Da qualidade do cinema nacional à bancada evangélica do Congresso, um papo com Fábio Porchat: “O problema é a religião pautar a sociedade”


O humorista conversou com HT antes de apresentar o stand up “Fora do normal” nos dia 26 de agosto em Vitória (ES). Fábio falou da liberdade na TV aberta – “você não pode falar palavrão às 10h” – e da descriminalização da maconha: “Não acho que a descriminalização é a solução, mas a legalização”

“Eu sou ateu. Não acredito em nada. Absolutamente nada. Pra mim morreu, morreu, antes ele do que eu”. Foi assim, em uma de suas crônicas para um jornal paulistano, que Fábio Porchat tornou público seu ateísmo. Nada que causasse muito espanto vindo de alguém que, em um vídeo do canal “Porta dos Fundos”, tenha dito que “Deus é gay” – justificado num roteiro muito bem humorado e trabalhado, diga-se de passagem -. “As pessoas tem peninha de mim [por ser ateu]”, ironizou o comediante em entrevista ao HT direto de Porto Alegre (RS).

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O que não deve ser fácil em suas condições ideológicas é encarar um Congresso Nacional tomado de bancadas religiosas – que só aumentam e que ditam as pautas a partir de seus princípios cristãos. Situação que Porchat não vê com maus olhos, para nossa surpresa. “O problema não é a bancada crescer, até porque têm religiosos ótimos. O problema é a religião pautar a sociedade, é interferir na decisão de uma pessoa. O que eu discordo é não podermos evoluir porque uma crença particular impede isso de acontecer. O debate sobre a descriminalização das drogas e sobre aborto, por exemplo, não ocorre por conta de religião”.

Aliás, não ocorria. A pauta sobre o porte da maconha, por exemplo, está neste momento deixando o Supremo Tribunal Federal em polvorosa. Fábio, dessa vez, prefere não se posicionar. “Não faço a menor ideia [do que acho]”, disse explicando: “Não sou médico e não sou usuário”. Mas nada como uma insistência. “Me parece que a luta contra as drogas, como é hoje, está equivocada. Como está [a situação] hoje não está bom. O que eu sei é que sou um Drauzio Varella [oncologista paulistano] de carteirinha. Em Portugal [eles descriminalizaram e]os índices diminuíram, foi ótimo. Não acho que a descriminalização é a solução, mas a legalização”, opinou.

Polêmicas à parte, Fábio Porchat continua no mesmo ritmo frenético de sempre: com trabalhos mil e poucas horas de sono (aliás, uma dessas foi atrapalhada para essa entrevista). “Durmo às quartas-feiras por volta de 03h, mas dá para conciliar tudo”, brincou. Pedimos então para ele listar esse “tudo”. “Estou em cartaz em São Paulo com duas peças, o stand up ‘Fora do normal’ – que também roda o Brasil – e ‘Meu passado me condena’. Têm três vídeos por semana no ‘Porta dos Fundos’ e todas as terças-feiras o ‘Porta afora’, com minhas viagens”. Se você acha muito, Fábio não. Ele nega mais convites que aceita. “Aparecem muito mais propostas. Faço esses porque são todos projetos meus. Eu que criei, eu que corri e corro atrás, partiu de mim. É o que eu fiz e o que eu gosto”, deixou claro.

O ‘Fora do normal’, que ele apresenta no próximo dia 26 de agosto em Vitória (ES), é um dos que apresentam maior liberdade humorística – já que está fora de qualquer canal de TV e foi escrito pelo próprio. Mas nada que deixe o parâmetro da graça como algo mais fácil de se lidar. “É muito relativa essa coisa de ter graça e não ter graça. O limite do humor é você achar graça daquela história. Se você, enquanto humorista, achar graça e querer bancar, está ótimo”. Por outro lado, arriscado é. E ele admite. “A gente só vai saber se funciona quando contar para alguém. Não tem uma matemática. Cada um tem que imaginar”. Por raciocinar dessa forma, Fábio não se amarra. “Não tenho muito trava, de um modo geral eu falo de tudo”.  O mesmo discurso, porém, não vale para a televisão. A aberta, em que fez “A Grande Família”, principalmente. “Você não pode falar palavrão às 10h. A TV fechada é um lugar muito livre, na aberta é outra história, é diferente”, confirmou.

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Com um programa semanal de viagens na internet, Porchat compartilha boas lembranças de quando foi turistar numa tribo indígena do Acre. Mas não fala com o mesmo entusiasmo dos Lençóis Maranhenses, por exemplo. “Eles são lindos, mas no dia que eu fui não tinha água”, riu. Presença recente nas colunas de fofoca sendo apontado como namorado de Nataly Mega, diretora de produção do canal de vídeos “Porta dos Fundos”, ele acha que parte da imprensa está tomando um caminho errado. “A imprensa usa a desculpa de que o público quer ver isso. Mas quando tem um acidente na estrada o público quer ver e não é por isso que a gente faz um site com fotos de corpos”, argumentou. Para Fábio, que tenta não se apegar a isso, já que “cada veículo diz uma coisa”, esse tipo de notícia não tem interesse nenhum. “O público quer saber qual meu próximo filme, isso sim. Hoje em dia pegam o que eu escrevi no meu Twitter e fazem uma matéria. É uma loucura porque você não quer que aquela matéria saia. Essa entrevista que eu estou dando, sim, eu quero que seja veiculada”, desabafou.

Fábio, que acabou de entregar ao mercado a continuação do filme ‘Meu passado me condena’, está feliz da vida: o longa fez a maior bilheteria de um filme brasileiro lançado nas férias de julho. E não é por isso que ele concorda com a crítica de que o cinema brasileiro está inflado de comédias caça-níqueis. “Não é qualquer comédia que faz sucesso. Quem faz sucesso são os atores. É o Paulo Gustavo, o Leandro Hassum, a Ingrid Guimarães. Mas também tivemos ‘Super pai’ e a continuação de ‘Qualquer gato vira lava’ que não fizeram um milhão e são ótimos filmes”, opinou. Com um discurso quase sempre formado, Fábio encerra contando que, apesar de ter um espetáculo chamado “Fora do normal”, é mais careta que possamos imaginar. “Eu de modo geral sou bem fora do comum. Tento sempre estar fora da curva e observar as pessoas que estão dentro dela. Eu sou muito caseiro, não sou de balada. Sou calmo”. Assim ele encerrou a conversa e foi se preparar para fazer quatro sessões seguidas de seu stand up na capital gaúcha. Tempo de sobra para fazer rir. Talvez por isso Fabio decidiu antes, aqui, fazer pensar.

Serviço

Fábio Porchat – Fora do Normal

Data: 26 de Agosto de 2015

Local: Centro de Convenções de Vitória

Horário: 20h00 (Abertura do teatro: 19h00)

Classificação: 14 anos

Valores: de R$ 40,00 (meia) a R$  70,00 (meia)

Ponto de Venda: http://www.blueticket.com.br/14672/Fora-do-Normal-com-Fabio-Porchat/