O Brasil dá adeus ao cantor Agnaldo Timóteo, que morreu hoje, véspera do domingo de Páscoa, que simboliza a ressurreição de Jesus. Ele foi vítima da tragédia da pandemia da Covid-19. Mas a luta do cantor pela vida desde 2019 era gigantesca e nos comovia. Naquele ano, ele esteve internado durante meses no Hospital das Clínicas, em São Paulo, em isolamento, desde que sofreu um acidente vascular cerebral na tarde de 20 de maio, no interior da Bahia. Foi levado para uma UPA na cidade de Barreiras a 883 quilômetros de Salvador. De lá, transferido para o Hospital Geral Roberto Santos, na capital baiana, e, depois, para o Hospital das Clínicas, em São Paulo.
O périplo do cantor entre instituições mostrou a vulnerabilidade a que está exposto o artista popular no Brasil. Remanescente de uma geração que se doou por completo à carreira e acreditava nas instituições públicas, Timóteo não contava com plano de saúde, por exemplo, mas contava com a ajuda de Deus. E essa ajuda veio. Ele se recuperou.
Desde então, a turnê do show “Obrigado, Cauby” foi cancelada. Mas, Agnaldo nunca deixou de ter aquele sorriso repleto de esperança no rosto. Ao longo da carreira, esteve no panteão com os ídolos máximos como Angela Maria, Agnaldo Rayol… Cauby Peixoto e tinha o valor da potência de sua voz e sua capacidade de mobilizar as massas como qualidades significativas.
Como escrevi em 2019, no período em que estave na luta entre a vida e a morte, Agnaldo nunca ele se importou com críticas reducionistas, tais como “música brega”. Felizmente, a sabedoria popular faz justiça a seus ídolos: no final das contas, é o que realmente importa. O artista tem a medida do amor de seus admiradores.
Com mais de 50 anos de carreira, Agnaldo Timóteo estava na ativa desde os anos 1950, quando costumava se apresentar em programas de calouros em sua Caratinga natal e outras cidades do interior mineiro, enquanto trabalhava em oficinas mecânicas. Foi nessa época que se mudou para Belo Horizonte, em busca de oportunidade como cantor. Na capital das Gerais, chegou a ser conhecido como Cauby Mineiro. O lado bom disso era ser convidado pelas rádios locais a se passar pelo ídolo Cauby Peixoto (1931-2016) que, muito ocupado, não dava conta de atender a todos os convites que lhe eram feitos. A fada-madrinha foi a cantora Angela Maria (1929-2018), que o aconselhou a mudar-se para o Rio de Janeiro, onde teria mais chances de realizar seu sonho.
“Já não durmo
Morro até só em pensar
E se canto
Só o seu nome quero gritar
Mas se eu grito todo mundo
De repente vai saber
Que eu morro de saudade
E de amor por você”
“Os Brutos Também Amam”, álbum de 1972, marca o começo de uma nova fase na carreira. Com ele Timóteo deu um basta na linguagem juvenil com a qual era identificado e adotou a linha romântica que o marcaria para sempre. A música que dá título ao álbum, de Roberto e Erasmo Carlos, demonstra o amadurecimento pessoal e musical do artista. No lugar das versões para hits estrangeiros, Timóteo passa a registrar, em trabalhos inéditos, as dores e glórias do amor.
A trajetória de Agnaldo Timóteo e seu valor como artista teve reconhecimento com o documentário “Eu, Pecador”, dirigido por Nelson Hoineff (1948-2019) e lançado no Festival do Rio de 2017.
O filme, que tem título homônimo ao da canção do final dos anos 70, conta a história do homem que fez carreira como cantor e, em seguida, se jogou na política. As filmagens aconteceram em 2016, durante sua campanha eleitoral para vereador no Rio. Nelson Hoineff costumava dizer que passar um ano ao lado dele o ajudou a entender tantas contradições. “Ele pode elogiar o Lula ou o Maluf numa semana e, na outra, fazer críticas pesadas aos dois. Não é personagem. Esse é ele mesmo. Contraditório e interessante”.
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