Debatendo temas como lesbofobia e o confinamento estrutural da mulher negra, segue em cartaz, até 11 de abril, às 20h, via Zoom, (https://www.sympla.com.br/sinha-nao-dorme__1159029) o espetáculo inédito “Sinhá Não Dorme”. Idealizado e estrelado pelas atrizes Glória Diniz e Roberta Valente, a peça reúne uma equipe artística principalmente formada por mulheres, com Tatiana Nascimento assinando o texto e Isabel Penoni a direção. Misturando elementos do cinema e do teatro online, a montagem é um thriller eletrizante ambientado em um quarto onde duas mulheres negras, ex-namoradas, discutem sua relação enquanto uma procura esconder da outra um assombroso mistério. A montagem atualiza questões latentes, como os delírios racistas produzidos pela colonização, que marca a história de países como o Brasil.
Além da encenação virtual do texto, o projeto ainda contempla ações como uma oficina de dramaturgia ministrada pela autora, Tatiana Nascimento, com vagas gratuitas destinadas, prioritariamente, para mulheres negras, e a mesa temática “Teatro e novas tecnologias”, que irá debater a imbricação entre a criação artística e as diferentes plataformas tecnológicas. Por fim, as atrizes e a diretora farão um bate-papo focado na publicização do processo de criação do espetáculo. “Este texto é muito potente, porque fala da relação entre duas mulheres negras e delas com o mundo. Ao começar a estudar, a personagem que já nasceu na condição de empregada doméstica e considerada ‘da família’ percebe que sempre foi abusada e humilhada, confinada a um quarto de empregada. Desde os tempos coloniais, por maiores que fossem as casas, a mulher negra sempre foi colocada em um lugar minúsculo, sem janela, onde mal cabia uma cama”, ressalta Roberta que, em 2016, após conhecer o dramaturgo angolano Mena Abrantes em uma passagem pelo Rio de Janeiro, iniciou com Glória uma pesquisa em Luanda, capital de Angola, em contato direto com o autor e sua obra que inspirou a peça.
Tatiana Nascimento pontua ainda, que em uma sociedade de origem colonial e tradição escravocrata como a nossa, não é possível pensar o lugar da mulher sem levar em conta outras intersecções, como a opressão de caráter racial. “Mulheres negras nunca foram tratadas como frágeis, sempre trabalharam – ou como escravas, ou nas ruas, dentro da economia informal das mais variadas formas. Existe aqui a relação de coisificação da mulher negra, afinal, o modelo estético de mulher é o da mulher branca. Quando as feministas brigavam por trabalho, as mulheres negras já estavam nas ruas. E é preciso lembrar que a sociedade brasileira é uma das mais violentas contra as mulheres – duas morrem todos os dias no Brasil, segundo o Núcleo de Estudos de Violência da USP. E isso também nos leva a uma das perguntas da peça: os corpos femininos são realmente das mulheres, ou a sociedade teima em ainda colonizá-los?”.
As atrizes acreditam que a encenação se faz muito importante no Brasil de hoje, em que urge um olhar para a mulher a partir de suas múltiplas intersecções de gênero, classe e raça. Para isso, convidaram um grupo diverso de mulheres para compor a equipe artística do trabalho, que inclui ainda Andrea Capella assinando a fotografia; Paula Stroher, a arte; Maíra Freitas a trilha sonora e produção musical; e Juliana França a assistência de direção.
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