“Amor de Mãe” volta ao horário nobre e retoma o debate sobre representatividade feminina


De acordo com uma pesquisa da ANCINE (Agência Nacional do Cinema) sobre a participação feminina na produção audiovisual, dos 246 diretores e diretoras encontrados pelo país, a distribuição era de sete homens para cada mulher, e nenhuma diretora negra. O número de roteiristas se divide entre 69% de homens e 24% de mulheres, o que impede a inserção de cenários realistas sobre a vivência da mulher. Ainda analisando dados sobre o tema, estima-se que as mulheres falem em apenas 30% dos filmes e quando falam é sobre homens e com homens, em cena elas ficam 16% das aparições

Estrelada por Regina Casé (Lurdes), Adriana Esteves (Thelma) e Taís Araújo (Vitória), a novela “Amor de Mãe” é aguardada pelo público desde o anúncio da interrupção das gravações, em março do ano passado, devido às restrições da pandemia. A reta final do folhetim conta com 23 capítulos inéditos e chega às telinhas hoje, segunda-feira, dia 15. A expectativa quanto à trama, em especial sobre Lurdes, que iria reencontrar o filho biológico Domênico, interpretado por Chay Suede, fizeram da novela um sucesso de audiência. Porém, além da narrativa, outra questão é relembrada: a representatividade feminina.

Adriana Esteves, Regina Casé e Taís Araújo em “Amor de Mãe”, que volta à programação da Globo (Foto: Divulgação/ João Cotta/Globo)

Com um elenco composto majoritariamente por mulheres, a obra é de autoria de Manuela Dias, que já assinou outros grandes trabalhos como a minissérie Justiça (2016), indicada a duas categorias do Emmy Internacional, e Ligações Perigosas (2016), ambas exibidas pela Globo. A escritora inseriu o diálogo sobre questões ambientais, desigualdade social, sobretudo a quebra da expectativa das personagens femininas.

Por muito tempo, os atributos principais de uma mulher eram explorados de forma caricata. Beleza, malícia, inocência, sensualidade eram pintadas como personalidade, características que não dão qualquer pista sobre a relevância dos indivíduos. Ao contrário, Manuela foge do lugar comum e aplica camadas de profundidade aos seus personagens. Por isso, é clara a necessidade de mais narrativas femininas no audiovisual.

De acordo com uma pesquisa da ANCINE (Agência Nacional do Cinema) sobre a participação feminina na produção audiovisual, dos 246 diretores e diretoras encontrados pelo país, a distribuição era de sete homens para cada mulher, e nenhuma diretora negra. O número de roteiristas se divide entre 69% de homens e 24% de mulheres, o que impede a inserção de cenários realistas sobre a vivência da mulher. Ainda analisando dados sobre o tema, estima-se que as mulheres falem em apenas 30% dos filmes e quando falam é sobre homens e com homens, em cena elas ficam 16% das aparições.

Na coletiva de imprensa preparada para a retomada da novela, Adriana Esteves ressaltou a importância dessas histórias serem contadas em produções desse gênero, que tem alcance e fazem o telespectador se questionar, principalmente sobre questões como sororidade, rivalidade feminina e outros aspectos que permeiam a vida da mulher enquanto inserida em uma sociedade patriarcal. “Somos guerreiras sim, cheias de força e de fragilidades. Colocando isso na nossa vida e na novela, ela tem a característica muito forte de falar da realidade, e o que a Malu (Malu Galli) falou da sororidade é muito claro na novela. Chega um momento que uma precisa da ajuda da outra. Até no momento entre Lurdes e Thelma, de brigar por um filho, é de dor, de ‘por que vamos brigar se existe um amor entre nós duas?”, comenta a atriz.

Além do desfecho, é esperado que as moradoras do Bairro do Passeio, juntamente com o trabalho da autora, deixem uma lição para os espectadores de como as relações femininas são importantes e podem ser tratadas de uma forma mais profunda, inteligente e mais próximas da realidade.

Manuela Dias ainda fala da necessidade de normalizar narrativas, para mostrar novas possibilidades e caminhos no campo ficcional, aproximando-o do público. “Quando a gente representa mulheres que não competem, ou pessoas em situação de poder, a gente começa uma mudança também na representação, porque toda realidade vem de dentro da gente. A personagem da Erika Januza, por exemplo… a gente não quis explicar por que ela é negra e joga um esporte de rico. A gente quis normalizar. Temos um elenco maravilhoso e muito variado, que desde sempre foi importante pela representatividade”.