Sabe aqueles artistas que não conseguem viver sem trabalhar? Priscila Steinman resume bem esta característica. A atriz, aliás, participou recentemente da novela Novo Mundo. “Minha personagem se chamava Isaura e foi uma experiência muito bacana”, contou. Ainda na Rede Globo, a também roteirista está desenvolvendo um projeto de dramaturgia com supervisão de Rosane Svartman que ainda não tem uma cara definida, podendo originar vários programas diferentes. Apesar de ter aparecido muito nas telinhas nos últimos três anos, Priscila não abandonou os palcos. Ela está em cartaz no espetáculo Rita Formiga, com direção de Fernando Philbert e texto de Domingos Oliveira. O monólogo é um depoimento de uma mulher da década de 60 que fala sobre seus amores, trabalhos, lutas diárias e percepções de vida, características que fizeram a atriz se apaixonar pelo papel. “Eu me identifico com a personagem emotivamente e acho que isso me aproximou dela. Meu apreço pela vida se parece com o dela. A Rita erra muito, mas transforma isto em aprendizado. As coisas atravessam ela e, mesmo que tenha sido impactante, consegue superar e seguir em frente. De acordo com o diretor, tenho uma pureza que me permite transitar entre a alegria e a grosseria que a Rita, às vezes, diz em apenas uma fala. Esse é o resumo da peça. A gente fala sobre lutar e correr atrás dos desejos de cada um”, sintetiza.
Rita Formiga é uma personagem irreverente que luta pelo seu espaço no mundo. De acordo com a atriz, a personalidade dela resume a busca por aceitação e liberdade afetiva que as mulheres têm reforçado ao longo das gerações. “Estamos levantando um discurso feminista fundamental. E, na minha opinião, a Rita é um espelho disso pelo fato de fazer o que queria. Quando estava gostando de um cara, dizia. Ela não é consumida, ela consome”, acredita. Este não é o primeiro espetáculo do diretor Fernando Philbert que incita o debate do tema. A produção ‘O Corpo da Mulher como Campo de Batalha’ foi realizada recentemente e traz uma história emocionante envolvendo abusos psicológicos e sexuais. “No entanto, na outra peça a mulher tinha um papel de vítima por ter sido estuprada. Já Rita é agente, defende suas ideias de peito aberto, uma líder. Ela trabalha e vive com o que quer. Ainda mais que, na década de 60, a repressão conseguia ser maior do que a que sofremos hoje”, comenta Priscila.
O diretor foi quem trouxe o texto para Priscila na esperança de que ela gostasse da história. Ambos já haviam trabalhado juntos antes, em 2012, com a peça chamada ‘O céu está vazio’. “Tivemos uma sintonia profissional de cara. Durante a leitura do roteiro, me emocionei e ri por se tratar de assuntos humanos com uma dramaturgia encantadora e extraordinária”, relembra a atriz. Muita coisa aconteceu após a escolha o roteiro, foram alguns meses até que ambos decidissem seguir com o espetáculo. “Trabalhar com cultura no Brasil é um processo muito longo, demoramos um ano e meio para montar a equipe. Quando conseguimos levantar uma peça, isto se torna uma conquista”, lamenta.
Uma das maiores dificuldades que enfrentaram foi a ausência de patrocínio ou qualquer verba de apoio. Isto levou Priscila a questionar se deveria continuar com o seu primeiro monólogo. “Não conseguir patrocínio me fez repensar se esta peça deveria mesmo ser feita, se deveria embarcar nesta aventura. Para tirar a dúvida, comecei a ler novamente o texto. Quando cheguei ao fim, uma frase da personagem me convenceu: ‘A gente precisa fazer isto, porque se não fizermos, o que a gente vai fazer?’. Isto resumiu tudo, se eu não fizer teatro falando algo que acredito, o que mais posso fazer? Desde então, bati o martelo e resolvi ir em frente com o espetáculo”, comemora a atriz que está muito orgulhosa do trabalho e da aceitação do público com a produção.
De certa forma, o espetáculo é uma homenagem ao autor Domingos, em razão de seu aniversário de 80 anos, no ano passado. A atriz quis passar todo o respeito que ela sente pelo escritor. “O Domingos está muito presente nessa peça, deixamos com a cara dele. Ele foi na estreia e nos contou que riu e se emocionou, aplaudindo de pé, fez elogios que nunca vou esquecer. Isto foi maravilhoso para mim porque foi um encontro da Priscila atriz e roteirista com a dramaturgia de um ícone como ele”, enaltece.
O respeito com relação ao autor durante a produção desta peça era essencial, principalmente, por se tratar de um roteiro baseado em fatos reais. “O Domingos, no final dos anos 60, tinha uma vizinha e amiga que usava o telefone dele todos os dias para bater papo. Ele ficou mais interessado pelas histórias que a atriz Maria Gladys contava no telefone do que o texto que estava trabalhando no momento. A partir de então, gravou todas as conversas e isto serviu de inspiração para o roteiro. A personagem acaba sendo um recorte daquela geração e, na minha opinião, a Rita Formiga é um alter ego do autor. Como ele seria na pele de uma mulher”, sugere a atriz.
O texto já havia sido montado antes com participação das atrizes Zezé Polessa e Guta Stresser, o que acaba sendo um desafio contar a história de uma maneira diferente. “A Marieta Severo veio ver a peça mesmo já tendo assistido as anteriores e disse que a pegada é completamente diferente”, menciona. No entanto as dificuldades não param por aí. De acordo com Priscila, a maior responsabilidade foi representar nos palcos as pessoas que viviam naquela época, com costumes e opiniões muito diferentes. “A peça fala muito sobre o encontro das gerações. Um exemplo disso é que a personagem vivia no Solar da Fossa, um local onde vários artistas moravam no final dos anos 60. Foi lá que começou o Tropicalismo e onde morou Gal Costa, Caetano e Gilberto Gil. As pessoas criavam coletivamente naquele espaço, tinham uma troca artística muito forte, algo que acontece pouco hoje. Para entender esse costume, li muitos livros sobre aquelas pessoas e vi filmes da época. Sinto que estou sendo a ponte entre a minha geração e a passada”, acredita a atriz.
Durante a pesquisa da personagem, um dos principais objetivos dela era trazer características que as diferenciasse. Segundo Priscila, o distanciamento entre atriz e personagem a faz sentir que seu papel de artista foi cumprido. “Gosto que as pessoas não me reconheçam porque quero que enxerguem o personagem e não a Priscila. Fico orgulhosa quando dizem que não sabiam que eu tinha vivido aquela história. Gosto sempre de embarcar na história”, informa.
Nos últimos três anos, a atriz passou por vários papéis diferentes. Somente na televisão, participou de ‘Totalmente Demais’, ‘Justiça’ e ‘Questão de Família’. “A novela se diferencia muito de uma série porque esta já é um projeto fechado então o ator tem mais tempo para pensar naquele personagem. A série da GNT ‘Questão família’ tinha uma equipe e equipamentos de filme. A minha personagem era muito intensa, tinha depressão o que deixava as coisas ainda mais difíceis para mim”, conta.
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