Suzana Pires é incansável. Além de participar de filmes de sucesso de público e de crítica, como “Loucas Para Casar” e “Casa Grande”, que estreou neste fim de semana e já abocanhou prêmios em festivais internacionais; de escrever roteiros; começar a preparação para a próxima novela de João Emanuel Carneiro; fazer cursos em Los Angeles; e, ainda, ser bonita e bem-vestida, ela consegue tempo para dar entrevistas, como esta que você vai ler agora.
Suzana conversou com o site HT sobre feminismo, arte, cinema, televisão e tudo mais o que viesse, sem ressalvas e sem tempo ruim. “Estou vivendo um ano de muito trabalho! Tem novela como atriz, websérie, site de empreendedorismo, roteiro de longa, seriado, tudo saindo do forno. Uma coisa que gostaria de explicar: tudo que faço, vem sendo feito, sabe? Não escrevo um roteiro em um mês, escrevo em dois anos e assim vai e o trabalho vai acontecendo e minha vida corre com uma certa calma porque a produtividade é algo cotidiano”, contou. O resultado desse papo animado com uma das nossas queridinhas, você lê agora!
HT: Que tipos de problema uma mulher bonita, talentosa e inteligente passa? O que dá errado na sua vida?
SP: Comigo não existe erro, mas sim ajustes. Ajuste de rota, ajuste emocional, ajuste financeiro e por aí vai. Tento ficar sempre atenta à condução da minha rota e assim acredito estar respeitando esse dom divino que é viver.
HT: Patricia Arquette, quando foi receber o Oscar, chamou a atenção para falta de igualdade de salários a oportunidades entre homens e mulheres em Hollywood. Como funciona esta questão no Brasil?
SP: O ideal é que sejamos todos valorizados pela meritocracia, independente do gênero, mas no Brasil essa questão da mulher é ainda pior. Ganhamos em média 30% a menos que um homem para desenvolver a mesma função, temos que provar arduamente que somos capazes de fazer algo bom. É pesado e as mulheres que estão encarando este desafio e vencendo pagam alguns preços, mas a satisfação é gigantesca.
Pessoalmente, tive sorte de entrar em equipes onde eu era a única mulher e sempre fui respeitada. Fora desse círculo, sinto a desconfiança como autora (somos poucas mulheres ainda), e por ser também atriz complica um pouco, mas jamais fiz esforço para ficar provando que sou capaz, apenas faço meu trabalho com entusiasmo e as minhas ações dão o meu recado para os despeitados de plantão. (risos) #soudessas
HT: Você acabou de voltar de L.A. onde fez um curso de roteiro. Qual a principal diferença entre o mercado americano e o mercado brasileiro de roteiristas? Faltam bons roteiristas no Brasil?
SP: Nos EUA, o mercado de entretenimento na TV é gigantesco. Prá simplificar darei um exemplo: é um lugar onde tem 10 “Globos”. Imagina as emissoras com um alcance deste tamanho sem profissionais de primeira? Não se atenderia a demanda do público. Então, o próprio mercado americano investiu na formação dos seus roteiristas e o que vemos hoje, em termos de qualidade, é a consequência deste investimento. O mercado externo nos respeita muito. Em telenovela somos os melhores do mundo. No entanto, em termos de filmes e seriados, precisamos estudar bastante e desenvolver cada vez mais a nossa dramaturgia. Imagina uma escola de roteiro boa em cada grande cidade do país? Imagina a quantidade e diversidade de histórias ainda temos para contar para o mundo?!
HT: Qual a diferença da Suzana que escreveu o primeiro roteiro para a Suzana de agora?
SP: Estou mais madura para entender a complexidade humana e isso se reflete na minha escrita. E já domino melhor estruturas de narrativa. Não paro de estudar. Ser autora é estar sempre com a alma em movimento e, quanto mais tempo de vida vivida, mais essa alma vai ficar sabida (risos)
HT: No filme “Casa Grande” você é o alicerce de uma família em crise econômica. Quase uma metáfora da atual situação do Brasil. Como tem acompanhado todas as questões políticas e econômicas que o Brasil vem passando?
SP: Acompanho com muito pesar. Fico triste demais com as notícias diárias de corrupção, mas também reflito o quanto o “jeitinho brasileiro” é cultural. Cada um de nós tem que dizer não à corrupção no dia-a-dia. Também fico preocupada com o Estado e Religião juntos, essa mistura jamais foi boa para qualquer nação. No filme, especificamente, é mostrado como a classe média alta brasileira anda na corda bamba. Por mais que a gente trabalhe e conquiste, uma crise econômica pode acabar com a paz financeira de uma família.
Sempre achei que cada indivíduo deveria abraçar uma causa. Abracei duas causas: a LGBT, porque não dá para continuarmos a não entender que cada ser humano é livre para amar quem quiser; e a Denúncia de Espancamento de Mulheres: no Brasil, a cada 3 minutos, uma mulher é agredida.
HT: Você já está escalada para uma próxima novela, certo? Como é equacionar a vida de roteirista e atriz? Você pensa: ah, agora um roteiro, depois um papel como atriz, aí um roteiro de novo, ou é mais aleatório?
SP: Eu planejo sim. Minha equação está mais ou menos assim: para eu trabalhar como atriz, corro atrás de oportunidades desafiadoras, que me tirem do lugar de conforto. Sou uma atriz que recebe convites e também corro atrás das boas oportunidades, me coloco disponível para mudar, para crescer, para somar com o projeto como um todo. Com esta atitude, o tempo da autora ficou maior, com mais qualidade e eu ainda deixo a autora mais “viva” internamente quando tenho desafios como atriz.
Meu estado normal na vida é sempre artístico, jamais acomodado.
HT: Como foi o seu processo com o filme “Casa Grande”? Há quanto tempo veio o primeiro convite, como foram as gravações e como tem sido fazer parte de um projeto que vem ganhando prêmios internacionais?
SP: O Felipe Barbosa, diretor, me convidou para este filme em 2008. De lá até 2013, fui com ele para o Sundance Directors Lab para fazer os improvisos do filme. O próprio Robert Redford supervisionou os trabalhos e foi um dos “advisors” para os jovens cineastas. Depois do Sundance, o Felipe mexeu mais no roteiro e começou a captar recursos, o que demorou bastante. Aí em 2013 aconteceu! Em 2014 o filme foi lançado no Festival de Cinema de Roterdã e viajou para 60 festivais internacionais, sendo premiado. Uma longa jornada, mas que valeu a pena!
HT: Como a faculdade de filosofia te ajudou na carreira de atriz e escritora?
SP: Foi a melhor atitude que tive por mim mesma, até agora. Alimentei o conhecimento de maneira tão profunda que, mesmo depois de 13 anos de formada, ainda tem “lenha prá queimar”.
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