário que os assuntos étnicos raciais sejam discutidos e trabalhados com as crianças nas escolas, que, aliás, fazem questão de frisar a escravidão do povo preto. Não ensinam sobre a cultura e a realeza africana e sobre tudo fazem da Europa a oitava maravilha do mundo transformando genocidas em heróis. Já disse não para muitos papéis que quiseram me oferecer nesse lugar marginalizado e acho que venho conquistando a cada ano que passa papéis como o médico, o advogado, o empresário e etc… Sempre fiz questão de dizer e colocar para o mercado não só o que não quero ser, mas, principalmente, onde quero estar como ator. Com educação, respeito, competência, elegância, sorriso no rosto e verdade no olhar tudo se transforma e ganhamos aliados a nosso propósito”, frisa.

André Ramiro, o Norato da série ‘Ilha de Ferro’ (Foto: Raphael Dias/ Gshow/ Reprodução)

André, na primeira temporada da série ‘Ilha de Ferro’, na TV Globo, viveu o cozinheiro Norato, que foi assassinado como parte de uma vingança. “Todo personagem é protagonista em seu universo dentro de cada história. Em suas trajetórias uns continuam vivos e alguns morrem. A morte infelizmente é uma realidade a ser retratada na ficção, porque faz parte da vida, é a única certeza que temos. Refletir sobre isso e morrer em cena é algo muito louco, mas faz parte do trabalho”, diz o ator, que ficou conhecido após interpretar o policial André Matias, no filme ‘Tropa de Elite’.

Pedimos ao artista para destacar pontos dessa sua marcante carreira. “Destaco a paixão, o amor pela profissão, autoconhecimento, desejo de ser melhor a cada dia, de aprender cada vez mais. O vencer a mim mesmo, sair da zona de conforto para a zona de esforço e a fé e nossa capacidade em realizarmos nossos sonhos. Isso é o que me motiva todos os dias”.

O carioca retomou as gravações do longa ‘Tração’, que fala do universo do motocross, vivendo Max Ramos, um rapper famoso, piloto e dublê de cenas de motocross. Um cara zen, o amigo que todo mundo quer ter. “Minha ligação com esse universo é quase nenhuma. Ando muito pouco de moto e tive que treinar muito para fazer algumas cenas. Mas estou encantado e os pilotos são verdadeiros heróis. Máximo respeito”, comenta.