*Por Alexei Waichenberg
Quer casar comigo? Não, minha gente, eu não surtei na quarentena. Vocês vão dizer que eu sou de outro tempo. Meu tempo é quando? Sim, os dias eram assim, mas na real, eu sou do mesmo tempo de quem, depois de alguma traulitadas da vida e dos tropeços, que viraram soluços, adverte: Alexei, não vai pedir em casamento, vai?
Parece que os mais próximos advinham, parece que eles sabem que essa vontade de viver ao lado de alguém é o que há de mais demodé no cenário atual. Em tempos de polarização, no entanto, precisamos refletir que existe um filme diferente dos açucarados da sessão da tarde ou dos de terror, dos quais nos fizeram vítima os últimos acontecimentos.
Nessa madrugada, mais uma em claro, estava assistindo o canal de internet de dois amigos lindos, que ajudam os solteiros com palavras de incentivo. E, de repente, apareceu ali a ideia de que alguém hoje só procuraria um parceir@ prumódinão ficar sozinho na velhice. Me assustei, mas eles devem saber o que dizem.
O cronista aqui, por sua conta e risco, prefere acreditar que né nada disso.
Em isolamento nos forçaram o balanço. Um balanço entre o amor clássico e o contemporâneo. Mas, amor é amor, não tem nada a ver com os cuidados da velhice. Fala mais de quem você escolhe pra bater o bolo. Se vai solar ou crescer só depende de quem bate.
Tem os como eu, que nem forno tem, mas que adoram brincar de casinha e que dariam tudo por cinquenta dias dormindo de conchinha e… tem os outros.
Faz o seguinte: Põe aí “Ilusão à Toa”, do Johnny Alf na vitrola ou no seu playlist e você vai entender que existe sim um “amor discreto pra uma só pessoa, pois nem de leve sabes que eu te quero e me apraz essa ilusão à toa”. Eu acho graça do meu pensamento”: a maturidade me obriga a perceber que eu sou desse e daquele tempo. Meu tempo é hoje.
Os amores contundentes da velha fossa, que embalou a minha adolescência, agora são passados pelo avesso. Também pudera, amor é tecido delicado e quase sempre se apresenta amarrotado. Se antes identificávamos a qualidade do pano e partíamos a investir numa boa goma, hoje, à sombra do vinco, ou do vínculo, passamos logo para o que estiver disponível, num guarda-roupa multicolorido, com peças para quase todas as estações da solidão.
Pode acreditar, a solidão é hoje a linha do transporte de afeto mais procurada no mundo. É que, como as demais estão sempre sendo destruídas ou em construção, os passageiros do temor escolhem esse trajeto num carro sem motorista que, em poucas palavras, quer dizer que deixam que o destino os conduza, enquanto desempenham apenas o papel de controladores e, da base, confortáveis, desviam do que lhes pode fazer parar para viver, ao invés de contemplar.
Quis o destino colocar encarcerados as mulheres e os homens, as mulheres e as mulheres, os homens e os homens, os humanos e os desumanos, todos isolados, desolados. Uns acompanhados apenas da vontade de amar e outros solitários e vazios.
Eu, como sou mais antigo e não fiz a previdência, ainda puxo a cordinha. Tento saltar numa ou noutra estação, mas fico entregue à sorte de uma falha mecânica ou de uma parada, como esta pra manutenção.
E como o que nos resta é esperar, fique em casa. Para te acompanhar eu envio daqui uns versos capengas de poesia, em métrica de rádio:
E prometo, com efeito, nunca mais embarcar
nesse comboio de amor sob medida
de beijinhos sem mordida
de querer o que não tenho
de entrar pela partida
Em resumo, quero ser
um passageiro conhecido para
entrar meio espremido
nesse trem quase enguiçado e
saltar atrapalhado pra abraçar um novo amor.
Se ele ali por mim espera ou
se isso é uma quimera
eu não quero é ter certeza
de partir em segurança e
perceber que já era
um amor, que tão discreto
diluiu a esperança.
Artigos relacionados