* Por Carlos Lima Costa
O isolamento social provocado pelo Covid-19 acarreta uma série de desafios à classe artística. Diogo Vilela se prepara para vivenciar o seu primeiro dentro desse novo normal que a pandemia trouxe para o mundo. Nesta quinta, dia 24, às 20h30, o ator irá apresentar, no Teatro Claro Rio, o monólogo Cauby, Uma Paixão. Ele estará no palco, mas não terá o público diante dele. A encenação abre a segunda temporada de lives do projeto Palco Instituto Unimed-BH em Casa. “Não vou mentir que sinto uma diferença imensa, porque tenho que falar com as pessoas e elas não vão estar lá. Vão me ver através da câmera. Teatro é a arte da presença. E, agora, não vou ter o aplauso, a reação do público como costuma acontecer até quando entro em cena. Então, sinceramente, não sei como vai ser. Mas vou tentar fazer o melhor possível. É preciso se adaptar, aceitar esta nova realidade. É uma tentativa de sobreviver como artista. As limitações existem para todos, mas precisamos nos reinventar, tocar em frente o nosso trabalho”, pondera.
O espetáculo é a terceira imersão de Diogo no universo do cantor Cauby Peixoto (1931 – 2016), retratado por ele, em 2006, com o musical Cauby, Cauby, e em 2018, com Cauby! Cauby! Uma Lembrança. “Esta live é diferente das duas montagens. Me convidaram para cantar as músicas dele. Então, Flávio Marinho, autor do espetáculo, fez uma síntese, pegando parte do repertório e declarações que o Cauby deu. Foi interessante, porque já estava querendo fazer um show também”, explica o ator. Durante cerca de 50 minutos vai interpretar clássicos como Tarde Fria, Mulambo, Ne Me Quitte Pas, Dindi, Onde Anda Você e Conceição, a assinatura musical do intérprete. E ressalta que, em 2018, a montagem se tornou diferente por conta da morte do personagem retratado.
“Estávamos fazendo com a permissão dele, que tinha assistido várias vezes na primeira encenação e tinha gostado, porque eu não fazia uma imitação. Sinto o personagem e faço uma representação. Foi assim desde o primeiro espetáculo. Mas, então, ficamos abalados com a morte e decidimos fazer aquela homenagem”, pontua. E acrescenta: na infância, escutava Cauby, mas não era uma referência que o prendesse. Isto só aconteceu nos anos 2000.
O atual show solo vai ser transmitido online gratuitamente pelos canais YouTube do Sesc em Minas Gerais, do Teatro Claro Rio e pelo canal 500 da Claro TV. O ator estará acompanhado da diretora musical e pianista Liliane Secco e do saxofonista Fernando Trocado. “O palco é grande, estaremos distantes com todos os protocolos de segurança. Como tem acontecido nos ensaios em meu apartamento”, frisa o ator. Mais adiante, inclusive, Diogo planeja, ainda não sabe como, repetir a live deste show, seu segundo trabalho neste período pandêmico.
No início do ano, ele entrou para o elenco do humorístico Zorra, gravando em estúdio nos meses de janeiro e fevereiro. Atualmente realiza suas cenas de forma remota, em seu apartamento, no Rio. “Estou adorando, acho que o Zorra tem uma pegada moderna. Me espelho muito nos novos comediantes, gente interessante. Estou feliz de trabalhar com eles, que foram receptivos. Atuar com outra geração dá muito entusiasmo”, comenta e revela que tem contado com a ajuda do irmão e produtor, Marco Aurélio Montenegro (é dele a direção do atual show), que está morando com Diogo desde o início da quarentena. Os dois tinham acabado de retornar de São Paulo (onde o ator encenava a peça A Verdade) para o Rio, quando tudo começou. “Graças a Deus, estou com ele, que faz a câmera”, conta.
E prossegue, frisando que ainda está de quarentena. “Saio pouquíssimo para ir a uma consulta, dentista e mesmo assim por necessidade. Não estou dando mole. Sou multiatarefado, mas, às vezes, acho angustiante. É que meu apartamento tem várias áreas. Se tivesse mais confinado ia ficar aflito, porque não é fácil. Tento ocupar meu tempo para não pensar”, reconhece.
Além de ensaiar o espetáculo e gravar o Zorra, Diogo gosta de ler. Nesta fase, também tem assistido a reprise do seriado Toma Lá, Dá Cá, que ele gravou entre 2007 e 2009. “Tenho saudade daquela turma. O convívio era ótimo. Todas as reprises que tem sido exibidas nos fazem lembrar de uma época boa. Agora, estamos com este novo normal, sem liberdade de atuar, de conviver. Não vejo meus antigos trabalhos com olhar crítico, me penalizando, ainda mais porque não tem mais jeito, já passou”, reflete.
Regularmente, três vezes por semana, Diogo ainda pratica jump. “É um exercício aeróbico bom para ter energia, resistência”, ensina ele, que vai completar 63 anos, em 28 de outubro. “Sempre me cuidei, mas o corpo muda. A gente fica com o corpo correspondente a nossa idade. Às vésperas dos 63, não dá para ter corpo de 30. Eu acho. Mas tomando todos os cuidados você pode manter uma linha que fique interessante dentro de sua faixa etária. Gosto muito de malhar, tenho esta sorte”, aponta, tranquilo com relação a passagem do tempo.
“Feliz a gente fica independentemente da idade, porque, às vezes, com 20, a gente está deprimido. Aprendo bastante com o passar dos anos. Sai aquele alvoroço e começo a ter um olhar mais calmo sobre as coisas. Gosto dessa tranquilidade”, afirma. E completa: “São quase 63 anos muito bem vividos. Sou da geração Cazuza, uma geração interessante, a minha juventude nos anos 80”, ressalta. Foi época intensa, viveu os romances que desejava? “Não estou me despedindo não. Agora, minha vida foi sempre muito voltada para o meu trabalho, sabe. Senti uma necessidade na vida e não me arrependo de ter feito uma carreira com coerência. E as coisas vieram juntas e continuam agora nessa fase mais madura. Em relação a profissão, ela é longeva. Acabamos de ver Fernanda Montenegro, com 90 anos, dando show na TV”, diz, se referindo ao episódio de Amor e Sorte, exibido no último dia 8, na Globo. “Quando a gente fica mais velho o público é muito afetivo. Antes da pandemia, as pessoas me paravam bastante na rua. Tenho carinho por esta receptividade, porque faço meu trabalho para estas pessoas”, explica.
Por sua vez, seu aniversário será tranquilo, em casa, sem festa até por conta de seu estilo de vida. “Já fui bem festeiro. De um tempo pra cá tenho passado meus aniversários mais reservado, saio para jantar com amigos. Mas quando essa fase passar, quando liberar, vou dar uma festa para poder reencontrar todos eles. A pandemia não me deixou tão sem chão, porque estou acostumado a ficar mais quieto, tranquilo. Sou na minha, reservado. Tenho uma pitadinha de humor, mas para os íntimos. Não da para levar tudo a sério, o humor desopila. Agora, não saio fazendo piada o dia inteiro. Sou uma pessoa normal”, conta. Por enquanto, mata as saudades de todos pelo WhatsApp. Agora, solteiro quando a quarentena começou, da mesma forma permanece. “Estou bem assim, tranquilo, felicíssimo”, diz.
“Quer dizer, só não estou mais feliz pelo que está acontecendo no mundo à minha volta. Não dá para ficar feliz. Pelo contrário, fico estarrecido. Cada vez que vejo o noticiário os meus cabelos arrepiam. Parece que as notícias brigam para serem piores. Sinto muito pelas pessoas que estão passando por momentos difíceis, sofro muito. Dá desespero. Mas precisamos lutar para poder sobreviver”, desabafa.
Faz 25 anos que Diogo estuda canto. “É uma técnica que me interessa como trabalho”, diz. No palco, além de Cauby, Diogo já representou também outras personalidades da música: o cantor Nelson Gonçalves (1919 – 1998) e o compositor Ary Barroso (1903 – 1964), criador do clássico Aquarela do Brasil. E já sentiu vontade de retratar Adoniran Barbosa (1910 – 1982), que compôs Trem das Onze, entre outros sucessos. “Tenho alguns projetos. Um seria um espetáculo sobre ele, que é muito interessante. As músicas dele tem teatralidade”, argumenta. Tudo é pensado com calma. Na primeira montagem sobre Cauby, por exemplo, levou três anos estudando. “Faço um trabalho técnico apurado. São pessoas que tem uma assinatura, então, tecnicamente tento fazer o mais impecável possível. A vontade de homenagear essas pessoas, a paixão pelo trabalho delas é tão grande que sobrepõe a dificuldade”, pondera o ator, que tem profunda admiração por orquestra. Mas ele mesmo não toca nenhum instrumento. “Sou louco por música, por isso estudo canto. Adoro estar perto de pessoas que tocam piano, sax. É tudo comovente”, diz. Mas nunca cogitou se tornar um cantor profissional. “Gosto de ter um personagem, sabe quando você veste aquela roupa que cai bem. Ainda preciso ser aquele ator que interpreta alguém. Isso para mim é mais interessante”, finaliza.
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