*Por Brunna Condini
Não é de hoje que as produções artísticas abordam o drama de personagens que sofrem de alcoolismo. E, embora a dependência seja considerada doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS), ainda é cercada de tabus e preconceitos. Na TV, quem não lembra de Helena Roitman, vivida por Renata Sorrah em ‘Vale Tudo‘ (1988)? Ou Orestes, eternizado por Paulo José (1937-2021), em ‘Por Amor’? Ou ainda, a professora Santana de ‘Mulheres Apaixonadas’ (2003),que comoveu o país? Tanto quanto o Lobato (Osmar Prado), de ‘O Clone’, no ar no Vale à Pena Ver de Novo. O tema rende trama para novelas, mas infelizmente, não se encerra no mundo quando os capítulos acabam. E o aumento do alcoolismo na pandemia tem preocupado as autoridades. Denise Fraga está entrando em cena na novela ‘Um lugar ao sol’, da Globo, vivendo uma cantora fracassada que sofre com o alcoolismo, o que a fez estar no Alcoólicos Anônimos.
Ao longo dos anos, despertando consciências ao abordar o tema, se retrata a doença no audiovisual e no teatro, e isso é exatamente o que a atriz Alessandra Gelio propõe no seu solo ‘AlcoóliKa‘, em cartaz no formato online até 5 de dezembro, com ingressos pelo Sympla. “Muitos pontos são importantes de serem abordados e foram deles que tentei dar conta na peça. Como, por exemplo, que alcoólatra não é apenas aquela pessoa que bebe todos os dias, mas um grande sintoma do alcoolismo é o fenômeno da compulsão, quando a pessoa começa a beber e não consegue parar mais, mesmo que isso aconteça uma vez por semana”, frisa a artista, que partiu da experiência pessoal para dar vida ao projeto: “Precisamos esclarecer ao público o que realmente caracteriza o alcoolismo: é uma doença progressiva, incurável e de terminação fatal, mas que tem tratamento e ele começa evitando o primeiro gole”.
A dependência alcoólica é uma das doenças que mais mata no mundo, e a autora e diretora confessa que também já enfrentou problemas com a bebida em um determinado período da vida: “O alcoolismo é uma doença progressiva e eu, assim como a maioria dos alcoólicos, demorei a perceber que tinha problemas em beber. Infelizmente só percebi quando outra substância entrou na jogada. E a coisa foi progredindo até que eu pedi ajuda a uma pessoa que eu sabia que estava em tratamento e sóbria. Só durante o tratamento é que percebi que também o meu uso de álcool sempre foi compulsivo. Que eu começava e não queria parar mais. O que chamamos de inimigos do fim. Fechava um bar e eu queria ir pro outro. Acabava a cerveja numa reunião de amigos e eu sempre queria pedir mais. Isso é a compulsão, e ela é a característica física da doença”.
Alessandra criou uma dramaturgia que mistura depoimentos reais de alcoólatras com sessões de terapia ficcionais, e materializou em cena Karina, uma produtora de cinema levada à uma terapeuta por insistência do marido, com quem anda tendo muitos conflitos em decorrência de problemas etílicos. “Ela acha que não tem problema nenhum. É negacionista, mas os problemas começam a saltar diante de seus olhos. A partir daí, percebe, ainda com dificuldade, que o álcool não é tão inofensivo e divertido como imaginava”, analisa.
O espetáculo mantém a identidade documental dos projetos da artista, que costuma trazer para suas dramaturgias tanto sua própria história quanto as histórias vividas por outras pessoas. Sobre a adicção, Alessandra revela que se mantém sóbria há quatro anos. “Faço tratamento com médicos especialistas em dependência química e frequento terapias de grupo. E evito lugares muito alcoólicos. Na verdade, é uma mudança completa no estilo de vida. Uma reformulação interior e exterior. Álcool é apenas a ponta do iceberg na doença do alcoolismo. O que está por trás é uma profunda inabilidade emocional que leva à busca de uma fuga da realidade, que fica muito insustentável algumas vezes. Durante o tratamento, fui e continuo me conhecendo cada vez mais e gerencio hoje muito melhor minhas emoções. O que torna também muito melhor e mais harmônicas as minhas relações: comigo, com o outro é com a vida. Assim, a necessidade de se anestesiar diminui. E, claro, como meu estilo de vida mudou, minhas programações hoje são completamente diferentes”.
Um Lugar ao Sol
Na trama ‘Um lugar ao sol’, de Lícia Manzo no ar no horário das 21h, o tema estará em evidência mais uma vez e através da atriz Denise Fraga, que retorna à uma personagem de novelas após 25 anos. Ela vai viver Júlia, mãe do personagem de Gabriel Leone, Felipe, e filha da psicanalista Ana Virgínia, Regina Braga. A atriz será uma cantora que sofre com o alcoolismo, o que fez a atriz conhecer o Alcoólicos Anônimos: “Fui a algumas reuniões e pude conhecer o trabalho do AA. A Júlia tem 300 outras camadas sem ser o problema da adicção. A vida tirou dela coisas preciosas como o contato com o filho. Essa personagem é muito reconhecida para mim. Tinha um amigo que ajudava. Todo mundo têm um amigo que já deu a mão”, conta Denise ao site, sobre a personagem. “O incrível da novela é as pessoas poderem conhecer um pouco o trabalho do AA. Sobre essas reuniões em que fui, fico pensando que todos deveriam poder ir se quisessem, porque estamos cheios de vícios que não conseguimos deixar”.
Leia mais: Denise Fraga de volta à TV como cantora fracassada e alcoólatra em ‘Um lugar ao sol’
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