*Por Brunna Condini
Com 38 anos de carreira e produzindo seus próprios projetos em boa parte desta trajetória, Luisa Thiré volta aos palcos, mais uma vez, dizendo exatamente o que gostaria e reflete seu momento pessoal. Em ‘A Inquilina‘, que protagoniza ao lado da amiga e também atriz Carolyna Aguiar, Luisa é uma das duas mulheres no espetáculo com mais de 50 anos e que decidem dar uma guinada em suas vidas. Aos 53 anos, a filha de Cecil Thiré (1943-2020) e neta de Tônia Carreiro (1922-2018), diz que se identifica com o momento das personagens do espetáculo que estreia em 11 de janeiro, no teatro do Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro . “Acho que estou querendo dar agora esse tipo de virada. Os 50 anos hoje não são os de antigamente. Me sinto no auge da minha produtividade, querendo realizar muito ainda. Tenho todos os desejos do mundo e muita saúde, graças a Deus. Quero fazer tudo que sempre fiz e tudo que ainda não fiz. Amo experimentar o novo e tenho essa vontade nos anos que estão pela frente. De lugares novos, a comidas novas, a experiências novas, a namorados novos. É um desejo enorme de abraçar o mundo, mas agora de uma forma mais focada, sem perder tempo. Não tenho esse tempo para perder. Essa é a minha grande virada”.
Luisa é parte de uma família de artistas – além de neta de Tônia e filha de Cecil, ela é irmã dos atores Miguel Thiré, Carlos Thiré e João Thiré, mãe do ator Vitor Thiré e da atriz e diretora Juliana Thiré. “É com muito orgulho que vejo essa continuidade artística na família. Estamos perpetuando uma sementinha que minha avó plantou lá atrás, meu pai deu sequência e nós depois”. E fala sobre como trabalhou as cobranças e comparações ao longo da vida. “Com muita terapia (risos). E muito amor. É deliciosa essa relação familiar. Minha avó e meu pai foram cruciais na escolha da minha profissão. Conheci o mundo assim. Nasci nas coxias, dormia nelas, brincava nos camarins, fui apresentada ao mundo dessa forma. Sempre convivendo com muitos atores e atrizes desde cedo. Não conheço o mundo de outra forma. E como meu pai e minha avó tiveram carreiras muito bonitas, bem-sucedidas, tudo isso sempre me encantou. Não comecei a fazer teatro, foi o teatro que me começou. Mas sempre tive que me provar. Tenho 53 anos e não sou nenhuma grande estrela, ainda. Pode escrever o ‘ainda’ (risos). Sempre fui comparada a eles e talvez seja assim eternamente”, divide.
Sempre teve uma comparação do lado artístico, da beleza da minha avó. Tenho essa persona de ‘neta da Tônia Carreiro’. Isso andou comigo a vida toda. E até onde sou a neta da Tônia e até onde sou a Luisa, durante muitos anos foi difícil até para mim, dissociar uma coisa da outra – Luisa Thiré
E pontua: “Já há algum tempo consigo separar, mas foi preciso muita análise. Sou neta da Tônia Carreiro e me orgulho disso, mas tenho minha própria história. Aliás, sou ‘a neta’, porque ela tem quatro netos, mas de mulher, só eu. É uma responsa maior. Isso me trouxe maravilhas e dificuldades grandes, na mesma proporção. Já tive situações com diretores, como o Walter Avancini (1935-2001), por exemplo, de eu pedir para fazer um teste e ele dizer que não precisava, me já me conhecia. De fato, me acompanhava desde pequena, mas não conhecia de perto o meu trabalho. Essa foi só uma das barreiras que sempre precisei transpor”.
Luisa acrescenta que muito por conta disso, precisou desenvolver uma autonomia maior desde sempre. “Comecei a produzir meus próprios espetáculos cedo. Realizei a primeira produção aos 19 anos e não parei mais. Esse espetáculo mesmo é produção minha e da Carol. É uma forma de escolher o que vou fazer e com quem farei. Neste momento o tema amadurecer me interessa muito. Minha geração está criando uma forma diferente de envelhecer. Partimos do particular para falar do macro”.
A atriz avalia também os legados de Tônia e Cecil que carrega. “Da minha avó tenho muito essa determinação, essa coisa de pegar e fazer. Ela também produziu muitos dos seus espetáculos. Sempre esteve à frente do seu tempo, muito batalhadora. Brigou com a família toda para ser atriz, porque na época a profissão eram malvista. Veio de uma família de militares, então os pais ficaram sem falar com ela quando ela saiu de casa, casou com um diretor, para obedecer agora a ele e não mais ao pai…fez o que acreditava. Também sou assim. Minha avó também era leal ao seu caminho, amizades, voltada para a família. Me identifico, a ceia de Natal vai ser aqui em casa. Amo reunir a família, sou agregadora como ela”, diz.
“Papai era um cara incrível, multi-tudo. Atuava, dirigia, dava aulas, tinha um sítio, plantava, cuidava dos animais. Também dou aulas, faço preparação de elenco de crianças e adolescentes, principalmente para cinema e TV, tenho essa pluralidade em mim. A princípio por uma necessidade financeira, mas de muito tempo para cá, amando as possibilidades de jogar nas ‘onze’ posições. Essa coisa ‘combo do Cecil’ ficou em mim. Além disso, também sonho viver só de teatro no Brasil”. E anuncia: “O teatro é minha casa. Inclusive, estou procurando um texto para fazer um espetáculo com os meus filhos”.
Nova fase
Luisa é mãe de três filhos, do ator Vitor Thiré, de 30 anos, da atriz e diretora Juliana Thiré, 27, e de Antônio Thiré, 16, e comenta a nova fase na maternidade e como mulher, com os filhos mais crescidos. “O mais novo é o único que ainda vive comigo, mas tem toda autonomia. Então, volto a fazer do meu tempo, dinheiro, o que quero. Quando estamos com filhos pequenos, investindo no casamento, existe uma demanda muito grande para os outros e pouca para nós. No início da vida, com ou sem a maternidade, temos uma necessidade de ‘arranque’, é muita ralação, depois vem uma liberdade maior. Essa peça vem neste momento. Ainda tenho a energia dos 20, mas com maturidade. Quero dançar, namorar, ter novos projetos, realizar, e quero que me enxerguem assim. O espetáculo fala disso de uma forma delicada, emocionante, divertida. Esse momento da vida é muito rico, são muitos assuntos que vem à tona. Estamos falando de nós e de tantas outras mulheres”, analisa.
‘A Inquilina’ conta a história de duas mulheres acima dos 50 anos que querem dar uma virada na vida. A partir de um encontro, se espelham e se revelam. Tão diferentes e com vidas tão distintas (uma mora no interior, outra, na metrópole), têm em comum a solidão – com suas dores e delícias – desta nova fase da vida, já desobrigadas das demandas de filhos e casamento. “Combatemos o etarismo e os preconceitos com arte. A minha personagem descobre dentro dela uma força que não tinha e encontra um desejo de fazer novos planos, se reinventar. Estou buscando cada vez mais minha essência no que faço e também dando menos importância ao que pensam, porque acho que vamos ficando mais confiantes de quem somos. É muito bom ter 50, viu?”, afirma. “Quero ser ainda mais feliz. Sou cada vez mais fiel a mim, sem passar por cima de ninguém. Sempre vivi muito em função do outro, mas não abro mais mão dos meus desejos mais profundos”.
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