Françoise Forton volta aos palcos do Rio com “Estúpido Cupido” e avalia atual situação da cultura no país: “Onde estão as pessoas fortes na nossa área para falar por nós?”


Atriz completa 50 anos de carreira relembrando personagem que a colocou em destaque na televisão brasileira com a novela, em 1976. “Essa peça é uma comemoração. Eu gostaria de fazer algo que fosse relativo ao meu próprio ofício. Estou em um momento muito feliz da minha vida, só quero me divertir”

Comemorando 50 anos de carreira em cima dos palcos, Françoise Forton prova que não se intimida com o tempo. Após uma temporada de oito meses em São Paulo, a atriz retorna à cena carioca com o premiado musical “Estúpido Cupido”, no Shopping da Gávea – local que a artista considera a Broadway da Cidade Maravilhosa. Cheia de planos e muito crítica quanto ao nosso cenário político atual, ela ainda revela, com exclusividade ao HT, que o segredo para uma vida tranquilo é entender que é preciso rir de si mesmo. “A gente aprende a ver a vida com outro olhar. A minha escala de valores mudou, hoje eu priorizo a família, os amigos e a saúde. Dou valor a gente verdadeira”, comentou. “Eu entendi que é preciso não se levar tanto a sério. A rir de mim mesma, sabe? Às vezes não é tão simples assim, mas eu trabalho isso diariamente”, contou ela, que é casada com o empresário e produtor teatral Eduardo Barata.

Françoise Forton na musical "Estúpido Cupido (Foto: Divulgação)

Françoise Forton na musical “Estúpido Cupido (Foto: Divulgação)

Françoise ainda era menina quando pisou no palco pela primeira vez. Estreou com pé direito ao lado de Paulo Autran, falecido em 2007, quando o ator estava em cartaz com sua peça em Brasília e havia selecionado duas crianças para o espetáculo. “Sempre que me encontrava com o Paulo, ele se lembrava de meu começo ainda menininha ao lado dele em ‘Édipo Rei’“, comenta a atriz, orgulhosa. Foi deste modo que ela inaugurou uma trajetória de cinco décadas nos palcos, cinema e televisão, que é celebrada hoje no Teatro Vanucci, com a personagem que a lançou na TV em 1976, na Globo. “Esse espetáculo é uma comemoração. Eu gostaria de fazer alguma coisa que fosse relativa ao meu próprio ofício. E que fosse no teatro. Eu e Eduardo ficamos pensando em projetos que tocassem em coisas que eu já fiz”, adiantou. “Durante uma conversa com uma amiga, ela me sugeriu o ‘Estúpido Cupido’, mas eu não queria uma novela. Então, Flávio Marinho (autor da produção) me deu a ideia de pegar esse texto e transformar em um musical”, disse.

No espetáculo, Françoise é Maria Tereza, a Tetê, mesmo nome da personagem que viveu na novela homônima. Mas as semelhanças com o folhetim ficam por aí. Marinho apenas tomou o nome da personagem e da trama como ponto de partida para criar uma nova história, na qual Tetê já é uma senhora que tem a chance de reviver a juventude passada na década de 1960, além de reencontrar um antigo amor, no caso interpretado por Luciano Szafir, agora com uma jovem namorada, papel de Carla Diaz.  No entanto, na fase de pré-produção da peça, ela confessa que ficou receosa em fazer um musical tão dançante. “Não tenho idade para isso”, foi o que pensou. Mas logo foi convencida a fazer um rabo de cavalo, a vestir uma saia rodada e embarcar na ingenuidade adolescente da década, que foi marcada por uma explosão juvenil. “Foi um desejo meu que o espetáculo fosse uma coisa alegre, bem brasileira. A peça fala de algo muito importante, que é a amizade”, pontuou.

Luciano Szaffir, Françoise Forton e Carla Diaz (Foto: Divulgação)

Luciano Szaffir, Françoise Forton e Carla Diaz (Foto: Divulgação)

Em “Estúpido Cupido”, Françoise canta, dança e ainda aparece vestida de maiô em um determinado momento da peça. Apesar da insegurança, ela revela que intensificou seus exercícios para se preparar para o novo desafio. “O corpo do ator é o seu maior instrumento. Nós temos que estar sempre preparados ou pelo menos exercitado para a dança, o canto… e procuro fazer isso. Danço desde a adolescência e nunca variei muito de peso. Hoje em dia, quem pode, tem oportunidade de fazer isso desde pequeno. E quem procura uma carreira séria precisa estar atento a isso. Como não tinha oportunidade quando criança, eu comecei a dançar e cantar um pouco mais tarde, mas agora me dedico muito. E sempre que posso faço aulas de balé. Isso revigora a minha alma”, disse. “Estou em um momento muito feliz da minha vida, só quero me divertir”, completou.

O espetáculo é pontuado por 20 músicas integradas à ação dramática. Hits dos anos 60 e 70 que atravessam décadas de sucesso são tocados por uma banda ao vivo. “Banho de Lua”, “Lacinhos cor de rosa”, “TetꔓBroto Legal”, “Frankie” “Erva venenosa”, além de “Estúpido Cupido”, eternizado na voz de Celly Campello, fazem parte da trilha sonora da peça. “É uma grande festa, chega um momento do espetáculo que as pessoas se levantam, cantam e dançam o tempo todo. No final, o teatro vira um grande baile, onde os atores vão até a plateia e dançamos todos juntos. Isso não estava no script no início, mas os deuses do teatro abençoaram e conseguimos fazer esse improviso na hora e, agora, faz parte”, comentou ela, que critica uma gama da nova geração de atores que só busca a profissão pelo glamour da mídia. “Acho isso tudo muito vazio. Como diz Fernanda (Montenegro): ‘a nossa profissão não é feita só de talento, tem que ter vocação’. Para ter uma carreira de sucesso tem que haver dedicação. Como em qualquer profissão. Esse tipo de artista que aparece por aí, não tem ideia do que é isso. E é uma pena, porque talvez, ainda acabam tomando o lugar de pessoas que realmente têm o que mostrar”, ponderou ela, que salientou que as novas gerações precisam ficar mais antenadas com a realidade. “Parece que a juventude tem preguiça de ler. Se o artista não se informar e não ler ele está perdido. Se ele não pensa, ele não cria”, avaliou.

Cenas do musical "Estúpido Cupido" (Foto: Divulgação)

Cenas do musical “Estúpido Cupido” (Foto: Divulgação)

Mesmo em tempos de comemoração, Françoise não se faz de rogada ao criticar o nosso momento político como um todo. “Nós estamos perdendo muito. Estamos perdendo o Ministério da Mulher, da Cultura… a gente ter perdido o MinC foi algo muito sério. Parece que nós estamos andando para trás. A minha sensação é que o Brasil não tem memória. Tudo o que foi conquistado com tanta luta, se perdeu”, avaliou. “É impressionante quando acontece uma coisa dessa, a cultura é a primeira a ser atacada. É mais louco quando a cultura é o cartão de visita de um país. Ainda mais nesse país que vive de arte, esporte e turismo”, completou. “Eu me sinto estatelada na parede. Eu me questiono: onde estão as pessoas fortes na nossa área para falar por nós e nos representar nesse momento?”.

Quando o assunto é partido e posicionamento político ela é taxativa: “Eu não tenho mais vontade de ter partido. Eu sou da época das Diretas Já. Lutamos por nossos direitos há séculos e hoje está tudo caindo por terra”, disse ela, que pontuou a agressividade do brasileiro. “Eu já não comento mais sobre política por medo das pessoas. Eu fico receosa de falar de impeachment, porque as pessoas estão agressivas. Eu não estou omissa, de forma nenhuma. Tenho minha posição. Quando assisti a queda do MinC e do Ministério da Mulher a questão pra mim ficou tão maior… As pessoas estão se matando. Eu não quero imaginar que as pessoas estão voltando para a barbárie”.

A atriz em ação na peça (Foto: Divulgação)

A atriz em ação na peça (Foto: Divulgação)

Questões políticas à parte, a atriz garante que não é tão difícil envelhecer perante às câmeras na era da imagem. “O grande barato de envelhecer, é saber envelhecer. Acho que o segredo é ter uma cabeça jovem. Temos muito essa questão de ser muito magrinha, de ser muito modelo. Isso é um pouco preocupante e veio muito à tona entre os jovens. Acho que a pessoa tem que se aceitar, seja a idade que for”. Ao falar sobre plásticas, Françoise também é categórica: “Acho uma loucura, chega uma hora que a pessoa perde a identidade. Acho que sim: ‘Vamos ser vaidosos, vamos ficar bem’, mas não perder a identidade e virar um ser que não é nada. Eu me cuido, até porque na era do HD a gente não pode bobear, mas tudo tem limite. A pessoa não pode perder sua identidade”, finalizou.

Serviço:

Estúpido Cupido
Teatro Vanucci: (21) 2274-7246
Rua Marquês de São Vicente, 52 – lj 371, Shopping da Gávea.
Temporada: de 12 de maio a 26 de junho
Dias e horários: de quinta a sábado às 21h / domingo às 20h30
Ingressos: quinta, sexta e domingo – R$ 100,00 / sábado – R$ 120,00