*Por Karina Kuperman
Há quase duas décadas no ar, o “Big Brother Brasil” segue líder de audiência, mas esse ano, virou caso de polícia. Logo no começo da edição, o coordenador indígena Vanderson Brito foi desclassificado por denúncias de agressão por parte de uma ex-namorada e, ao sair para depôr sobre o caso, quebrou as regras de confinamento. Mas o que tem dado o que falar nas redes sociais são os comentários da participante Paula Von Sperling que, mais de uma vez, fez insinuações preconceituosas e racistas.
Apesar de internautas terem subido a hashtag “BBB protege racista”, a loira parece ter conquistado fãs. Mesmo diante de toda a repercussão, nenhuma providência foi tomada de fato e Paula voltou de alguns paredões. Apesar de seus discurso supostamente racista, de ex-participantes comentarem ter se sentido pessoalmente ofendidos e até de um inquérito instalado, a loira ainda é uma das favoritas ao grande prêmio. Paula não parece fazer “por ingenuidade”, como sua família insiste em defender em entrevistas. Ela tem consciência de suas falas, tanto que, diversas vezes, chegou a se “justificar”. “Desculpa, Brasil, foi sem querer. Eu sou assim desde pequena” e “Eu só falei a verdade”.
A história ganhou um novo capítulo depois que Rodrigo França e Gabriela Hebling saíram do jogo, na última semana. Em entrevista no “Mais Você”, já fora da casa, o produtor cultural afirmou: “A gente vai processar, em relação ao racismo religioso. A minha família cultua o candomblé, que não tem estrutura de catequizar ninguém. Não cheguei no programa para isso. Não é só por mim, é por um povo, uma população que cultua algo e é desrespeitada. Não posso me calar de forma alguma”.
Adalberto Neto, assessor de imprensa de Rodrigo, esclareceu: “Passei a noite da eliminação com Rodrigo e ele recebeu os comentários de Paula com serenidade. Ele falou que não pode ficar assim porque na militância, ele defende quem sofre com isso e, agora, ele mesmo está sofrendo e tem voz para se defender. Ele falou: ‘Tenho que fazer isso não só por mim, mas pelos meus’”, contou.
E, de fato, Rodrigo já esteve na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) do Rio de Janeiro para prestar sua queixa, que é uma exigência processual para o prosseguimento, já que a ofensa foi dirigida a ele. Agora, ganha reforço da amiga Gabriela, eliminada ontem.
“Vi uns vídeos polêmicos na madrugada e vou fazer alguma coisa, principalmente sobre intolerância religiosa. Eu respeitei tudo lá dentro. Vou conversar com Rodrigo”, disse a ex-participante durante o “Mais Você”. Além do boletim na Delegacia de Crimes Raciais, Rodrigo e Gabriela vão se unir para formalizar a denúncia após serem eliminados e checarem todos os vídeos.
Vale lembrar que desde o início do programa, tanto Gabriela como Rodrigo mostraram muita paciência ao falar sobre o assunto e, em várias rodas de conversa, tentaram esclarecer expressões e comentários racistas para os demais brothers. Em certa ocasião, os dois explicaram para os colegas de confinamento sobre o preconceito que já enfrentaram por conta de sua cor.
“Existia uma ideologia do embranquecimento para melhorar a condição econômica-político-social do Brasil de que teríamos que embranquecer o Brasil. Então, trazem pessoas europeias pra cá e aí você tem uma política da sociedade e isso é história mesmo. Aí tem uma campanha para isso. Nasce também a nomenclatura pardo. Em vez de sinalizar que as pessoas são negras, as pessoas são pardas. Tanto que na minha certidão de nascimento está escrito pardo”, contou Rodrigo. “Na minha também”, endossou Gabriela, à época.
Não foi suficiente para Paula entender. A sister, que é bacharel em Direito, entoou repetidamente comentários. Durante um bate-papo, ela sugeriu que piadas contra “loira burra” podem ser equiparadas a racismo: “Vamos supor. Alguém faz um ato de racismo contra um negro. Fala assim: ‘Você é um neguinho não sei o quê’. Mas e se chega numa loira e fala: ‘Essa é uma loira burra e tal’. Começa a denegrir a pessoa por ser loira”. “Mas não é racismo”, contestou Gabriela. “Não é racismo. Lógico que não é racismo”, concordou a loira.
Em outra ocasião, enquanto contava a história de uma mulher que foi esfaqueada pelo marido, Paula disse ter ficado surpresa pelo fato do assassino ser “branquinho”. Em uma terceira vez, se referiu ao cabelo cacheado como “cabelo ruim” e disse que a expressão “humor negro é você pegar uma pessoa negra e começar a fazer piadinhas contra ela”. Na mesma hora Gabriela rebateu: “Você entende como a palavra negra sempre entra em um lugar ruim? Não tem humor branco, entendeu?”. Mas Paula insistiu: “É porque é uma piada ruim que não deveria ser dita. Quando a gente pesquisa humor negro no Google tem um monte de piada racista. Não sei o que seria humor negro para vocês”. Ela também chegou a dizer que tinha medo de Rodrigo porque ele “mexe com esses negócios de Oxum”, referindo-se à religião de matriz africana do produtor de eventos carioca.
Essa não é a primeira vez em que participantes de reality show agem dessa forma na televisão, mas é a primeira em que essas situações foram questionadas de modo contínuo dentro da própria casa.
O delegado Gilbert Stivanello, titular da Delegacia de Combate a Crimes de Racismo e Intolerância do Rio de Janeiro, disse que há um procedimento instaurado desde o dia posterior à fala ofensiva de Paula no “BBB” sobre a religião de Rodrigo. A sister será ouvida assim que for eliminada ou após a final do “BBB”, que termina no próximo dia 12. A pena para o crime de injúria por preconceito varia de um a três anos de reclusão e multa. Assim é a vida fora da televisão. Assim é a vida real.
Artigos relacionados