“Na mitologia, o herói precisa se sacrificar para atingir o Olimpo. Uma estrela quando morre espalha o seu pó que é responsável pelo nascimento de muitas outras. E já foi comprovado pela ciência que nós somos feitos deste mesmo material químico. Por isso o Senna alcançou o divino para que pudesse existir um milhão de outras miniaturas dele por ai. Depois de quase trinta anos, continuamos sendo inspirados por ele”, sugeriu Renato Rocha. O profissional é diretor da peça Ayrton Senna, O Musical que tem como objetivo relembrar aos brasileiros o que o piloto de fórmula 1 representava. Ele foi um exemplo de ser humano que inspirava o público todos os domingos pela televisão. O espetáculo tentou retratar de forma inusitada quem era este ídolo nacional, fugindo da lógica que seria contar a história do recordista de forma biográfica e linear. O resultado final é a montagem com mais riscos de vida produzida Aventura Entretenimento, cheia de detalhes tecnológicos, com músicas exclusivas e um elenco que conta com vinte e quatro atores, cantores e bailarinos.
O projeto de uma peça que contasse a história de Ayrton Senna começou há três anos. O maior desafio era como desenvolver este texto e, desde o início, houve a certeza de que não seria nada tradicional. Apesar de ter como base um musical, não há a produção de uma música que conte a trajetória do rapaz. “A ideia é passar a garra, a determinação e o quanto ele fez para chegar neste lugar de ídolo. Queremos mostrar a pessoa humana que ele era. Quando este projeto nasceu, tínhamos a certeza que o país precisava disso. Hoje, achamos que o Brasil precisa MUITO ver esta peça. Estamos carente do espírito que o Ayrton realmente passava e a alegria que dava para o povo brasileiro aos domingos”, lamentou a sócia da Aventura, Aniela Jordan. Segundo o diretor Renato Rocha, “nós somos artistas queremos mudar o mundo, mas como isto é impossível, tentamos fazer as pessoas refletirem ao assistir a nossa peça”.
O princípio fundamental da montagem era esquecer o certo e o errado para se permitir testar. Houve sempre o questionamento entre os membros se a linha que estavam seguindo era a correta. Se alguém discordasse da ideia, todos se reuniam para entender o problema e concertar o erro. “Fizemos um final futurista que achamos que ia ser super legal, ficamos treinando por semanas. Quando fizemos o primeiro passadão, descartamos aquela ideia. Mas logo fizemos uma reunião e já montamos outras coisas. Nós mudamos o espetáculo o tempo todo na busca de entregar o melhor. Acho que se não houver crise, não chegamos ao novo. Tivemos muitos percalços neste caminho. Falhamos algumas vezes, deu problema, mas acho difícil dar errado um projeto em que se permite fazer com que as diferenças se encontrem”, contou o diretor Renato Rocha. A equipe não sabia se o resultado final daria certo, mas tentava pensar que tinham que se parecer um pouco com a perfeição que era o Ayrton Senna. A expectativa era trazer uma nova proposta de musical.
O resultado final não é mérito apenas dos escritores Claudios Lins e Cristiano Gualda ou do diretor. Na verdade toda a equipe, inclusive o elenco, fez parte da criação dos textos, da coreografia e dos aparatos tecnológicos. Todos tiveram a sua chance de expor a opinião sobre o que estava sendo ensaiado. “Este espetáculo é um marco na minha história, na de todos ao meu redor e no musical porque nós nos permitimos que o resultado artístico fosse, de fato, fruto de um trabalho artístico colaborativo de todos nós. Todas as sessenta pessoas mudaram alguma coisa e precisávamos treinar o nosso ouvido para conseguir escutar o que cada um tinha a dizer. Estas opiniões vinham desde da diretoria até o segurança, que um dia identificou uma falha nossa. O resultado artístico está a frente do produto. Acho que a arte lida muito com o produto, mas este projeto promove um encontro. A nossa expressão artística está no nível do carro de ponta do Ayrton Senna”, garantiu Renato Rocha. O diretor musical, Felipe Habib, contou que “resolvemos juntar algumas pesquisas artísticas já desenvolvidas e trazer isso para o musical que é um mercado que está movimentando muito o país. A ideia era unir a matéria prima deste gênero com esta proposta inovadora que estávamos produzindo”.
A trilha sonora, dessa forma, foi fundamental para o roteiro e o produto final da peça. Apesar de não contar a história da vida de Ayrton, os sons têm uma necessidade de existir ainda mais forte. “As pessoas podem pensar que não existe relação entre o Ayrton Senna e a música, mas depois da pesquisa sobre ele sei que tem tudo a ver. Em uma conversa como os técnicos dos carros dele, me confidenciaram que ele era o piloto que sentia e ouvia os carros como ninguém. Um dia ele pediu que trocasse uma peça dele porque daria problema, os computadores não informavam aquilo, mas a equipe acabou trocando da mesma forma. Outro competidor, o Gehard Berger, com o mesmo modelo não trocou e logo depois o objeto começou a falhar. O barulho do metal seria uma espécie de música para eles”, explicou o diretor Renato Rocha.
Apesar de compreender esta relação, a equipe resolveu se aprofundar ainda mais nos sons produzidos durante uma competição de fórmula 1. O criador sonoro, Daniel Castanheira, fez algumas visitas aos locais de corrida automobilística para entender mais deste universo e, a partir disso, poder começar a criar suas composições. “A partir da pesquisa, pude perceber que a experiência no autódromo é muito sonora, quase não é possível enxergar os carros devido à velocidade. Fora isso existe o barulho das curvas e dos motores que compõe a forma como tudo aquilo acontece. O som vem de todos os lados, por isso a ideia era fazer músicas que dessem conta desta imersão sonora. Para isso, utilizamos a edição e a altura do som para mostrar as canções que fizemos com base numa série de tecnologias, misturando barulhos de diferentes peças de carro e motores”, contou Daniel Castanheira. De acordo com Bianca Senna, sobrinha de Ayrton, cada lugar do autódromo reproduz um som diferente.
As canções exclusivas se fizeram fundamental por mostrar, ainda, traços de brasilidade que remetem ao ídolo nacional que é o piloto. “Ayrton Senna é uma figura muito relacionada com uma busca de um país melhor, por isso pensamos em fazer produções nacionais”, contou o dramaturgo Cristiano Gualda. As criações contaram com o apoio de oito músicos de orquestra clássica em contraponto com as melodias de estúdio feitas pelo Daniel. “As músicas possuem uma mudança brusca dos sons que é muito desafiante para nós, cantores”, complemetou Hugo Bonemer, o ator que interpreta o próprio Ayrton Senna.
A complexidade do musical do piloto não para por ai. O grande desafio da equipe era criar um espetáculo que proporcionasse uma experiência visual e sonora que levasse o público para ver o mundo pelo cockpit e sentir uma velocidade de 300km por hora. “Buscamos convidar o espectador para uma experiência multidiciplinar, sensitiva, sonora e visual. Para conseguirmos isso, a linguagem do circo foi essencial e ainda agregou uma estética muito sofisticada, no nível do Ayrton Senna”, explicou o diretor Renato Rocha que já havia participado de um circo. Logo, para completar a experiência que já era fornecida pela audição, surgiu a necessidade de interpretar as canções através da dança. A equipe usou a inspiração de um dos maiores grupos do mundo, o Cirque Du Soleil, o que justifica as inúmeras acrobacias feitas pelo elenco. Diziam que o piloto voava no carro e os diretores resolveram fazer disso uma realidade colocando dançarinos para voar através do auxilio de cabos. “É um espetáculo de alto risco de vida foi preciso checar várias vezes se tudo funcionava em perfeita segurança”, completou Renato.
O mais difícil de tudo foi unir todas as linguagens em apenas um espetáculo sem que as propostas ficassem desconexas. Para quebrar esta dificuldade, toda a equipe resolveu experimentar na própria pele como um piloto de fórmula 1 deve se sentir. “Levamos a equipe para o kart para que eles pudessem entender como é a logística e tentar sentir o que o Ayrton vivia no seu dia a dia como o cheiro do carro, o barulho e a visão do carro em velocidade. Todos viraram pilotos, não queriam deixar ninguém passar, uma pessoa quebrou a costela e tivemos acidentes. Estávamos cheios de adrenalina no sangue, eufóricos e chegamos à conclusão que era essa a emoção que precisávamos no palco. A ideia não era que os atores representassem, queríamos que eles vivessem e deixassem a emoção passar por dentro deles”, explicou o diretor. Para ele, era importante buscar a sinceridade do ator em vez de uma simples representação.
Seguindo esta ideologia, o Renato também queria que o público participasse desta relação de troca e, por isso, descartou uma sequência linear da história. “Quero que as pessoas se sintam à vontade para colocar as suas vivências e memórias dos fatos. Isto faz com que a platéia escreva a sua própria história. Existem muitas camadas dramaturgas expostas, ora pelo texto e ora pelo impacto visual, com isso a ideia era que cada um fosse atravessado por essa experiência”, completou o diretor. De certa forma, cada pessoa possui uma relação afetiva com o Ayrton Senna e é exatamente isso que Renato Rocha não pretende mudar.
Também faz parte desta relação visual a identificação direta com o personagem de Ayrton Senna, por isso o vestuário foi uma parte importante deste conjunto. “Era necessário haver uma identificação direta com os personagens no palco. Quando a pessoa olha para aquele macacão vermelho, ela sabe que é o Ayrton. Mas o desafio era traçar esta linguagem de uma forma que ficasse onírica, seguindo a proposta do espetáculo. Portanto, busquei trazer um design que transmitisse a tecnologia, velocidade e emoção. Ao mesmo tempo que reconstituímos as roupas, temos peças espelhadas e macacões de lycra recortados que imprimem a sensação de velocidade”, contou o figurinista Dudu Bertholini.
SERVIÇO – AYRTON SENNA, O MUSICAL
Local: Teatro Riachuelo Rio – Rua do Passeio, 40 – Cinelândia – Rio de Janeiro/RJ
Horários: Quinta e sexta às 20h30; sábado às 16h30 e 20h30; domingo às 18h.
Temporada: de 10 de novembro a 04 de fevereiro
Duração: 2h20 (com 15 min de intervalo)
Classificaçãoetária: Livre
Preços:Quinta, sexta e sábado (16h30): Plateia – de R$25,00 a R$120,00 | Balcão Nobre – de R$25,00 a R$100,00 | Balcão – de R$25 a R$70Sábado (20h30) e domingo: Plateia – de R$25,00 a R$150,00 | Balcão Nobre – de R$25,00 a R$120,00 | Balcão – de R$25,00 a R$80,00
Artigos relacionados