Conhecido pelo grande público por desfilar seu talento e beleza em “Verdades Secretas”, Felipe de Carolis tem se mostrado uma verdadeira caixinha de surpresas quando a assunto é teatro brasileiro e musical. Apesar de ter começado na profissão com apenas oito anos de idade, no Tablado, sua estreia profissional aconteceu, mesmo, aos 12 e, de lá para cá, brilhou em diversas produções como “O Despertar da Primavera”, “Beatles num Céu de Diamantes” – ambos de Charles Möeller e Claudio Botelho –, e, mais recentemente, em “Incêndios”, na qual também assinou como produtor. Mas isso ainda não era o suficiente para o jovem artista de 27 anos. Tanto que agora ele repete a dobradinha com o diretor Aderbal Freire-Filho na peça “Céus”, escrita pelo libanês Wajdi Mouawad.
Em entrevista exclusiva ao HT, Carolis contou que decidiu encenar a peça à mesma época em que ensaiava “Incêndios” e via, do lado de fora do teatro, as ruas do país pegando fogo com as manifestações de junho de 2013. “A vontade de fazer ‘Céus’ nasce ali, de observar aquele movimento liderado pela juventude, e, ao mesmo tempo, o texto do Wajdi que ia nos mostrando até onde pode ir essa revolta se não olharmos para os mais novos. O fato de os atentados, em sua maioria, serem realizados por jovens entre 25 e 32 anos é assustador, e torna essa peça fundamental”, apontou ele, que ainda comentou o desejo de criar algo que dialogasse diretamente com a sua geração. “Eu queria muito fazer uma tragédia contemporânea. E como produtor eu queria criar algo que mudasse a cara do Rio. Acho que ‘Incêndios’ teve muito isso. Já em ‘Céus’, a gente fala sobre uma geração que é a minha. E logo em seguida começaram a surgir, infelizmente, os atentados na França, trazendo à tona toda essa questão”, comentou ele.
Na montagem, Um grupo de cinco pessoas da inteligência do esquadrão antiterrorismo é selecionado para tentar impedir que uma catástrofe atinja diversos pontos historicamente importantes para a construção cultural da era moderna. Com a suspeitas de simultâneos ataques à bomba espalhados por diversos continentes, eles são imediatamente levados para uma espécie de alojamento onde além da dura jornada de trabalho ainda precisam lidar com seus próprios fantasmas do passado e se conectar com a vida pessoal de cada um deles.
É com esse misto de tragédia contemporânea sobre a civilização atual e a inquietude do processo humano que Aderbal e Felipe colocaram um olhar brasileiro sobre a peça “Céus”, que segue em cartaz no Teatro Poeira, em Botafogo. Com Silvia Buarque, Rodrigo Pandolfo, Isaac Bernat e Charles Fricks, a peça integra a franquia que também conta com a peça “Incêndios”, protagonizada por Marieta Severo. Pois bem, por se tratar de um terrorismo motivado por uma rebeldia juvenil, Felipe comentou que, mesmo imunes aos bombardeios, o Brasil também tem o seu próprio temor. “A verdade é que a gente não tem segurança e tem medo o tempo inteiro. Mas pela tecnologia, universo que a gente toca aqui na peça, a gente tem uma rapidez de informação tão próxima que se acredita em uma talvez falsa estabilidade emocional. E como artista eu acho que a minha função é falar para a minha geração e levantar as questões que sejam críveis de debates”, ressaltou.
Na contramão de tudo o que vem sido produzido no país, foi após uma terrível doença que o ator decidiu embarcar em produções que, além de entreter, também fizessem alguma diferença na sociedade. “Quando eu trouxe ‘Incêndios’ para cá, em 2013, eu tinha acabado de me curar de um linfoma, que me fez refletir muito. Com essas situações muito graves a gente fica um pouco desnorteado. A partir daí eu decidi que iria fazer alguma coisa que deixasse uma herança para minha geração. Eu fiquei muito assustado na época, mas felizmente deu tudo certo tanto no tratamento quanto na peça, e nós estamos aqui”, revelou. Mas emplacar duas tragédias não foi uma tarefa muito fácil para Felipe. “Eu tinha lido muitas peças do autor, e sugeri ‘Céus’ ao Aderbal. Ele me questionou se eu aguentaria fazer outra tragédia, ainda mais agora que para conseguir patrocínio está super dificil. Encontrar alguém que queira investir em tragédia no Rio, então, é praticamente impossível, mas a gente reuniu uma equipe bacana e acho que deu tudo certo”, comemorou.
Apesar dos 15 anos de carreira, foi através do personagem Sam, da polêmica “Verdades Secretas” que Felipe ganhou grande notoriedade no país. Questionado, ele garantiu que o assédio aumentou e muito nas ruas. “Se eu falar que não é mentira. ‘Verdades Secretas’ foi um crescimento pra mim, uma grande vitrine em um lugar que eu nunca tinha tido acesso, ainda mais em uma novela das 23h. Fomos muito bem aceitos pelo público. Falar de trabalho pra mim é sempre ótimo, adoro falar de personagem e o porquê das coisas, sabe? Mas tem vezes que as pessoas passam do limite, óbvio, mas a gente vai aprendendo a lidar”, comentou ele, que não soube opinar onde se sente mais à vontade trabalhando. “Eu não sou preconceituoso com absolutamente nada. Eu amo série, cinema, teatro e televisão. O que eu puder acrescentar a uma obra e a obra puder acrescentar a minha trajetória como artista está valendo”, avisou.
Atento aos movimentos políticos do país, Felipe de Carolis adiantou que a captação de recursos para montar uma peça no Brasil tem sido cada vez mais complicada. Apesar de estar emplacando sua segunda montagem nos palcos, ele garantiu que os patrocinadores têm virado a cara para o gênero da tragédia. “As pessoas acham que eu sou louco em investir nisso, especialmente nesse momento. Existe uma caça às bruxas nessa CPI da Rouanet, que eu acho legal, porque se existem pessoas cometendo crimes, que elas sejam punidas. Mas quando generalizam o processo, isso tudo acaba respingando em pessoas honestas”, avaliou o ator, sem deixar seu engajamento político de lado. “Qualquer extremismo é um grande equívoco. Fiquei muito triste com esses excesso de acusações e dedos apontados. Sobre a queda do Cunha, eu sou absolutamente a favor. No entanto, nunca votei no PT, mas não vejo a Dilma como culpada por um histórico de 12 anos. Infelizmente aconteceu dessa maneira, mas espero que a gente consiga logo novas eleições diretas e que as pessoas parem de se agredir através das redes sociais”, completou.
Serviço: Teatro Poeira – Rua São João Batista, 104, Botafogo. Quinta a sábado, 21h; domingo, 19h. R$ 80,00. Bilheteria: 15h/21h (ter. e qua.); a partir das 15h (qui. a dom.).
Artigos relacionados