*Por Brunna Condini
Os 60 anos são mesmo os novos 40? Se observarmos a rotina de Claudia Ohana e seu fôlego, acreditamos que sim. A atriz está no ar em ‘Vai na fé’, no horário das 19h na Globo, como a terapeuta holística Dora, e no teatro, acaba de estrear em um papel nada zen: o inquieto Diabo da montagem ‘Dom Quixote de Lugar Nenhum‘, em cartaz no Teatro Casa Grande no Leblon até 23 de julho, com texto do cineasta Ruy Guerra, também ex-marido, amigo e pai da sua filha Dandara Ohana. “É um diabo unissex, ele até diz em cena: ‘Posso ser macho ou fêmea’. E tem um lado cômico, não é nada do que pensei, achei que faria um Diabo glamouroso (risos). É coxo, estranho, é ruim, mas se dá mal. Canto com os outros atores e toco ukulele em cena, nos desdobramos, está sendo delicioso”, diz, sobre a produção dirigida por Jorge Farjalla, e conta com Lucas Leto no papel central.
Tenho muitos sonhos para realizar ainda. Quero dirigir filme. Sonhar é a gasolina da vida” – Claudia Ohana
Claudia deu essa entrevista entre a saída dos Estúdios Globo, onde gravava a novela, e a ida para o ensaio final do espetáculo, em dia de estreia. “Olha, é cansativo fazer TV e teatro juntos, claro. Então, procuro não perder tempo com bobagens, tento não ficar muito afobada, sabendo que não dá para fazer tudo ao mesmo tempo, até porque a vida nos requer muitas coisas. E também penso sempre: que maravilhoso! Estou fazendo essa novela de sucesso, com uma personagem incrível, esse espetáculo que estou amando, e isso tudo me deixa feliz. Para dar conta, me cuido, me preservo, foco, faço exercícios físicos, vocais, é muita dedicação. Durmo, e me alimento bem e faço coisas que me dão prazer. Porque meu maior objetivo com isso tudo é ser feliz”.
Na novela de Rosane Svartman, que vem fazendo um sucesso arrebatador com o público, a personagem de Claudia descobriu uma doença incurável, o que vem sendo canal para a atriz muitas descobertas. “Ela está morrendo, mas trata a morte de outra maneira, com uma aceitação e sabedoria que tem me feito aprender muito com ela. Como a minha mãe morreu eu tinha 15 anos, a finitude é uma coisa que sempre questionei, sempre tive muito medo da morte. Mas hoje em dia, o inevitável, não questiono, aceito, é algo que vai acontecer com todo mundo. Não sofro mais com isso, até porque sei da finitude da vida desde muito cedo. Só que atualmente penso mais no que quero na vida do que na morte”, reflete ela, que recentemente contou em entrevista à Quem já ter sofrido muito com uma condição psicológica denominada nosofobia, que associada à ansiedade a fazia ter medo de adquirir alguma doença. “Não sei se eu tivesse uma doença terminal como a da Dora eu contaria, dividiria publicamente. Ou se não falaria nada para ninguém e viveria intensamente, até o fim”.
Maturidade é fluxo
De bem com a vida e com a autoestima abastecida, ela faz um exercício a nosso pedido: o que a Claudia de 60 anos diria para a de 20? “Ah, diria para não ter tanto medo, para aproveitar. Eu era muito medrosa”. Vivendo plenamente o fluxo do amadurecimento, com liberdade e sem dar bola para tabus, a artista aprofunda uma declaração recente sua: “Quando disse que envelhecer não me consome, o que quis dizer é que eu não sofro com isso. Claro que a gente quer ficar jovem, não quer ter rugas, quer ter um corpo maravilhoso, ser linda, ‘forever young’ e tal, mas isso não existe. Então, aceito, não sofro. Têm coisas mais importantes. Por enquanto é assim que sinto. Pode ser que um dia eu sofra, queira fazer mil plásticas, mas não agora. Tenho outras prioridades”.
Como quando a minha mãe morreu eu tinha 15 anos, a finitude é uma coisa que sempre questionei, sempre tive muito medo da morte. Mas hoje em dia, aceito, é algo que vai acontecer com todo mundo, não sofro mais – Claudia Ohana
Liberdade em qualquer fase
Recentemente em capítulo de ‘Vai na Fé’, Claudia e Zé Carlos Machado, que fazem um casal no folhetim, protagonizaram uma cena de liberdade, quebrando preconceitos, quando seus personagens, Dora e Fabio Lorenzo apareceram namorando na cama, em protesto pela ‘paz mundial’. A atriz questionou a repercussão da cena em seu Instagram. “Por que essa cena de Dora e Fábio nus na cama mexeu com as pessoas? Por que estão supostamente nus? Por que é um casal grisalho? Ou porque é um pedido de paz e amor?”, postou. E aí, conseguiu chegar à alguma conclusão? “A minha teoria é: as pessoas se chocam quando veem um casal em uma cama de cabelos brancos e sem roupa. Os cabelos brancos simbolizam a vovó e o vovô ainda. Essa estética da pessoa madura de cabelos brancos, as pessoas não estão acostumadas ainda. É sobre pensar que são pessoas que fazem sexo e vivem normalmente, e que hoje os 60 anos não são mais como antes. Existe o hábito de não querer enxergar isso. Como se o sexo fosse algo ainda pecaminoso e a pessoa com mais idade fosse desprovida de libidos”.
A vida é sonho
Claudia diz que se sente ‘em casa’ na parceria com Ruy Guerra no novo espetáculo, com quem não trabalhava desde 1989. “Ele é família. Nos conhecemos trabalhando, temos uma ótima relação. Voltar a trabalhar com ele dá um gosto daquele passado, o que é muito bom. Ruy está feliz com o trabalho e sempre me estimulou a fazer comédia e esse Diabo é bem nessa linha, ele está adorando”, conta.
Pode ser que um dia eu sofra por envelhecer, queira fazer mil plásticas, mas não agora. Hoje tenho outras prioridades – Claudia Ohana
Um homem é capaz de viver sem seus sonhos? É essa pergunta que permeia o musical ‘Dom Quixote de Lugar Nenhum’, inspirado pela clássica obra de Cervantes, mas cheio de brasilidade canta a saga do herói Queixada (Lucas Leto) agora pelo interior do Nordeste e coloca pela primeira vez um ator preto neste papel. Lá — ou em lugar nenhum, como sugere o título —, ele inicia uma batalha a fim de transformar seu próprio mundo em um espaço menos triste e ainda encontrar a musa Dulcineia (Dani Fontan) que nunca conheceu. E como Claudia lida com seus sonhos? “Sem o sonho a gente não vive. Sempre fui uma sonhadora, mas realista, porque não vivo só deles. Mas acredito que todos somos um pouco Dom Quixote, porque precisamos dos sonhos. Tenho muitos realizados, outros ainda não. E sou da filosofia, que os que não se realizaram lá atrás, não eram para ser, entende? Tenho muitas viagens com minha família para realizar, quero dirigir filme e ter uma casa na beira da praia. Sonhar é a gasolina da vida”.
E conclui falando com satisfação da trajetória até aqui: “Me orgulho da minha carreira, de mim. Acho que cresci tanto como atriz. Comecei tão verde, e me sinto mais madura, plena. Também me orgulho de estar sempre insatisfeita, procurando melhorar no ofício, aprender, e da minha disponibilidade, de estar sempre testando coisas como profissional. Posso dizer, que mesmo as coisas que não gostei de fazer, não me consomem, passou”.
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