*Por João Ker
A ambientação da São Paulo Fashion Week sempre é um espetáculo à parte. As inspirações já foram desde a parede verde de samambaias à ao movimento urbano do grafite, com arte do Kobra, passando pelo surrealismo de René Magritte, tudo sempre com aquela pegada fashion que faz o evento se destacar tanto pelas coleções quanto pelo clima. Agora, nesta edição que contempla o inverno 2015, é a vez do eterno minimalismo vanguardista da escola alemã Bauhaus, com linhas em CMYK (Ciano, magenta, amarelo e preto para aqueles que não entendem nada de produção gráfica) transpassar toda a fachada e os espaços do Parque Cândido Portinari, onde rola o evento. Minimalismo, por sinal, parece ser a palavra de ordem, levando em consideração o atual momento da economia brasileira, a supressão de grandes arroubos da cenografia nas passarelas e o inegável fenômeno do Funk Ostentação, que elevou ao status de celebridade milionária nomes como MC Guimé e MC Gui, destoando completamente de grande parte da sociedade brazuca atual, que não tem verba para envergar as grossas correntes grossas de incontáveis quilates, do tipo que reluz de São Paulo até Piracicaba.
Minimalismo Bauhaus, economia incerta e a ostentação surreal do movimento funqueiro despertam uma daquelas epifanias associativas na cabeça de HT, que saiu pelos corredores do evento pretendendo investiga, entre posers e fashionistas de nascença, qual seria a maneira aceitável de ostentar no Brasil contemporâneo? As respostas atentam para a celebração do individualismo e surpreendem por, em pleno 2014, um dos bens naturais mais necessários para a existência do ser humano ser visto como algo de valor tão inestimável e, simultaneamente, de difícil acesso: a água, cuja escassez anda deixando desesperados não apenas os paulistas, mas o país inteiro. Leia abaixo:
Thiago Pethit, que se prepara para o lançamento de seu novo álbum “Rock ‘n Roll Sugar Darling”, acha que uma forma maneira de ostentar é ser quem você é de verdade: “Seja o que você quiser, high ou low. Come as you are!”, declara, com aquela atitude na qual ser cool é deliciosamente ostensivo.
Em cartaz no Rio de Janeiro com a peça “La Mamma”, que HT já contou aqui, Leonardo Miggiorin é pleno de ótimas intenções e revela aquilo que considera ser imprescindível ostentar atualmente: “A gentileza, a solidariedade, a sustentabilidade. O valor não está na embalagem, mas na utilidade das coisas. Por mais que a moda seja parcialmente feita de status, é preciso haver um equilíbrio”.
Poderosíssima, usando um top cropped com saia de cintura alta e sempre a par de tudo aquilo acontece no mundinho fashion, Sabrina Sato também opina sobre o que pensa ser a ostentação contemporânea: “O menos”, diz na lata. “Temos que ostentar a alegria, a naturalidade. Os chineses têm um hábito cultural de se vestirem iguais. O legal é se diferenciar por outras formas, não só pelas roupas”, comenta.
“Keila Gaga“, que saiu de Noiva do Cordeiro, cidadezinha minúscula no interior de Minas, para se inserir na parcela freak do evento, comenta sobre sua forma preferida de ostentar: “Trabalhar na lavoura, como eu faço, e depois aparecer com um vestido de balão na SPFW. Ostentar é ser Keila Gaga!”, diz, ostentando nas palavras e funkando na cara da sociedade. Tá bom, meu bem?!
Misto de “Blue Brothers” com visual de personagem de “Constantine“, Léo Belicha, de 34 anos, se diz diretor criativo e pode até ostentar no carão, mas garante que essa não é sua prioridade: “Ser uma pessoa interessante não requer ostentação. Você não precisa substituir personalidade por roupas”. Pá!
Evandro Santo, que ostenta há anos e da melhor maneira possível o humor ácido no “Pânico”, enfia o dedo na ferida: “Quem ostenta muito é blogueira. Acho que não preciso daquilo tudo e é mesmo um absurdo menina rica ganhando roupa de graça. Acho sem noção elas terem mais seguidores do que uma cantora ou uma atriz de respeito”. PÁ! [2]
Aquática! Mariana Ximenes, que veste Stella McCartney para C&A e afirma que ficou felicíssima quando viu que haviam produzido, na coleção, seu número de sapato (34), declara: “Ostentação hoje em dia é água. Ou seja, economizem água!”, conta a atriz, toda empolgada com sua participação na série “Eu que amo tanto”, do Fantástico.
A atriz, diretora, autora e escritora Suzana Pires critica a pose excessiva do pessoal fashion e dispara: “Vamos ostentar a simplicidade sendo nós mesmos, sem fazer carão, por favor”.
Nathália Rodrigues também faz a linha minimalista e diz não concordar com esse tipo de atitude: “Eu sou contra qualquer tipo de ostentação porque levo uma vida muito simples. Eu dirijo um fusca, eu pego ônibus e metrô – tipo Lucélia Santos – e eu faço isso porque gosto, não porque eu preciso. As pessoas deveriam ostentar o ato de fazer o bem ao próximo”.
Top cuja simples presença é ostentação em qualquer desfile, Aline Weber (que diz ter mudado as madeixas platinadas para castanho porque a cor já estava maltratando demais a sua raiz) faz eco à resposta de Mariana Ximenes: “Ostentar é gastar água hoje em dia. Ainda mais com o país inteiro passando por essa dificuldade. Eu vejo isso aqui em São Paulo, mas, no Sul, nós também sofremos com isso. As pessoas pensam em ostentar com Perrier, San Pellegrino e Evian nas mesas dos restaurantes, mas esquecem que a água mais simples e essencial, a das nossas torneiras, é um luxo, se comparada com sua escassez em países como os do Norte da África”.
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