A nova temporada de “Insetos” promete marcar a história da Companhia de Atores. O espetáculo, com direção de Rodrigo Portella e texto de Jô Bilac, voltou aos palcos no dia 30 de novembro, data que marca a 130ª apresentação do grupo. O site HT fez questão de conversar com a atriz Susana Ribeiro, uma das fundadoras da companhia e parte do elenco da atual peça. E o resultado? Trinta anos de boas histórias, amor pela arte e companheirismo.
A montagem, responsável por unir quatro fundadores da companhia no elenco: Cesar Augusto, Gustavo Gasparani, Marcelo Olinto e Susana Ribeiro, fala sobre temas extremamente atuais. O espetáculo dá voz aos insetos em doze quadros que se entrelaçam formando a narrativa, na qual o autor aborda o medo e manipulação. Como uma fábula, o texto traça paralelos entre a natureza e questões políticas e sociais da atualidade – evocando comportamentos coletivos e individuais que vão sendo revelados na voz de diferentes insetos: cigarra, gafanhoto, barata, louva-a-deus, besouro, mariposa, borboleta, mosquito, cupim e formiga, entre outros. “O Jô veio com esse assunto porque ele queria falar dos êxodos, das migrações. E assim, falar sobre os nossos próprios deslocamentos, o nosso olhar sobre nós mesmos, utilizando o olhar do bicho sobre o homem. Por isso, ele coloca a gente como inseto, para que possamos falar do homem de um lugar deslocado”, contou Susana.
A atriz, que interpreta sete insetos diferentes, admitiu que o trabalho é quase como uma brincadeira: “Somos nós, atores, brincando de sermos vários. Cada inseto tem uma velocidade própria, mas ele não chega a ter características fechadas. Então, é menos mergulhar em cada personagem e mais ter esse olhar de sobrevoo por eles”. Em cena com os companheiros de vida e profissão Cesar Augusto, Gustavo Gasparini e Marcelo Olinto, a artista contou ao site HT que os conhece desde os 14 de idade. Para ela, é muito emocionante e gratificante ter a oportunidade de dividir o palco e observar o amadurecimento de cada um de seus colegas. “São 30 anos de cena, parceria, ensaio, convivência. É muito bonito ver todo mundo maduro hoje. Eles são a minha família sem dúvida alguma”, afirmou.
Foi junto a esses mesmos companheiros que Susana fundou, há 30 anos, a Companhia de Atores. Ela contou que, durante a juventude, eles já trabalhavam com teatro amador e por isso, acabaram se unindo pelo amor em comum. “A gente se olhou e percebeu que precisávamos de uma formação diferente, algo que a faculdade não nos daria. Achamos mais fácil nos mantermos na prática e nos juntarmos para desenvolver algum trabalho. Então, a Cia. surgiu da vontade de exercitar, trocar ideias, ensaiar, ler textos e conversar sobre. Até que houve um momento em que tínhamos um projeto para tocar, percebemos que éramos um coletivo e precisávamos de um nome. Nós não esperamos um convite do mercado, a gente que se convidou para entrar e conseguimos”, contou ela. Hoje, o grupo é respeitado e por meio do espetáculo “Insetos” concorre a 12 prêmios. Quando questionada sobre a expectativa para as premiações, Susana admitiu que só a indicação já é uma grande recompensa e revelou que o segredo é não criar muitas esperanças para controlar o nervosismo.
Com texto original de Jô Bilac e dirigido por Rodrigo Portella, o espetáculo fez sua estreia nacional em março, no CCBB Rio, e seguiu em temporada pelas unidades Brasília, São Paulo e Belo Horizonte, tendo ainda passado por festivais em Curitiba e Porto Alegre. Apesar de ter rodado em várias regiões do Brasil, o espetáculo agora carrega um significado diferente, pois as apresentações serão realizadas na sede da Companhia dos Atores, na Lapa. “Nossa sede nunca foi um espaço com objetivos comerciais fortes. A gente sabe que ali é um ponto de encontro para muita gente. Então, é importante abrir as portas, não podemos deixar fechado. É importante dizer que está lá e é nosso, dizer que é de todo mundo que quiser participar”, explicou a atriz, que se sente renovada a cada temporada.
Para ela, que está na profissão há tantos anos, as transformações sofridas pelo teatro e pela arte como um todo são inegáveis, mas os objetivos são os mesmos. “Insetos” é, por exemplo, mais uma tentativa de expor e refletir sobre temas importantes. “Essa peça fala sobre as alternâncias de poder, o microssistema que nós somos, a corrupção, a falta de entendimento e solidariedade e sobre essa guerra. Não dava pra não falar sobre isso, mas tentamos passar de uma forma muito vibrante”, explicou. A atriz revelou ainda que é necessário utilizar o teatro para pensar no futuro: “Precisamos pensar no que fazer com isso tudo, não é só denunciar. De certa forma, a denúncia já está feita, as pessoas já conhecem as nossas mazelas. A gente tentou jogar um pouco pra perspectiva de como atravessar um momento como esse. Essa é a razão de estar fazendo isso”.
O momento, segundo a fundadora, é delicado para todos os artistas: “Mesmo sem muito dinheiro, a gente corria atrás e era muito excitante, porque a cidade cultivava mais o teatro. Infelizmente, a gente perdeu essa noite carioca cultural que tínhamos. É um território a ser reconquistado sem dúvidas”. Apesar da atual desvalorização, para ela, o momento não pode ser caracterizado por desistência. Muito sincera, a atriz fez ainda uma reflexão sobre a sociedade: “Você pode dizer que os artistas são vagabundos e que odeia a arte. Mas e quando você coloca uma música, liga a sua televisão ou lê um livro? Não tem como escapar. Eu não consigo imaginar um lugar sem arte e sem cultura. É básico da própria existência. Sem isso, você vira bicho selvagem.”
Convidando a todos para assistir ao espetáculo “Insetos”, de segunda à sexta às 20 horas até o dia 10 de dezembro, Susana fez um apelo aos novos artistas. “Que ninguém desista, porque está nas nossas mãos e agora temos que arregaçar as mangas”, finalizou.
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