ABZ Lab revela vozes e culturas ainda invisíveis no Brasil tendo como norte a economia criativa e circular


A moda autoral conectando brasileiros, sobretudo respeitando nossas diferenças, a partir da virtual teia tecnológica e o singelo de ensinamentos ancestrais. ABZ LAB lança luz ao trabalho de Dona Josa – artesã potiguar conhecida pelo bordado do junco sobre a juta; ao do paranaense Enéas Neto e Jailson Marcos, potiguar radicado no Recife. Enéas Neto tem a seda (tecido orgânico de origem animal) e linho (tecido orgânico de origem vegetal). Jailson Marcos constrói calçados promovendo o máximo de aproveitamento dos materiais

*Por Augusto Bezerril

O mundo redefiniu a ideia de fronteiras nacionais e continentais e os espaços públicos e privados. Virtual e real parecem ter tomado uma unidade única. A relação entre lar, casa e planeta terra aproxima o humano, ao mesmo tempo, à natureza e à tecnologia. Viver se transformou em um laboratório de saberes. O ABZ Lab nasceu de revelar vozes e culturas invisíveis tendo como norte o que se convenciona chamar de economia criativa e circular. Embora eu considere ambos conceitos limitados frente às infinitas conexões fundamentadas no respeito ao ser humano e ao planeta. Minha ideia inicial era trabalhar em comunidades caiçaras e ribeirinhas do Rio Grande do Norte. Cheguei a planejar uma participação de Dona Josa – artesã potiguar conhecida pelo bordado do junco sobre a juta – na edição do Brasil Eco Fashion Week.

Em ano atípico e numa edição virtual, o ABZ LAB estreou na semana de moda sustentável conectando o criativo do paranaense Enéas Neto e Jailson Marcos, potiguar radicado no Recife. A escolha dos dois nomes partiu da observação sobre o desenvolvimento das peças. Enéas Neto tem a seda (tecido orgânico de origem animal) e linho (tecido orgânico de origem vegetal). Jailson Marcos constrói calçados promovendo o máximo de aproveitamento dos materiais. Para minha alegria, o desfile traduz o diálogo estético entre criadores distantes do ponto de vista geográfico.

Indo mais distante, o ABZ LAB participou da mostra de fashion films com estreia do potiguar Kerginaldo Gadelha no roteiro no vídeo colaborativo Geová – O Mundo em Redesenho. A câmera de Cláudio Selma capta o momento inicial da feitura da etiqueta até a exposição das peças no ateliê do estilista, localizado no East Village, em Nova York. Geová Rodrigues é considerado precursor do que chamamos  upcycling.

A semente do projeto com Dona Josa estava, contudo, semeada. Ao definir qual projeto iria concorrer ao edital da Lei Aldir Blanc, percebi que era o momento. Ciclos e Tramas – Conexão entre Mulheres Caiçaras e Ribeirinhas.  Quando saiu o resultado do Edital Diversidade, Mulheres lá estava nosso ABZ LAB. No final de dezembro, a Arezzo abriu as portas da loja do Natal Shopping para uma exposição das peças homestyle da artesã.

O radar criativo do ABZ LAB permanece ativo. Expandindo o olhar, iniciei trocas de experiências com Elle Alves – fundadora do Your Denin Lab, projeto da Universidade Veiga de Almeida (UVA) e integrante do colaborativo A Villa. Ao observar o resultado da conexão criativa entre cariocas e mulheres ribeirinhas da Ilha do Marajó não tive dúvida de que o caminho seria reunir gente com o mesmo propósito e sensibilidade para novas e verdadeiras práticas.

Em de carnaval sem carnaval, o ABZ LAB resolveu botar o “bloco circular” para reverberar a força das mulheres. Mais uma vez, a Arezzo abriu as alas para a designer e neurocientista Daiane Golbert (também contemplada na Lei Aldir Blanc na categoria Mulheres) costumizar sandálias Brizza na primeira live ABZ LAB, compartilhando o que aprendeu com Dona Josa.

Em pleno Carnaval, eu e Daiane participamos de oficinas criativas na casa de Dona Josa, localizada em Pirangi, litoral sul do Rio Grande do Norte. Na segunda-feira de carnaval, a empresária Cláudia Gallindo postou foto da sandália costumizada e clutch da collab ABZ Dona Josa e Daiane Gobert em look composto por jóias da Ana Rocha e Appolinario. “Eu quero conhecê-la “, disse Claudia ao ver o vídeo postado no i@abzlab. Fechando o carnaval, a Arezzo resolveu homenagear a cantora Valéria Oliveira com uma Brizza com aplicações de junco, rosa de juta e pintura de mandalas. Os desenhos das mandalas me conectaram a Ciça, artesã conhecida pelo trabalho em sisal no litoral norte do Rio Grande do Norte. Eu que cresci perto do rio e do mar descobri no transcorrer das conexões o quanto podemos nos entender como brasileiros, sobretudo respeitando nossas diferenças, a partir da virtual teia tecnológica e o singelo de ensinamentos ancestrais. Creio que a nova riqueza das nações será medida pelo amor, respeito, diversidade e empatia. O Brasil é, para além do desejo dos hatters, potencialmente rico.