Alexandre Borges: no elenco de ‘Elas por Elas’, ator relembra novela-reportagem e censura de trama no dia da estreia


Às vésperas de completar 30 anos de Globo, Alexandre Borges estará no ar em “Elas por Elas”, seu segundo remake de Cassiano Gabus Mendes, já que protagonizou “Tititi”, em 2010. O ator celebra que mais um trabalho do pioneiro da TV esteja voltando às telas e não vê problemas nas contínuas ondas de remake. No caso de “Elas”, ele acredita que prevalece o talento do autor para escrever projetos tão bem estruturados e que, por isso, retornam. O ator também relembra as três décadas de seu primeiro trabalho na TV, “Guerra sem Fim”. Mais uma das novelas-reportagem de José Louzeiro (1932-2017) e que foi transmitida por uma TV Manchete em crise e depois da Censura de uma obra importante, “O Marajá”, jamais exibida: “Gravávamos lá no Morro da Mangueira, com câmera na mão, uma coisa bem documental”

*por Vítor Antunes

Próximo de completar 30 anos de casa, já que estreou na Globo em 1994, em “Incidente em Antares“, Alexandre Borges celebra a oportunidade de estar em mais um remake de Cassiano Gabus Mendes. Agora é a vez de “Elas por Elas“. Ele já foi o Jacques Leclair do remake de “Tititi” (2010) – novela que somou a trama homônima, de 1985, à espinha dorsal de “Plumas e Paetês” (1981). Alexandre não acha ruim a nova onda de remakes. Pelo contrário, “acho que Cassiano Gabus Mendes (1929-1993) é um grande clássico da teledramaturgia, um homem que trabalhou como ator, diretor, editor, autor e foi um dos inventores da televisão. Entendia muito bem disso, conhecia bem o público, então, acho que há ali uma carpintaria, uma riqueza de texto, de situações muito atuais, muito modernas que não envelheceu, não. Além de tudo, acho que ele merece essa releitura”.

Também na casa das três décadas, completou, em 2023, 30 anos do último caso de censura direta na TV, mesmo após o fim da Censura Federal, em 1988. Em julho de 1993, a Manchete exibiria a novela “O Marajá“, escrita por Eloy Santos e José Louzeiro (1932-2017). A novela, que faria uma adaptação direta e sem sutilezas sobre a biografia do ex-presidente, e ex-senador Fernando Collor de Mello. Ele impediu que a novela fosse levada ao ar no dia da estreia e o embargo aconteceu há poucas horas da exibição do primeiro capítulo. Em seu lugar, alguns meses depois, entrou uma novela-reportagem ao estilo daquelas que Louzeiro já havia apresentado na Manchete e que tiveram bons resultados, como “Corpo Santo” (1987). A ideia era frazer uma trama gravada numa favela carioca dividida por dois grupos criminosos, o Comando Pirata e o Comando Patrulha, baseados nas facções criminosas do Rio de Janeiro. Alexandre Borges estreava na televisão fazendo o protagonista, Cacau, líder do Comando Patrulha, que apaixonava-se por Flávia (Julia Lemmertz), enteada do candidato a governador do Estado. Sobre esse conflito morro-asfalto, Borges diz que é “uma coisa bem clássica e que se manteve”. Ainda que tenha tido pouca relevância naquela época, “Guerra Sem Fim” foi suficiente para valer a Borges um convite para ir atuar na Globo, emissora onde está até hoje.

Alexandre Borges e Karine Telles. Dupla esconde um dos mistérios de “Elas por Elas” (Foto: Reprodução/Globo)

COISAS DA VIDA

Imortalizada na voz do grupo Fevers, o nome da música tema da novela “Elas por Elas” aliou-se tão fortemente à novela que deixou de chamar-se “Coisas da Vida” e passou a ter o nome da trama de Cassiano Gabus Mendes (1927-1993). Tal como em uma dessas coisas da vida, Alexandre Borges estará em mais um remake do autor. Em 2010 ele protagonizou “Tititi”, também uma releitura de obra dele. Para Alexandre, esta também vai ser “uma grande novela. Afinal, o gênero dialoga com uma chave enorme da população que, no começo da noite já vai começando a relaxar e que vai ali curtindo uma novela. Ela vai misturar, realmente, comédia, drama, suspense, mistério”.

O núcleo de Alexandre Borges está diretamente ligado ao da morte de um dos personagens, algo que acontecerá já no início da trama, que que vai ser o principal conflito da personagem Natália (Mariana Santos) “meu personagem, Pedro, tenta dar um apoio e ajudá-la, mas essa relação dela esse afã de saber como morreu seu irmão,  acaba por tornar-se uma obsessão”. Mas, ressalta ele, este não será um elemento que vá pesar na narrativa da novela, pelo contrário “tem uma coisa muito leve ao mesmo tempo, sem pesar muito a mão”. Para o ator, trata-se de um grupo de protagonistas maravilhosas, diversas, de várias leituras artísticas, cada uma com seu estilo, e é uma coisa muito bacana, essa representatividade tão grande de mulheres numa novela assim”.

O sucesso de uma novela é sempre um mistério Ainda que seja feita com muito amor, com muita paixão e profissionalismo, é um mistério. Está tudo sempre na mão do público – Alexandre Borges

Alexandre Borges em “Elas por Elas” vai ser irmão da protagonista (Foto: Reprodução/Globo)

COMANDOS DE COMANDOS 

Segundo os índices de Segurança Pública do Estado do Rio, 1994 foi o ano mais perigoso e mortal da cidade. Naturalmente, o ano anterior não foi tão diferente assim. Inclusive, 1993 foi um ano quase mortal para a TV Manchete. Em crise, a emissora chegou a ser vendida, entrou em greve, e quando foi devolvida aos donos, estava à míngua. Foi nesta condição, tentando subsistir, que a emissora decidiu fazer uma novela factual, baseada no Impeachment de Collor, afastado oficialmente em 1993 após haver renunciado do cargo ante a inúmeros escândalos de corrupção. A novela “O Marajá” não era nem um pouco sutil nas referências a Collor. Tanto que o protagonista da trama era o sósia do presidente, pessoa que era chamada para estar presente nos comícios de oposição a ele, o ator Hélcio Magalhães. No dia da estreia, o próprio presidente afastado interveio e proibiu a exibição da novela. Com atores contratados, ainda que estivesse fazendo das tripas coração para pagá-los, a Manchete resolveu não desistir da ideia de fazer uma novela. Assim nasceu a sucessora, “Guerra Sem Fim“. Trama sobre a violência urbana, o tráfico de drogas e cujo amor proibido entre os protagonistas se dava pelo fato de Cacau (Alexandre Borges), chefe do tráfico  haver apaixonado-se por Flávia (Julia Lemmertz), enteada do governador.

Uma das cenas de “O Marajá”, novela censurada por Collor, em 1993 (Foto: Reprodução YouTube/Canal Memória)

“Minha chegada na Manchete”, conta Borges, “foi muito interessante, porque eu deixei o material na casa, fiz um teste lá e me chamaram pra fazer “O Marajá“, mas a novela não foi ao ar. A emissora teve que pensar em algo para substituir e aí veio “Guerra Sem Fim“. E, de alguma maneira, tive uma sorte grande por que o meu personagem na novela acabou tendo muito destaque”. Em “O Marajá“, Alexandre daria vida ao motorista de Elle (Hélcio Magalhães). Na nova novela, passou a ser o protagonista, o traficante líder do Comando Pirata. “Foi uma novela inovadora nesse sentido, gravávamos lá no Morro da Mangueira, com câmera na mão, uma coisa bem documental. Além de ser o momento em que me casei com a Júlia Lemmertz, e fazíamos par romântico no folhetim. É uma novela que eu gosto muito e pela qual tenho muito carinho, dirigida pelo Marcos Schechtman. Paulo José (1937-2021) viu a mim eem um capítulo e me chamou pra fazer uma minissérie na Globo, ‘Incidente em Antares'” . Desde então, Alexandre Borges fez cerca de 21 novelas na plim-plim, fora séries e minisséries.

Romeu Evaristo, Alexadre Borges e Júlia Lemmertz numa das raras fotos de “Guerra Sem Fim” (Foto: Reprodução)