No ar com a série “Assédio” na Globoplay e prestes a trazer para o Rio de Janeiro, o seu espetáculo solo “PULSO- a partir da vida e da obra de Sylvia Plath”, a atriz Elisa Volpatto está em um grande momento de sua carreira. Assumidamente feminista e envolvida da cabeça aos pés com a questão das mulheres na sociedade, a artista vem tentando fazer a sua parte contra um sistema que condena muitas de nós, todos os dias. Em conversa com o site HT, Elisa declarou toda a sua força, resistência e amor pela arte e pelas mulheres.
Na premiada série Assédio, da Rede Globo, Elisa interpreta a jornalista Mira, responsável por reunir os depoimentos das vítimas do então médico Roger Abdelmassih. Partindo de uma história real, quando ainda era apenas uma estagiária, a jovem recebeu um telefonema que denunciava anonimamente o médico, mas sem outras provas, não pôde fazer nada. Anos depois e com novos fatos sobre o caso, Mira se vê novamente diante dessa situação e resolve investigá-la a fundo. “Eu fiquei muito feliz com a minha personagem porque ela é uma das pessoas que ajuda essa vítima. Uma das coisas que a defesa do Roger alegava é que não havia provas, mas a Mira reuniu o depoimento de mais de 50 mulheres falando a mesma coisa. Isso não é importante? Minha personagem mostra que esses relatos são provas vivas”, afirmou a atriz. Para ela, tratar de temas tão delicados é crucial: “É uma história real, com pessoas reais e isso é quase que inacreditável. Eu considero essa série como um serviço social mesmo, porque se não falarmos sobre esses temas, eles não vão sair do escuro”. Relacionando a obra com um contexto mais atual, Elisa demonstrou ser adepta do antigo ditado que prega a união como potencializadora da força: “É o que estamos vendo agora com essa situação do João de Deus. É tão comovente quando uma fala, outras se encorajam e colocam para fora também. Dá para perceber o tanto de medo e vergonha envolvidos. Só quem passa por isso sabe e juntas somos mais fortes”.
Além de estar envolvida com a positiva repercussão que a série gerou, a artista está prestes a abrir a primeira temporada do espetáculo “PULSO- a partir da vida e da obra de Sylvia Plath”, em solo carioca. Trazendo mais uma vez a questão da mulher na sociedade, a peça, que existe desde 2016 e já passou por São Paulo e Porto Alegre, retrata a jornada tripla das mulheres. “Eu me interesso muito em falar sobre o espaço da mulher na arte, dentro da criação e nesse lugar de divisão entre a maternidade e sua profissão, sua independência. A Sylvia foi uma revolucionária, em uma época que a mulher tinha que ficar em casa esperando o marido com o jantar pronto. Ela não queria aquilo, sabe? Queria escrever, produzir a sua arte, seus poemas. Isso tendo 2 filhos para cuidar. Imagina dificuldade de ir conta a maré nos anos 50?”, explicou. Embora tenha escrito bastante, Sylvia não encontrou espaços de divulgação do seu trabalho, tornando-se conhecida apenas depois de sua morte. Para Elisa, a realidade atual não é muito diferente: “A gente ainda batalha muito para ter um lugar na nossa profissão e conseguir dar conta das tarefas em casa. É uma rotina muito cansativa e que sobrecarrega muito todas nós. Esse espetáculo me toca demais e acaba falando um pouco de mim também. Através da história da Sylvia, a gente fala de todas as mulheres, de nossas mães, avós, todas nós”.
O espetáculo, dirigido pela companheira e amiga Vanessa Bruno, faz também a transposição da literatura para os palcos. “A Vanessa me fazia perguntas e eu tinha que responder cenicamente, por meio de uma dança, um texto, uma performance, uma música. Nessas respostas eu fui trazendo trechos de cartas, poemas e biografia da Sylvia. Assim, fomos criando esse espetáculo de forma processual a partir da cena”, contou a atriz, que convidou a diretora anos atrás, por conta do seu trabalho de transformação de obras da literatura em textos teatrais. “Ela desenvolveu diversos procedimentos para trabalhar com um texto que não está pronto para o teatro ainda. Foi o casamento perfeito”, admitiu.
A partir dessa sintonia entre as duas, foi criado o Vulcão, projeto que deseja aproximar diferentes linguagens, unir dança ao teatro, literatura e vídeo. Juntas uniram-se aos artistas Livia Vilela, Paulo Salvetti e Rita Grillo, todos almejando concretizar suas pesquisas artísticas e criações autorais. “Quando nos demos conta tínhamos um repertorio de trabalhos de mulheres importantes no século XX e resolvemos abraçar essa questão do papel social da mulher e transposição da literatura”, informou a propositora, que, a partir do Vulcão, trabalhou com obras de Clarice Lispector e Marguerite Duras. O próximo projeto do grupo é abraçar os textos da escritora Virgínia Woolf. “É super importante para nós, porque a Virginia é quase que a mãe de todas elas, sabe? Tudo parte dela, que é uma feminista declarada. Ela já pressupunha várias coisas que estamos falando hoje”, reforçou.
Todo esse amor e dedicação à arte, segundo Elisa, vem da sua infância. Sempre incentivada pela família, a jovem desde cedo esteve em contato com filmes e obras clássicas. “Acho que de alguma maneira eu sempre estive ligada a parte artística. Fui muito estimulada pelos meus pais, apesar de eles não trabalharem com arte”, explicou. De uma cidade bem pequena, no interior do Rio Grande do Sul, ela se viu fazendo todas as vertentes artísticas possíveis: “Onde eu morava não tinha teatro, então fazia todo o resto. Eu dançava no ballet, cantava no coral e adorava, sabe? O meu pai também é muito ligado em cinema, então eu fui apresentada a clássicos ainda bem pequena e fui me despertando para essa vontade de viver outras histórias que não eram a minha”.
Nesse mesmo berço, onde descobriu o amor pela arte, Elisa descobriu a injustiça na forma como as pessoas são tratadas, principalmente as mulheres. “Eu via o meu irmão homem tendo privilégios que eu e minha irmã não tínhamos”, admitiu. Hoje, aos 32 anos, ela tenta mudar o seu pedacinho de mundo, não só através do seu trabalho, mas de sua vida pessoal. “Em algum momento, eu fiquei quieta e normalizei toda essa questão. Mas hoje, eu não fico calada mesmo porque eu entendo o meu lugar e o meu espaço como mulher na sociedade. Sou filha e uma futura mãe. Eu continuarei ocupando o meu espaço, não me vejo mais sendo assediada em qualquer nível e achando normal. Também não fico e não ficarei quieta quando vejo acontecendo com outras mulheres, procuro da melhor forma possível ajudar e combater. Não pode passar em branco, porque os homens não podem mais se sentirem autorizados a fazer o que bem entendem conosco”, informou, muito consciente. Para ela, o momento é de transformação e a arte pode e deve desempenhar um papel extremamente importante: “Claro que a arte também leva essa questão do entretenimento, mas não podemos nunca esquecer desse papel político e social, que foi onde ela nasceu. Toda essa estrutura patriarcal, onde as mulheres sempre tiveram menos espaço, menos palavra. Os homens sempre dominaram e nós nunca fomos encorajadas a ir contra isso. É uma cultura muito enraizada nas nossas mães e avós. A gente está num momento de ir quebrando isso, mas é pesado”. E continuou: “É um trabalho de criação e tomada de consciência”.
Em meio ao momento de avanço do conservadorismo político e social, motivo pelo qual muitos artistas perdem as esperanças, Elisa enxerga uma razão para acreditar. “Não será fácil, mas eu acredito que esse momento nos proporcione um florescer muito grande entre as pessoas que acreditam na abertura e na libertação. Se querem que a arte retroceda, nós vamos ocupar de outras formas, vamos paras as ruas, vamos fazer teatro em outros meios, tudo com muito mais potência e força. É um estimulo grande para os artistas e não podemos esquecer disso. Surgirão coisas incríveis porque são nesses momentos de obscurantismo que a arte surge como transcendência, trazendo outras visões de mundo”, opinou. Ela, em 2019, além de estar envolvida com o espetáculo da Virginia Woolf, que deverá ser lançado no segundo semestre do ano, estreará o seu primeiro longa-metragem, dando continuidade a sua carreira no cinema. Independente dos trabalhos nos quais Elisa estará envolvida, temos a certeza de que ela estará unida a todas as mulheres, artistas ou não.
SERVIÇO
PULSO – a partir da vida e da obra de Sylvia Plath
Temporada: de 08 a 30 de janeiro de 2019
Local: Teatro Poeira (Rua São João Batista, 104 – Botafogo)
Horário: terças e quartas, às 21h
Ingresso: R$ 50,00 e R$ 25,00 (meia)
Telefone: 21 2537-8053
Bilheteria: terça a sábado, das 15h às 21h | domingo, das 15h às 19h
Duração: 50 minutos
Classificação Indicativa: 14 anos
Capacidade: 130 lugares
Gênero: drama
Vendas antecipadas: www.tudus.com.br
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