Foi durante uma madrugada em 2007, vendo televisão, que Pedro Monteiro teve a ideia de produzir a peça “Um de nós”, que chega novamente aos palcos em setembro para uma temporada especial no teatro Eva Hertz, na Livraria Cultura, Rio de Janeiro. A montagem, que teve sua primeira temporada em janeiro deste ano, venceu o pitching do Tempo Festival 2014 e integrou o Circuito SESI Cultural de 2015.
Nos palcos, cinco atores vestidos em quimonos contam a emocionante história inspirada em Arash, um judoca iraniano que enfrentou diversos desafios em busca do seu sonho: participar de uma Olimpíada. Pedro Monteiro, idealizador do projeto, faz parte do elenco e contou que essa não é a primeira vez que alia funções. “Essa já é a terceira peça que eu consigo trabalhar com as duas coisas. Já fiz o mesmo antes, em ‘Os ruivos’ e ‘Funk Brasil’”. Além de Pedro, Joana Lebreiro e Marcus Galiña assinam o texto.
A história toda se passa na luta final, quando Arash percebe que, por questões médicas, não vai conseguir chegar às Olimpíadas, quando desenrola um filme em sua cabeça desde a infância até o sonho interrompido. O universo da luta é tão intenso que o desavisado que entrar no teatro Eva Hertz, no centro da cidade, vai encontrar tatames no chão e pode até achar que o lugar está preparado para um campeonato de judô. “E tem pelo menos umas quatro lutas durante a história”, adiantou Pedro. Para ele, o que mais motivou ao montar a peça foi a entrevista de Arash e o fato de o lutador se considerar um derrotado após ter seu sonho olímpico frustrado. “Derrotado de que? Ele se superou sempre que pode”, relembrou Pedro.
Os cinco atores se prepararam durante todo um semestre no Instituto Reação, do atleta Flavio Canto. Em conversa com HT, Pedro ressaltou que nenhum deles fazia artes marciais e que a experiência foi incrível. “A gente treinava com os adolescentes de 15 anos e víamos que todos aqueles meninos levam extremamente a sério. Construir uma relação amistosa e fazer parte do desejo deles foi maravilhoso. Além disso, duas vezes por semana uma equipe praticamente olímpica se reúne para treinar no Reação. Lá se respira judô. Isso influenciou muito todo o elenco”, explicou, emendando que os últimos meses foram os mais difíceis. “No final juntamos o treinamento de judô com o ensaio da peça. É muito legal porque o texto é sempre colocado a partir ou de um golpe ou de um movimento ou de uma frase”, contou, dando exemplos quando como o Arash dorme, que na verdade ele está fazendo um “rolamento agachado”. Todos os movimentos da peça, de acordo com Pedro, são coreografados como um ritual de judô.
Pedro Monteiro começou sua carreira no Teatro Tablado e é graduado em Artes Dramáticas pela Escola de Artes da UniverCidade. O ator já trabalhou com diretores como Bernardo Jablonski, Gracindo Junior, Ulysses Cruz e Arthur Fontes e disse que é uma responsabilidade grande contar uma história que envolve as guerras que permeiam o Oriente Médio. “Chegou em um momento da construção do texto que eu, Joana e Macus percebemos que a história não poderia passar no período da Guerra (de 1975 a 2007) sem falar de questões políticas. Em uma das cenas Arash está classificado para as Olimpíadas de Los Angeles, só que ele não pode ir, porque os Estados Unidos apoiou o Iraque na guerra contra o Irã em 1980, então, como retaliação, o país decidiu não enviar os atletas. Arash é traído por uma questão política que não deveria ter a última palavra”, explicou.
A história de um homem em busca de seu sonho, que é participar dos Jogos Olímpicos, é enriquecida com a vida pessoal do personagem. Um pai opressor, a relação com a família, com a luta, com sua mulher e suas superações são todas mostradas durante os 75 minutos de peça. Outros esportistas também são representados através dos atores em cena, que não tem título, mas que jogam uma luz na batalha que os atletas vencem todos os dias. “Todo mundo se identifica com a história em algum momento”, disse Pedro, que garante que o espetáculo é para toda a família. “Crianças de 5 anos foram ver. Às vezes, eles não entendem tudo, mas como é uma luta, ficam impressionados. Alguns passaram a fazer judô depois”.
O ator e produtor ainda levantou a importância de discutir temas que são pouco debatidos no país. “Acredito que menos de 5% das montagens no Brasil falam sobre o Oriente Médio, nós estamos muito distantes geograficamente de lá e vivemos uma situação complicada no nosso próprio país, o que nos enterra nos nossos problemas. Se levantarmos a cabeça um pouco vemos que em outros lugares existem situações piores do que as nossas”. Pedro contou também que se impressiona com a quantidade de pessoas que chegam para falar com ele sobre essas questões depois da peça. “É incrível poder trazer esse debate para o palco”. Coisa de artista.
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