Jarbas Homem de Mello fala sobre novos projetos, o papel da arte e comenta parceria com a mulher, Claudia Raia: ‘’O nosso respeito e a nossa disciplina são muito parecidos. Não tem como dar errado’’, declara


Com projetos programados para 2019, Jarbas Homem de Mello retorna aos palcos na pele de Charles Chaplin em musical em cartaz no Theatro Net SP e invade os cinemas brasileiros ao lado de Leandro Hassum na comédia ‘’Não se Aceitam Devoluções’’, lançada nesta quinta-feira, 31.

O ator Jarbas Homem de Mello encarnou Charles Chaplin, um dos seus ídolos de infância, no teatro em 2015. No entanto, as poucas semanas nas quais ficou em cartaz não foram suficientes. Três anos depois, Jarbas retorna ao mundo do ícone do cinema mudo para mais uma temporada de ”Chaplin – O Musical” no Theatro Net SP, em São Paulo até o dia 29 de julho. Nesse intervalo, o ator interpretou diversos papéis, como Chico Malta no espetáculo ”Roque Santeiro”, e ainda assim não foi possível eliminar todos os trejeitos de Chaplin, facilitando a incorporação do personagem. ‘’Nós fizemos o espetáculo há três anos, fizemos uma grande pesquisa sobre a vida dele. Então, conheci tudo sobre. O que ajudou muito foi não começar o processo do zero, eu já tinha um entendimento, uma memória muscular desse personagem. Tem essa facilidade que é o relembrar’’, diz. Durante os ensaios, que duraram apenas cinco semanas, Jarbas só sentiu na pele o passar do tempo quando teve que retornar às habilidades físicas que Chaplin possuía, como patinar e fazer acrobacias.

Da esquerda para direita: a atriz Myra Ruiz como Oona O’Neil, quarta e última esposa de Chaplin, Jarbas como Chaplin, Juan Alba como Fred Karno, empresário do Music Hall londrino e Paulo Goulart Filho como Mack Sennett, fundador dos estúdios Keystone e responsável pela estreia de Chaplin no cinema. (Foto: Pedro Dimitrow)

O musical, que ainda vai passar pela cidade maravilhosa no segundo semestre, conta a trajetória do artista desde a infância até os últimos anos, transitando pela relação dele com a mãe, as polêmicas políticas e os seus maiores sucessos nas telinhas, como ‘’O Vagabundo’’. Para Jarbas, que costumava se fantasiar de Chaplin quando mais novo e tinha fotos do ídolo nas paredes, é difícil se distanciar do personagem em certos momentos da peça, como o reencontro com a mãe depois de anos afastados e, principalmente, quando ele é reconhecido com um Oscar honorário aos 82 anos após ter sido expulso dos Estados Unidos por compartilhar visões consideradas comunistas. ‘’Ele era o ícone do cinema mudo quando começa a falar em prol de uma sociedade mais justa, quando começa a colocar um discurso de uma humanidade que precisa ser realmente humana e ele acaba sendo rotulado de comunista e é expulso do país. Essa incompreensão com o artista mexe muito comigo. Essa coisa de que ele quer melhorar sempre não só como artista, mas o entorno dele, sabe? Essa sensibilidade me aproxima muito dele’’, conta.

Da esquerda para a direita: Paulo Goulart Filho como Mack Sennett, fundador dos estúdios Keystone e responsável pela estreia de Chaplin no cinema, Jarbas como Chaplin e Juan Alba como Fred Karno, empresário do Music Hall londrino. (Foto: Pedro Dimitrow)

Para o público, um dos momentos mais esperados é quando Charles Chaplin descobre o personagem Carlitos, lembrado até hoje devido à sua bengala, terno e bigode tão característicos como um clássico do cinema mudo. No entanto, não espere que essa seja a situação menos musical do espetáculo. Afinal, como diz Chaplin em uma das cenas: ‘’luz, câmera, som, ação’’. ‘’A música e a fala entram justamente no sentimento dele, o que ele tá sentindo, qual foi a surpresa dele, qual foi a expectativa, qual a transformação que aconteceu com ele. A música é a fala colocada justamente nesse momento’’, explica Jarbas que enxerga a música como mais uma integrante do elenco.

(Foto: Pedro Dimitrow)

O sucesso de Chaplin, que foi eternizado na interpretação de Carlitos, já completou mais de 100 anos e ainda é um elemento da cultura pop até os dias de hoje. Hoje, o astro ainda é lembrado, seja pelas vestimentas ou pelo impacto que teve na história cinematográfica, por diversas gerações, inclusive os mais novos. ‘’A figura do Chaplin é muito conhecida entre os mais jovens. Então, a gente vê na plateia que vão crianças fantasiadas de Charles Chaplin. É tão lindo. De repente, tem uma criança de sete anos que conhece a figura também. Nunca viu um filme mudo, mas se identifica de uma certa maneira. É um espetáculo pra família inteira’’, conta o ator que durante a primeira temporada em 2015 atraiu mais de 80 mil espectadores e ainda levou diversos prêmios para casa, como o Prêmio Cenym de melhor musical e o Prêmio Bibi Ferreira de melhor cenografia.

Com produção de Sandro Chaim e Claudia Raia, ”Chaplin – O Musical” não é a primeira parceria entre Jarbas e a esposa, Claudia. Juntos desde 2012, o casal já dividiu o palco em quatro espetáculos, entre eles o mais recente ‘’Cantando na Chuva’’, inspirado no clássico do cinema musical que foi lançado em 1952. Enquanto para muitos casais trabalhar juntos significa problema, para esse duo artístico a parceria só enriqueceu a relação. ‘’É muito bom contracenar com ela. Eu a conheci trabalhando em 2009. Então, a gente pensa muito igual, temos um humor muito parecido, uma maneira de levar a produção muito parecida também. O nosso respeito e a nossa disciplina são muito semelhantes. Não tem como dar errado’’, afirma. O ator ainda completou que essa troca entre eles rende muitos momentos hilários. Durante a temporada de ”Cantando na Chuva”, era difícil segurar o riso toda vez que um dos dois esquecia a fala. ‘’Uma coisa muito engraçada é quando a gente esquece a letra e compõe na hora. Eu tenho uma particularidade que eu crio na hora e ela não consegue improvisar muito não. É difícil não rir quando você percebe o que a pessoa está fazendo’’, conta.

Jarbas caracterizado como Don Lockwood, ao lado de Claudia Raia como Lina Lamont no musical ”Cantando na Chuva”. (Foto: Bruno Santos)

A parceria foi tão bem sucedida que a dupla não quer parar por aí. Durante o papo com o site HT, Jarbas contou exclusivamente – sem spoiler, claro – que os dois estão em processo de produção de dois projetos. E o melhor de tudo: só com os dois em cena dessa vez. ‘’A gente quer um espetáculo musical escrito pra nós dois e queremos viajar e levar pra fora, isso deve acontecer em 2019. O projeto vai ser estilo ‘’Irma Vap’’, aquela peça na qual os atores faziam vários personagens’’. Além disso, os dois vão atuar em um filme musical, que, de acordo com Jarbas, não vai ser nada comparado a La La Land, lançado em 2016. No entanto, isso é tudo que o ator pode compartilhar agora. ‘’Não posso dar spoiler ainda. Tudo está muito na sinopse, está tudo no início, então as informações podem mudar rápido’’, completa.

E ele não para por aí. Outro projeto que também chega em 2019 dessa vez na plataforma de streaming da Globo é a websérie ‘’Assédio’’, que aborda a polêmica envolvendo o médico Roger Abdelmassih, acusado de abusar das pacientes que iam em busca do tratamento de fertilidade in vitro. Com direção de Amora Mautner e texto de Maria Camargo, Jarbas vai atuar na pele de um cantor famoso que faz um tratamento com o médico e acaba se transformando no garoto propaganda da clínica de inseminação artificial. Para o ator, que dividiu cenas com Adriana Esteves e Mariana Lima, é importante que essa história seja contada como forma de alerta para a sociedade. ‘’A importância da arte é essa: criticar, mostrar e não deixar esquecer. Mesma coisa do nazismo, tem que ser falado e lembrado. Tem que mostrar a realidade desse médico porque é algo que tem que ser questionado e a arte tem essa função’’, declara. Jarbas ainda completou dizendo que, considerando o fato de que segundo pesquisa divulgada pelo DataFolha em 2017 mais de 40% de mulheres já relataram terem sofrido algum tipo de assédio, a manifestação artística torna-se ainda mais necessária. ‘’A arte sempre retrata a vida. Quanto mais contemporâneo nós fomos, melhor, porque isso depois fica como um retrato de um tempo. A memória se apaga, mas a arte não’’.

Leandro Hassum como Juca Valente e Jarbas Homem de Mello como Bob Gomez. (Foto: Divulgação)

Contudo, não pense que Jarbas Homem de Mello irá ficar parado enquanto 2019 não chega com os novos projetos. Lançado nesta quinta-feira, 31, Jarbas retornou às telonas ao lado de Leandro Hassum na comédia ‘’Não se Aceitam Devoluções’’, um remake do longo mexicano dirigido por Eugenio Derbez que conta a história de Juca Valente (Leandro Hassum), um mulherengo que vira pai solteiro quando a ex-namorada americana abandona a filha com ele, obrigando-o a ir atrás dela nos Estados Unidos. Na trama, Jarbas interpreta Bob Gomez, um latino que torna-se melhor amigo do personagem de Hassum, vivendo altas aventuras ao lado do amigo em Hollywood.  O filme, apesar de ter um lado cômico, traz uma grande história de amizade, mostrando um outro lado de Leandro Hassum. ‘’Ele mostra uma outra faceta dele porque é um filme que emociona muito, as pessoas saem muito emocionadas do cinema. Acho que as pessoas vão ter boas surpresas. O Hassum dá um show e eu estou ali ajudando ele a contar essa história. Eu gostei muito de fazer’’, afirma.

 

Além de invadir as salas de cinema, Jarbas também assume a direção de dois espetáculos: ‘’MPB – Musical Popular Brasil’’, que resgata o teatro de revista e ícones do cenário artístico brasileiro, e ‘’Forever Young’’, que trata da questão da terceira idade com muito bom humor ao som de clássicos nacionais e internacionais dos anos 50 a 90. Enquanto diretor, Jarbas fica responsável por decidir tudo, desde as luzes até o elenco, a fim de alcançar um único objetivo: emocionar. ‘’Eu busco sempre uma história que me emocione. Isso é essencial. Além disso, quero que o público saia do teatro com alguma reflexão, que ele saia diferente do como entrou. Você tem obrigação de modificar o público, porque a pessoa que se arruma, sai de casa, compra o ingresso, pega trânsito, vai até o teatro… Ele quer sentir alguma coisa. Ou ele quer ficar feliz, ou quer chorar, ou quer relembrar. Ele tem que ser transformado de alguma maneira’’, declara.

Com tantos sucessos no currículo, principalmente de musicais, Jarbas Homem de Mello já conquistou o seu espaço no cenário brasileiro de teatro musical, tornando-se um personagem importante na construção de um âmbito inteiramente brasileiro. Hoje, 20 anos depois do boom desse tipo de montagem, o Brasil deixa um pouco de lado a influência da Broadway, uma das maiores referências de espetáculos musicais no mundo, e foca em criar a sua própria dramaturgia, recuperando histórias de grandes nomes da história do país, como a peça sobre Bibi Ferreira. ‘’É muito importante criar essa dramaturgia brasileira. Estamos começando, engatinhando, temos um longo caminho pela frente e vai ser um caminho muito bonito porque temos muita história boa pra ser contada’’, diz. O cenário musical brasileiro expandiu tanto que atualmente há escolas especializadas espalhadas pelo país nesse tipo de criação, recuperando inclusive linguagens utilizadas pelo teatro de revista, estilo muito popular nos anos 30. ‘’Temos uma estrutura pra começar a experimentar essa dramaturgia. Nós estamos conseguindo agora dramaturgos para musicais, que é uma linguagem que a gente teve que aprender ou reaprender depois das revistas dos anos 50, 40 e 30. A gente precisava desse tempo para se desenvolver e agora a gente pode experimentar a nossa própria dramaturgia, contar nossas historias com os nossos ritmos e assim por diante’’.

No entanto, apesar de compreender que há uma melhoria no âmbito dos musicais, é impossível para Jarbas, assim como para tantos outros artistas, ignorar a conjuntura atual da cultura no Brasil. A falta de incentivo é escancarada e até produções como a do ‘’Chaplin – O Musical’’, que atraiu um grande público, ficam impossibilitadas de serem produzidas. No caso de Chaplin, a primeira temporada teve que ser encerrada após quatro meses por ausência de patrocínios. Agora, três anos depois, o espetáculo só conseguiu retornar graças ao selo de qualidade Claudia Raia e Sandro Chaim, nomes que atraem parcerias, como o Santander. A situação de Chaplin é uma em um milhão e outras manifestações artísticas dependem de incentivos como a Lei Rouanet, que é acompanhada de uma grande polêmica, prejudicando o acesso ao apoio financeiro. ’’ É muito triste porque tem maus elementos que usam de uma lei de incentivo, de redução de impostos, pra roubar. Por causa de alguns, a classe artística é vista como ladra. Por isso, é muito importante a gente dizer ‘’não’’ porque fazemos um serviço para a sociedade e devolvemos para ela como arte, como reflexão e como alimento pra alma, que é o que a arte faz. Isso é muito importante de ser dito: não somos aproveitadores de dinheiro publico’’, desabafa.