O espetáculo intitulado PRETO, da companhia brasileira de teatro, é um desdobramento da montagem PROJETO Brasil feito pela trupe em 2015. Com direção de Marcio Abreu e escrito pelo próprio em parceria com Grace Passô e Nadja Naira, o trabalho se articula a partir de uma conferência administrada por uma mulher negra. No espaço, a personagem inclui temas como a realidade do negro Brasil e a maneira como lidamos com as diferenças em uma sociedade marcada pela desigualdade. A ideia é expor uma realidade que muita gente não conhece. “Escolhemos como espaço da nossa história uma sala de conferência, porque mesmo que pareça que há um monólogo da pessoa que apresenta a questão, este alguém está sempre incitando o debate. Além disso, é curioso pensar que o teatro é mais ou menos isto, estamos tentando uma conversa com a plateia e ter esta consciência nos fez buscar um lugar parecido, como uma palestra. Sendo assim, o nosso espetáculo é uma sala de discussão, gerada a partir de uma mulher negra”, explicou a dramaturga Nadja Naira. Depois da companhia teatral pausar a exibição da montagem devido a uma turnê pela Europa, PRETO volta a estrear no dia 7 de fevereiro e fica em cartaz até 11 de março. O espetáculo conta com um elenco diversificado como Cássia Damasceno, Felipe Soares, Grace Passô, Nadja Naira, Renata Sorrah e Rodrigo Bolzan.
A ideia de utilizar como espaço da narrativa uma sala de conferências acabou se assemelhando muito aos bastidores da criação deste texto. A dramaturgia foi escrita a partir da discussão entre os integrantes da equipe e ainda contou com a opinião de pessoas que foram convidadas a assistir ao trabalho. Os ensaios foram aberto ao público o que tornou a narrativa ainda mais dinâmica. “Existe um pouco de todas as pessoas no roteiro. O Marcio Abreu, nosso diretor, provocava cenas e criava situações para ver até onde aquilo iria. Todo mundo contribuiu um pouco. Apesar de ter sido mais difícil escrever no coletivo, mas achamos que era a única maneira possível de fazer este trabalho. Se nós, os dramaturgos, fizéssemos o texto e mostrássemos para os artistas depois, aquela narrativa não seria suficiente. Além disso, iria faltar muita história, porque grande parte da peça depende das imagens, corpo e música em cena. Tem certas coisas que a palavra não consegue dizer”, contou. Contribuindo com esta ideia, o músico Felipe Storino executa a trilha sonora ao vivo durante o espetáculo para enriquecer a cena. “Sendo assim, fazer em grupo acaba tornando o projeto mais rico, complexo, amplo e mais coerente com os dias atuais, onde precisamos dialogar em vez de impor as ideias”, completou. O projeto é o quarto em parceria com a Petrobras, especialmente por ser resultado de um teatro de pesquisa.
O texto começou a ser desenvolvido a partir de perguntas. Ao longo da pesquisa, o grupo reparou que seria difícil encontrar uma resposta para questões tão delicadas. No entanto, foi exatamente por isto que escutar o outro e abrir o diálogo foi tão importante nesta dramaturgia, pautado em uma extensa pesquisa. “Procuramos informações em filme, livros, blogs, notícias, documentários e outros. Encontramos muito material nos Estados Unidos, apesar de ser um racismo diferente. Procuramos muito nos africanos também, porque achamos que seria interessante saber a visão que eles têm da escravidão. Achille Mbembe, por exemplo, escreveu a Crítica da Razão Negra na qual fala que todos somos escravos de certa forma. Lemos sobre as minorias, pois acaba sendo inevitável não ler sobre desigualdade social e exclusão quando estamos estudando o racismo. Devido, inclusive, à proximidade dos temas, acabamos incluindo estes assuntos”, informou.
O grupo de dramaturgos é formado por três intelectuais: Marcio Abreu, Grace Passô e Nadja Naira. Destes escritores, apenas uma pessoa é negra. Atualmente, existe um debate em torno do preconceito racial no qual afirma-se que apenas os indivíduos que sofrem racismo podem falar sobre a causa negra. A partir desta visão, quem é branco não poderia falar sobre o assunto por nunca ter enfrentado o preconceito na pele. Contrariando esta discussão, dois dos dramaturgos de PRETO são brancos. “Me perguntei muito se eu tenho legitimidade para falar sobre isso sendo branca. Não é que tenhamos legitimidade, mas de tanto discutir sobre o racismo, percebi que é preciso debater sobre o assunto, independente da cor da pele. A discussão é importante mesmo que seja ingênua e vaga. Ouvimos algumas críticas, mas aos poucos fomos perdendo o medo de falar sobre estas questões. No entanto, sei que a pergunta é válida, mas não nos deixou presos ou nos coagiu a não falar sobre. Qualquer pessoa tem de conversar sobre este preconceito. Claro que tenho menos condições de falar porque sou branca e falo destas questões a partir do meu lugar, mas aceito isto e busquei expor as diferenças de identidade na peça”, informou Nadja. Ela garantiu que se perguntou muitas vezes se deveria escrever sobre o assunto, apesar das críticas, a escritora acredita que conseguiu criar um projeto bacana e garantiu que saiu deste universo ainda mais consciente.
Espetáculo: PRETO
De 7 de fevereiro a 11 de março de 2018
Dias e horários: De quarta a domingo, às 19h30.
Local: Teatro 3 | CCBB Rio (Rua Primeiro de Março, 66 – Centro)
Informações: (21) 3808-2020
Capacidade: 72 lugares
Recomendação etária: 14 anos
Duração: 90 minutos
Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia)
bb.com.br/cultura
SAC 0800 729 0722 – Ouvidoria BB 0800 729 5678 – Deficientes Auditivos ou de Fala 0800 729 0088
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