Comédia ‘Não Queimem Nossos Soutiens!’ traz elementos históricos para sustentar a conversa de duas mulheres que falam sobre problemas e angústias da vida moderna


Escrito por Ana Bugarim e com atuação da própria, a peça convida o público a espiar o universo feminino e as razões que nos levaram ao panorama atual

Ana Bugarim se considera mais atriz do que escritora, mas o texto da peça ‘Não Queimem Nossos Soutiens!’ mostra que seja qual for a função, ela consegue tirar de letra. No roteiro, casos pessoais e de conhecidos são sustentados por referências históricas importantes como a ativista estadunidense Betty Friedan, que aparece em cena como o alter ego de uma das personagens. A ideia é trazer de uma forma bem-humorada as questões, frustrações e anseios da mulher moderna com relação aos tabus e à sexualidade. O título, por exemplo, faz referência a um protesto feminista da década de 60 no qual soutiens, batons e outros objetos do universo feminino foram expostos para questionar o que significava o belo. “A sociedade precisa se livrar dos tabus e abrir a cabeça para novas possibilidades. A ideia é que as pessoas se sintam confortáveis para debochar de seus próprios problemas e intimidades. Na peça, por exemplo, a primeira pessoa de quem estou rindo é de mim mesma, como pessoa. Mostro vezes que levei foras, obviamente, com uma lente de aumento. As histórias são criadas, mas a inspiração veio de situações que ouvi de amigas e minhas próprias vivencias”, contou Ana, que além de escrever interpreta uma das protagonistas.

Katia Moraes, Miguel Romulo, Carla Daniel e Ana Bugarim vivem personagens que questionam o universo moderno (Foto: Divulgação)

Apesar de não ser autobiográfico, o espetáculo traz elementos muito pessoais da atriz. Ana Bugarim vive Malu, uma mulher solteira, carente e independente que está em uma conversa muito particular e interessante com a amiga Chris que é casada, submissa e frustrada com a vida pessoal. “Eu estava conversando com uma amiga sobre a nossa vida. Na época, eu era solteira e ela, casada, mas se sentia muito infeliz no relacionamento porque o marido só a procurava para reclamar. Buscando entender como ela aceitava os maus tratos, comecei a perceber que aquela discussão resultaria em uma peça. Nós duas comentávamos sobre a vida uma da outra de uma forma muito humorada por vivermos experiências completamente opostas. Assim que desliguei o telefone comecei a escrever e acabei incluindo a Betty Friedan que seria o alter ego da minha personagem. Resolvi inseri-la, porque durante a minha faculdade, fiz uma pesquisa intensa sobre ela e achei bacana ter um terceiro elemento”, relembrou a atriz. Apesar de na vida real o espírito da ativista não ter aparecido, no espetáculo aparece para confrontar as duas, afinal, a verdadeira americana, falecida em 2006, era respeitada por sua influência feminista iniciada pelo livro de sucesso ‘Mística Feminina’. A amiga e a estrangeira são interpretadas pelas atrizes Carla Daniel e Katia Moraes.

Além do diretor Claudio Torres Gonzaga, o ator Miguel Rômulo representa os homens na peça. Muitos rapazes, na realidade, que somam um total de 14 papéis. Dentre o núcleo de atores, ele é o único que desempenha mais de um ao viver amores e pessoas importantes que passaram pela vida das principais. “O Miguel faz os homens que a Malu e a Cris já se relacionaram, desde o marido até um mestre de genética já que a minha personagem faz inseminação artificial por se lembrar que um professor na faculdade disse que os óvulos da mulher tinham uma certa data de validade. O ator está realizando de forma muito positiva estes personagens”, comemorou Ana.

O espetáculo estreia dia oito de agosto (Foto: Divulgação)

Existe uma extensa lista de questões levantadas pelos personagens e, nesse momento, a plateia é consultada também por Betty. No meio destas teorias, o trio começa a se perguntar se o protesto da queima dos soutiens foi realmente importante para a sociedade atual. Na visão particular de Ana Bugarim, o ato foi chocante, mas necessário para aquela época. “Na década de 60, existia uma necessidade de rompimento. Era preciso ser radical para desconstruir a narrativa. Acho que a bandeira atual que estamos levantando pode nos levar a lugares muito bacanas sem perder o lado feminino”, sugeriu. Para Ana, o feminismo hoje tem caminhado para uma rota mais tranquila do que na geração de 60. “Acredito que, hoje em dia, as mulheres têm o direito de escolher e serem livres para viver o que querem”, completou o que explica ser a principal mensagem que procurou deixar para o público.

Apesar de trazer uma personagem feminista e um título que invoca um momento no qual o movimento estava em alta, Ana Bugarim não se considera uma ativista do grupo. A mesma procura deixar claro que a peça também não tem a intenção de levantar qualquer bandeira e deve ser encarada como uma sátira. “Trabalho e sou mãe, ao mesmo tempo, por isso me considero uma mulher moderna. Fui criada para ser livre e não apenas casar e ter filhos. O feminismo, atualmente, está em voga e, às vezes, me perguntou se sou. No sentido do respeito ao feminino e da igualdade de salários, me sinto totalmente a favor ao movimento. Exatamente por isso, eu não levanto nenhuma bandeira na peça. A ideia é fazer uma sátira bem leve e engraçada sobre os dias atuais, sem criticar os homens ou algo do gênero. As pessoas vão poder olhar pelo buraco da fechadura o que nós pensamos”, brincou a atriz.

Claudio Torres é o responsável por dirigir a peça de Ana Bugarim (Foto: Divulgação)

Desde os acontecimentos que levaram a atriz a escrever, em 2012, a produção só começou apenas cinco anos depois podendo ser conferida no dia 8 de agosto no Teatro Vannucci, Rio de Janeiro. Grande parte da demora para estreiar o projeto se deu devido a crise monetária que tem afetado diversos pontos do estado, inclusive, a classe artística. “Antes de tudo, sou uma atriz, a escrita fica em segundo plano, por isso demorou um pouco para terminar a peça, pois fui escrevendo aos poucos. Os problemas do país dificultaram o acesso a patrocínios, tentei desde editais até leis. Depois de muito tempo, resolvi investir um dinheiro que tinha guardado nesta peça, porque considerei muito importante falar sobre estes temas. Consegui uma equipe incrível e apoio de alguns lugares que ajudavam com o que podiam”, contou.

 

Serviço:

Não Queimem Nossos Soutiens!
Em cartaz: Todas as segundas e terças, até o final de setembro
Horário: 20h
Local: Teatro Vannucci (Shopping da Gávea)
Endereço: Rua Marques de São Vicente 52/371
Classificação: 16 anos

Ficha Técnica:

Ficha Técnica:
Texto: Ana Bugarim
Colaboração: Paula Rocha
Direção Geral e supervisão de texto: Claudio Torres Gonzaga
Direção: Claudio Torres Gonzaga e Carlos Cardoso.
Elenco: Ana Bugarim, Carla Daniel, Katia Moraes e Miguel Rômulo
Cenário: Edward Monteiro
Figurino: Carla Garam
Iluminação: Luis Paulo Neném
Trilha sonora: Tomás Gonzaga e Pitter Rocha
Programação visual: Victor Hugo Ceatto
Preparação vocal: Ana Frota
Direção de produção: Ana Bugarim
Produção Executiva: Joana D’ Aguilar e Clarice Coelho
Assistente de direção: Samantha Gilbert
Operador de Som: Adolfo Prado
Operação de luz: Eder Nascimento.